terça-feira, 14 de setembro de 2010

TRÊS OLHARES SOBRE O ALBINISMO

O blog modobulb (http://modobulb.wordpress.com/  ) publicou texto bastante sensível e elucidativo sobre o trabalho de 3 fotógrafos, que, em países diferentes, escolheram desenvolver pesquisas sobre o albinismo. São eles, o brasileiro Gustavo Lacerda, o italiano Diego Ravier e o sul-africano Pieter Hugo. Propositalmente, deixei as fotos de fora desta postagem para que os leitores se sintam mais curiosos pra conhecer esse blog tão interessante. http://modobulb.wordpress.com/2010/09/12/albinos-tres-pesquisas-uma-breve-introducao/

Albinos: três pesquisas, uma breve introdução
setembro 12, 2010
por modobulb

Há algum tempo as pesquisas de 3 autores me chamaram muita atenção por tratarem seus sujeitos com abordagem absolutamente distinta. Nesse post quero comentar autores com trabalhos que falam de pessoas com albinismo.
Os fotógrafos são de nacionalidades distintas, sendo Gustavo Lacerda, brasileiro; Diego Ravier, espanhol; e Pieter Hugo, sul-africano, e apesar de seus temas serem semelhantes, o desenvolvimento da temática assume contornos diferentes. As diferenças culturais, a investigação plástica, a aproximação física, a forma de enquadrar, o caminho que a legenda percorre, transformam-se em discurso e são latentes nas imagens.
O trabalho de Pieter Hugo, Looking Aside, é frontal, é direto, é sem rodeios. O nome remete ao ato, de virar o rosto, desviar o olhar diante de pessoas incomuns. Nessa série o autor fotografou pessoas com desordens muito visuais: albinos, cegos, pessoas com doenças de pele. Desafiando os nossos preconceitos e reações “instintivas” de ver com o “canto” do olho, Hugo nos “obriga” a olhar diretamente. Isola o sujeito do seu contexto, colocando-o contra um fundo branco absolutamente neutro, ressaltando, assim, a face, a cor, os olhos, o cabelo, as marcas na pele, a expressão única de cada uma daquelas pessoas, individualizando-as. Assim, como no retrato 3×4 para documentos, a imagem que vemos é descritiva, se propondo a identificar, não deixar dúvidas sobre quem é o sujeito. As legendas reforçam essa marcação: nome e sobrenome, cidade, ano em que foi realizada a imagem.
Já o fotógrafo Diego Ravier discute a questão do albinismo com outra abordagem. O título do projeto Genetic Contrast fala de contrastes que são explorados visualmente nas cores, nas locações escolhidas, na luz dura, na contraposição na cor da pele das pessoas. O longo texto introdutório do projeto se propõe a explicar detalhadamente as causas do albinismo e seus problemas (a doença explicada cientificamente, os problemas decorrentes dela como o câncer, a miopia, o astigmatismo; suas causas hereditárias; o agravamento desses problemas por falta de recursos, óculos, estudos), levantando questões típicas do fotojornalismo engajado.
O trabalho é mais narrativo, dá caminhos, adiciona – através do texto/legenda – críticas diretas a situação na qual essas pessoas vivem com o descaso do governo, os problemas sociais e psicológicos enfrentados por elas, que são muitas vezes tratadas como objeto de zombaria e superstição no local onde vivem. Suas legendas relacionam as ações e as pessoas ao momento em que foram feitas as fotografias ou a forma como elas tentam apaziguar seus problemas. Descrevendo a cena e adicionando informações provenienets de contato próximo e demorado com cada pessoa fotografada, Ravier traça um panorama da situação das pessoas com albinismo em Burkina Faso, país onde passou meses se dedicando a esse trabalho.
O trabalho de Gustavo Lacerda, que está sendo exposto, atualmente, na 18a edição da Pirelli-Masp, intitulado Albinos é de outro tom. As cores acalmam, a plasticidade é explorada pela suavidade das passagens dos tons pastéis que permeiam a obra, que se assemelham a pinturas de grandes artistas como Edgard Degas ou até a fotografia de Anna Mariani.
Belos retratos talhados a mão, cada detalhe não é por acaso. As roupas, as pessoas, a forma como posam para o retrato, os fundos decorados com motivos delicados não estão ali como critica inflamada a situação dos albinos enquanto pessoas diferentes, e sim a beleza única que deles transborda. Ao ver essas fotografias sinto vontade de tocar, de passar suavemente a mão e sentir o cheiro doce de cada uma dessas cores.
Tão suave quanto as imagens é a forma como o texto é somado ao trabalho. Nomes, sem sobrenomes. Nomes de pessoas que me parecem, ser hoje, seus amigos. Uma aproximação íntima, delicada e respeitosa.
Um aspecto interessante que deve ser comentado é a especificidade cultural de cada trabalho. Tendo Pieter Hugo e Diego Ravier realizado seus trabalhos em países no continente africano, o referente Cor (da pele) toma outras proporções. O que é ser branco em um pais predominantemente negro? O que é ser albino nesse contexto?
Somada a mística, as superstições, aos preconceitos, a alvura máxima da pele determinada por uma enfermidade extrapola o sentido da discriminação racial. O olhar com o canto do olho é transformado em encarar de frente, no trabalho de Pieter Hugo. A mistura de cores, tecidos, costumes tão mágica, realizada por Diego Ravier, é subvertida na ideia de que essas pessoas são caçadas e assassinadas por ocultismo em diversos locais como Tanzânia e Burundi, além de Burkina Faso onde foi realizado este trabalho. O que seria levar as imagens de Gustavo Lacerda para um exposição nesse país? Com repertórios e tradições diferentes vemos o mesmo trabalho de um outro jeito. Apesar de tratar em seus trabalhos da condição de albinismo, os temas são absolutamente distintos, cada um imerso no seu próprio pais.
O incrível na fotografia é que ela permite nos transportar entre as barreiras dos trabalhos, das cidades, dos países e entender um pouco mais de cada lugar. Saber que se é diferente mesmo sendo igual.

(Falando em fotos, que tal escutar um pouquinho de Camera Obscura, uma banda escocesa absolutamente fofa?)

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