quarta-feira, 30 de abril de 2014

VIAJAR É TÃO BOM

Descobrindo o mundo de muletas. O turismo acessível para deficientes andantes.

Marcos Bauch já foi mochileiro na Nova Zelândia, viajou de carro até Machu Picchu, mergulhou em Bonito e saltou de paraquedas em Boituva 
Marcos Bauch já foi mochileiro na Nova Zelândia, viajou de carro até Machu Picchu, mergulhou em Bonito e saltou de paraquedas em Boituva

O engenheiro agrônomo Marcos Bauch, 31 anos, nunca deixou que as muletas que usa desde criança – necessárias devido a uma artropatia nos dois joelhos – o prendessem em casa. Dificuldades existem. Das mais prosaicas, como os pisos escorregadios que já o derrubaram várias vezes, às mais inusitadas, como saltar de paraquedas sem pousar com os pés no chão. “Eu e o instrutor tivemos que bolar uma estratégia para o pouso. Treinamos uma descida sentados e deu certo”, conta o engenheiro.

Mas os desafios que enfrentou jamais o fizeram pensar em desistir das viagens. “São apenas percalços e aumentam o número de histórias para contar aos amigos”, diz ele. A exemplo de Marcos, há muito mais gente disposta a superar limites físicos para colecionar histórias e experiências.

O Brasil possui, atualmente, cerca de 46 milhões de brasileiros (24% da população) com deficiência intelectual, motora, visual e auditiva, conforme o Censo realizado em 2010 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). E, dentre eles, há muitos viajantes frequentes, segundo constatou o Ministério do Turismo, numa pesquisa realizada em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos, entre os dias 13 a 20 de maio de 2013, nas cinco maiores cidades emissoras de turismo doméstico brasileiro – São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte Curitiba e Porto Alegre. A pesquisa apontou que o sentimento de superação, a liberdade e a autonomia são alguns dos principais elementos motivadores dos viajantes. Mas eles não querem só acessibilidade. Como qualquer outro turista, também buscam preços competitivos, belas paisagens, boas condições de transporte e aspectos históricos e sociais interessantes.

A cidade de Socorro, no interior de São Paulo, foi apontada pelos entrevistados como um modelo de turismo acessível, pois é a que oferece a melhor adaptação para pessoas com deficiência. Além de Socorro, Fortaleza (CE), Ilhabela (SP) e Maceió (AL) foram citadas por apresentar passeios, atividades esportivas e ecoturismo para as pessoas com mobilidade reduzida, deficiência auditiva ou visual. Atualmente, o Ministério do Turismo está financiando 14 projetos que envolvem acessibilidade, com investimentos na ordem de R$ 109 milhões.
Só rampa não basta

Mas investir em acessibilidade não é apenas construir rampas para cadeiras de rodas. “É um equívoco achar que tornar uma cidade acessível é só desobstruir barreiras arquitetônicas. É preciso eliminar as barreiras físicas para cadeirantes, mas também ter pessoas habilitadas a se comunicar com deficientes auditivos, disponibilizar material turístico acessível para deficientes visuais e treinar funcionários para atender a essas pessoas”, explica a psicóloga Adriana da Silva Souza, do Núcleo de Apoio às Pessoas com Necessidades Específicas do IFRJ (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia).

“Ao escolher onde se hospedar, a primeira providência é checar se o local vai ajudá-lo nas suas dificuldades individuais. Porque mesmo com perfis parecidos, cada pessoa tem uma necessidade”, diz o turismólogo e cadeirante Ricardo Shimosakai, diretor da empresa Turismo Adaptado, que elabora roteiros de viagens para pessoas com necessidades especiais. A recomendação aqui é ser o mais detalhista possível, já que, muitas vezes, as empresas não entendem o conceito de acessibilidade. “Se você precisa de uma cadeira de banho, por exemplo, tem que ligar e verificar com o hotel se eles têm e explicar que cadeira de banho não é uma cadeira de piscina”, diz Shimosakai.

Uma vez escolhido o hotel, vale checar informações por telefone e até pedir fotos do local. As dimensões são importantes, especialmente se o turista for cadeirante. “Muitas vezes é preciso solucionar problemas e exigir os direitos antes de aproveitar a viagem. Ao chegar a um lugar, a pessoa com limitações motoras vai gastar tempo para saber quem tem a chave para abrir o elevador, com quem é preciso falar para poder estacionar mais perto ou, ainda, como encontrar alguém que possa ajudar a subir e a descer uma escada”, explica o engenheiro Marcos Bauch, que hoje compartilha as experiências acumuladas no blog “De muletas pelo mundo”. Já o portador de deficiência visual precisará de alguém que o acompanhe até o quarto de hotel e lhe mostre a localização de cada objeto. O deficiente auditivo, por sua vez, terá mais facilidade de se comunicar ao contar com o apoio de funcionários aptos em Libras, a Língua Brasileira de Sinais.

Além disso, os passeios que serão feitos no destino também precisam levar em conta as limitações. Para o deficiente visual, por exemplo, no lugar de um museu em que apenas o título da obra está escrito em braile, será muito mais prazeroso visitar um jardim sensorial, disponível em alguns parques botânicos de cidades brasileiras, ou uma galeria tátil, como a existente na Pinacoteca do Estado de São Paulo. A 134 quilômetros da capital paulista, a cidade atrai cada vez mais pessoas com mobilidade reduzida ou necessidades especiais, por conta do projeto Socorro Acessível, iniciado em 2005

Viagem inclusiva e os custos

Não necessariamente um deficiente gastará mais dinheiro para viajar. Os estabelecimentos não cobram mais caro por serem acessíveis, mas os custos podem aumentar conforme as adaptações que o turista precise fazer para usufruir de maneira prazerosa da viagem. “Quando fui para Machu Picchu contratei uma agência capacitada para levar pessoas com deficiência, mas tive que pagar por três guias para carregarem minha cadeira de rodas em uma parte do percurso”, explica Ricardo Shimosakai.

Como não são todos os locais que oferecem acessibilidade, a oportunidade de escolha é menor. Por isso, o deficiente nem sempre pode optar pelo hotel mais barato para se hospedar, o menor carro para alugar ou ainda, o restaurante mais econômico da região. É preciso escolher aquele que ofereça soluções para as necessidades individuais.

terça-feira, 29 de abril de 2014

ERÓTICO

Capacitados para o sexo

Jerónimo Andreu
Francesco Granja recebe as visitas na cama apertando um controle que abre a porta da sua casa. Mora num luminoso apartamento da Vila Olímpica de Barcelona adaptado para sua tetraplegia causada por um acidente de carro há 20 anos, quando voltava de uma reunião. Costuma se locomover numa cadeira de rodas, mas hoje umas feridas o detêm. Ao seu lado estão María Clemente, psicóloga especializada em neurorreabilitação, e Eva, assistente sexual, dois pilares fundamentais de Tandem Team, a associação sem fins lucrativos presidida por Granja, dedicada à assistência sexual para portadores de deficiência por meio de voluntários.
A pessoa citada, deitada e sorrindo
Francesc Granja, presidente da Associação de Atenção Sexual a Portadores de Deficiência. / Massimiliano Minocri
Os três acompanham um debate que se gerou espontaneamente em torno de outros dois visitantes no quarto de Francesc. É preciso tomar cuidado para não se apaixonar? Felipe e Lau conversam (ambos nomes fictícios). Felipe sofre de paraplegia de terceira e quarta vértebra. Lau é a assistente que ele conheceu por meio de Tandem, e defende com paixão que os encontros devem ser sinceros, nunca uma ficção sentimental:
- Tenho namorado, mas durante o tempo que estou com um usuário, ele se converte no homem da minha vida.
- Não se deve ter medo – concorda Felipe – Você pode se apaixonar porque está muito necessitado, mas também da padeira ou de qualquer pessoa que te trate bem. Aqui os dois sabemos onde estamos.
- Mas é preciso se entregar, porque é uma questão de amor, que para mim é o fundamental.
- Em todo caso – intervém María – se detectamos pessoas dependentes psicologicamente as aconselhamos a não recorrer a um assistente porque podem acabar se magoando.
Lau, de 38 anos, estudou enfermagem e veterinária. Ela faz oficinas de tantra e, quando uma amiga lhe falou de Francesc e do seu projeto, exclamou: “Isso é para mim”. Seu perfil encaixava com o do assistente que procura a associação: experiência sóciossanitária, sem motivações econômicas e com uma concepção da sexualidade não apenas genital… A entrevistaram sobre os limites que ela fixava com relação às práticas sexuais e às famílias dos portadores de deficiências – alguns assistentes os estabelecem para amputações, determinadas complicações higiênicas ou características físicas impactantes, como as da acondroplasia (ananismo) – e ela respondeu que não estabelecia nenhum, que dependeria do momento e da pessoa, “como em qualquer relação”.
Uns dias depois, Felipe e Lau se encontraram para tomar um café. Simpatizaram um com o outro e combinaram um encontro mais íntimo. Felipe, com 42 anos, desde que está em cadeiras de rodas, havia tido uma relação mas não funcionou, e uma outra vez, se relacionou com uma prostituta: “A moça vinha com contador e isso para alguém com os meus problemas não funciona”. Sua experiência com Lau o revitalizou: “Você lembra de sentimentos que achava que estavam mortos”.
Ele é um dos 45 usuários da associação, constituída em outubro de 2013. Da mesma maneira que há mais demanda masculina, também se oferecem mais voluntários varões, embora, depois de descartar 50%, os 15 com que estão trabalhando formam um time equilibrado de homens e mulheres. Além disso, trabalham com diferentes tendências sexuais. “Precisamente com o primeiro usuário, tivemos uma surpresa”, sorri Francesc.
Ele tampouco cobra por colocar em contato assistentes e usuários, e recomenda que, em caso de haver alguma compensação financeira entre eles, que não ultrapasse os 75 euros (240 reais). “Costuma ser de uns 50 euros (160 reais) porque é preciso se deslocar até a casa do usuário, estacionar, comer fora…”, explica Eva. “Mas muitas vezes não cobramos, não é a motivação”. A associação se mantém por enquanto com as doações de Francesc (que é professor de Esade e recebe uma pensão) e com o trabalho voluntário de María. “Aspiramos ter um mínimo de ingressos para manter a estrutura”, explicam.
María Clemente (à direta), psicóloga especializada em neurorreabilitação, e Eva, assistente sexual de Tandem Team. / Foto: Massimiliano Minocri
A iniciativa gerou expectativa no coletivo. “Consideravam-nos, os portadores de deficiências, como anjinhos assexuados, mas não é assim”, diz Francesc. Há muito existem assistentes e prostitutas que trabalham nessa área, mas escondido. Enquanto isso, na Europa o debate foi se tornando público. O país que chegou mais longe em termos de regulamentação foi a Suíça, embora com um modelo que muitos consideram intervencionista, com encontros mensais e assistentes com diploma universitário para isso. Na Bélgica, onde funciona a associação que Tandem toma como modelo, a área se move numa “alegalidade” (fora da lei, mas não contra a lei) muito compreensiva. De uma forma ou de outra, na Dinamarca, Suécia, Holanda e Alemanha, a assistência se pratica. E na França, embora no ano passado um Comitê Nacional de Ética tenha aconselhado o governo que não a legalizasse, a controvérsia continua, graças, em parte, ao sucesso do file Intocáveis.
“Existem diferentes modelos”, explicam Sánchez e María Honrubia, mas o fundamental é revelar que o problema existe”. Sánchez, enfermeira com máster em sexologia, e Honrubia, psicóloga, presidem a Associação Nacional de Saúde Sexual e Deficiência (Anssyd), que no último dia 14 de março organizou juntamente com outra associação (Sex Asistent) o primeiro curso na Espanha de acompanhamento e assistência sexual. Custava 100 euros e se dirigia a “interessados em se formar e exercer um trabalho profissional relacionado à assistência sexual”. Teve 15 inscritos, de fisioterapeutas a profissionais do sexo. “A formação é muito prática, esclarecendo em que consiste o serviço: que podem se deparar com uma pessoa que usa um coletor, com problemas mentais, como reagir diante de uma subida da pressão…”, conta Sánchez.
Por razões de confidencialidade, a Anssyd não permitiu que EL PAÍS assistisse a uma das aulas. A associação reconhece que o curso pode ser controverso. “Existe um vazio legal a respeito e sua proximidade da prostituição. Mas em 50% dos casos não há coito. Muitos usuários querem ver um corpo nu ou acariciá-lo. Isso é uma experiência alucinante. Inclusive há deficientes cognitivos que só querem afeto físico; e, por lei, isso não pode ser dado por um cuidador normal”, explica Honrubia.
O caminho até essas jornadas foi duro. “Levamos 25 anos como docentes”, contam, “e só agora começamos a ser reconhecidos”. Durante duas décadas as duas profissionais suportaram a desconfiança de colegas que não acreditavam no objeto das suas pesquisas. Mas nesses anos se estabeleceu a Convenção dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência (ONU, 2006) e a Lei Orgânica da Saúde Sexual e Reprodutiva e de Interrupção Voluntária da Gravidez, de 2010 (popularmente reduzida a lei do aborto de Zapatero), que estabelecia a necessidade de se formar profissionais, o que deu impulso a proliferação de associações pelos direitos sexuais dos portadores de deficiências. Todas essas iniciativas foram varridas pela crise.
“Existe um mito segundo o qual se você fala da sexualidade, a desperta”, conta Sánchez. “Mas o desejo está ali, silenciado. Você não imagina quanto sofrimento existe escondido”. Eles não exageram: pessoas que não quiseram ter seus nomes publicados narram histórias duras: 20 anos de um casamento sem sexo que se mantém por causa dos filhos, pais que masturbam doentes mentais…
Não parece que, por enquanto, irão surgir soluções simples a essas barreiras. As primeiras vivem nos limites da lei. Em um apartamento de Barcelona, Lau se despede de Felipe com beijos e abraços.
 http://www.inclusive.org.br/?p=26360

TELINHA QUENTE 118


Roberto Rillo Bíscaro

Numa de suas autobiografias, o ator Michael Caine conta que nos anos 1960 Londres começava a se modernizar e informalizar. Alguns restaurantes desobrigaram clientes do uso da gravata e fechavam mais tarde. Graças ao sucesso duma rádio pirata, a sisuda BBC1 teve que abrir as pernas e tocar rock.  Os Beatles/Rolling Stones revolucionavam a música. Era o balanço da Swinging London.
A TV não ficou atrás e em 1967 chacoalhou a narrativa televisiva com The Prisoner, produzida pela ITC (hoje, ITV). Famosa pelas inúmeras teorias suscitadas devido à nebulosidade da trama e pela lealdade dos fãs através das décadas, obriguei-me a ver os 17 episódios da única temporada.
A premissa é dada na longa abertura: um agente secreto se demite e é capturado não se sabe por quem (o mundo era então dividido entre EUA e URSS). Desperta numa aldeia, paradisíaca, limpa, organizada, um sonho. Mas, nessa aparente utopia, os nomes foram substituídos por números, os indivíduos tiveram que se dissolver em nome do grupo, ou, antes, de uma força tirânica que os subjuga sem que percebam. Todos são vigiados ininterruptamente, tudo é planejado pra substituir a vontade própria. Lembrar um mundo que conhecemos, né?
O ex-agente é batizado de Número 6 e passa a série toda tentando escapar e evitando responder à questão: “por que você se demitiu?” Com recursos aparentemente ilimitados à disposição, os comandantes da Vila poderiam facilmente capturar peixe mais graúdo no contexto da Guerra Fria, que seria bem mais fácil!
Abundante em referências orwellianas, kafkianas, cenas remetentes à Alice no País das Maravilhas (um grande jogo de xadrez humano) e tenteando temas como controle da mente, lavagem cerebral, manipulação de sonhos, troca de personalidades, hipnose, tudo maquiando incessante tortura psicológica, não admira que The Prisoner tenha se tornado cult e influenciado roteiristas mil.
Essa afirmação ferrenha da individualidade indubitavelmente flexibilizou as formas da telinha, mas não me foi tão agradável vê-la. Muitos capítulos sem pé nem cabeça, os últimos 2, com sua lisergia onírica, soam pretensiosos e, no fim das contas, tudo muito chato pro meu gosto.
Não engrossei as fileiras de cultuadores.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

CAIXA DE MÚSICA 123



Roberto Rillo Bíscaro

Nas últimas semanas, 2 álbuns têm frequentado minhas playlists. De gêneros distintos, mas compartilhando a melancolia.
Orcas é um duo formado por Rafael Anton Irisarri, que atua com música eletrônica e minimalista, ambiente e Benoit Pioulard, que traz na bagagem influências shoegazer e indie pop. A junção dessas vertentes na chuvosa Seattle resultou em Yearling, melódico e outonal, lançado no começo do mês.
A calmaria da electronica do mar das Orcas vem banhada em elementos de rock como guitarra e bateria, em tom calmo, mesmo quando ensaia vagas mais fortes. Há certo clima de se navegar em meio à eletricidade estática em algumas faixas, como nos quase 9 minutos de Tell, instrumental ambiente-minimalista que dá a sensação de navegação no espaço sideral em meio a suaves ondas de estática.
O teclado de Half Light remeteu este 40tão à sonoridade prog de Tony Banks lá pelos fins dos anos 70, mas a canção é quase pop com vocal meio a la Morten Harket. A plangência da construção harmônica da guitarra de Selah soa como o Durutti Column, prespontada sobre um teclado Kraftwerk anos 70, numa melodia que vai se tornando mais complexa e instrumentada. Infinite Stillness tem bateria My Bloody Valentine coabitando com um carpete de teclado, com a inclusão de guitarras pra resultar numa pequena catarse de barulho abafado.
Acessibilizando elementos tão díspares, Yearling é uma delícia pra relaxar e/ou preparar pro sono.


True Detective me entediou um pouco, mas serviu pra conhecer a canção-tema, Far From Any Road, sangrento TexMex com linda harmonia vocal, que aproxima a série a Tarantino e às histórias sobrenaturais do Velho Oeste.
O casal que forma a The Handsome Family deu sorte quando a HBO escolheu a faixa de seu álbum Singing Bones (2003) e ganhou na loteria quando True Detective estourou.
The Handsome Family faz música country bem tradicional, com pinceladas de bluegrass e aquelas baladas sangrentas que fascinam há séculos. Nada a ver com modernices aproximadoras de country com pop. Porém, a produção deixa o som com uma sonoridade desértica, de abandono tão cara e coerente com certa modernidade. Por isso a dupla é considerada alternative country.
Não espere a alegria apalermada das canções de peão universitárias. Singing Bones é sério, solene  e poeirentamente sombrio sob o sol do Oeste. 24-Hour Store é sobre uma assombração; a incorporação do serrote musical deixa-a ainda mais fantasmagórica. If the World Should End in Fire é quase um hino religioso a capela, com vozes poderosas. Os mais velhos lembrarão d’O Álamo de John Wayne; os mais jovens, d’alguma tarantinice. Talvez seja essa miragem de atemporalidade um dos segredos da beleza de Singing Bones.
As letras sobre tendências suicidas, relações devastadas misturam elementos naturais com lugares-comuns da contemporaneidade como máquinas de café, xerox e telas de computador.
Desde os canadenses do Cowboy Junkies que um disco de country não me agradava tanto.

domingo, 27 de abril de 2014

FUTUROLOGIA NO PASSADO

Isaac Asimov estava certo: as previsões do escritor para 2014 que viraram realidade


Kim Gittleson
 
Isaac Asimov (BBC)
Em 1064, o escritor Isaac Asimov fez previsões precisas de como seria o mundo hoje

Estamos em 2014, e todos deveríamos estar indo à terapia.
Ao menos é o que dizia Isaac Asimov, um dos mais conhecidos autores de ficção científica do século 20, que em 1964 publicou um ensaio em que previa como seria a realidade de hoje.
Apesar da sua insistência na psiquiatria, o mundo não passava por uma crise mental massiva, mas sim pela inauguração da Feira Mundial no bairro do Queens, em Nova York.
Apesar do tema oficial da feira, que durou seis meses, ser "a paz por meio da compreensão", o evento hoje é lembrado pela visão do futuro exposta ali.
E, mesmo que algumas das suas tecnologias futurísticas nunca tenham chegado ao público, como a casa submarina e o carro voador, ao olhar mais de perto as previsões de Asimov divulgadas na feira percebemos que sua "bola de cristal" era bastante precisa.
Assim ele via o ano de 2014 em 1964:

1. "As comunicações serão audiovisuais e uma pessoa poderá não só escutar, mas também ver a pessoa que a telefona."

A primeira chamada de vídeo transcontinental foi feita em 20 de abril de 1964 usando uma tecnologia desenvolvida pela empresa Bell Systems (que depois se converteria nos Laboratórios Bell). Isso pode ter inspirado a Asimov.

Feira Mundial (AP)
Na Feira Mundial de 1964, havia cabines telefônicas para realizar chamadas de vídeo
Mesmo assim, ele se surpreenderia com os baixos custos de serviços como Skype e Facetime, da Apple: em 1964, uma chamada de vídeo de três minutos de Washignton D.C. para Nova York custava cerca de US$ 118 (o equivalente a R$ 265) em valores atuais.

2. Será possível "telefonar para qualquer ponto da Terra, inclusive as estações meteorológicas na Antártida".

Hoje, para ligar para a Antártida, basta usar o DDI 672 (para algumas zonas do planeta; em outras, usa-se o DDI 64, da Nova Zelândia).

Pinguins (BBC)
Antes uma coisa do futuro, os telefonemas para a Antártida hoje são simples de fazer

3. "Os robôs não serão comuns nem muito bons em 2014, mas vão existir."

É atribuída a Asimov a introdução da palavra robótica no idioma inglês, por isso não é tão surpreendente que ele tinha razão ao prever que nenhum robô estaria a altura da personagem Rosie, do desenho animado Os Jetsons, que estreou na televisão em 1962.
Mas há projetos de robôs para dar notas em provas de universitários no Japão, que fazem cirurgias à distância e cozinham um prato com a destreza de um cozinheiro profissional.

Isaac Asimov (Getty)
O escritor Isaac Asimov fez uma série de previsões precisas sobre como seria o futuro
Asimov também esteve perto de prever o que hoje é um componente crucial da vida moderna: os "minicomputadores", também conhecidos como smartphones, que ele pensou que serviriam como "cérebros" para os robôs.
Qualquer pessoa que tenha tentado conhecer uma cidade estrangeira sem um mapa digital pode se perguntar se Asimov não quis dizer cérebros "humanos".

4. "Quanto à televisão, as telas de parede substituirão os equipamentos de hoje, mas também aparecerão cubos transparentes que tornarão possível a visão em três dimensões."

Um dos aspectos mais notáveis das previsões de Asimov é que elas foram certeiras quanto à criação de certas tecnologias, mas superestimaram o entusiasmo com que elas seriam recebidas.
Para dar a ele o devido crédito, é preciso dizer que as TVs de tela plana substituíram os modelos comuns, e a TV em 3D, mesmo que não em forma de cubo, foram por muito tempo as grandes estrelas das feiras de tecnologia.

Cinema 3D (Thinkstock)
Asimov disse que o balé seria o tipo de programa favorito do público da TV 3D
Mas o público em geral não ligou muito para esta última invenção: a BBC anunciou em julho que suspenderá sua programação em 3D por causa da "falta de interesse dos espectadores".

5. "As comunicações com a Lua serão um pouco incômodas."

Era natural que Asimov se equivocasse nesse ponto. Em 1964, em plena era espacial, o entusiasmo com os avanços neste campo poderia ter deixado o escritor muito otimista quanto às comunicações com a Lua. Segundo ele, as chamadas teriam um atraso de 2,5 segundos

Sonda Curiosity (Nasa)
A sonda robótica Curiosity percorre a superfície de Marte captando imagens e realizando análises
Mas ele acertou em cheio quando previu que, em 2014, "apenas naves não tripuladas terão aterrissado em Marte".
Mesmo assim, ele não previu que sonda marciana Curiosity teria uma conta no Twitter.

6. "Os móveis de cozinha prepararão refeições, esquentarão água e a transformarão em café."

As máquinas de café automáticas realmente existem.
As previsões de Asimov de que leveduras e algas seriam processadas para simular diversos sabores, como "peru falso" ou "pseudobife", se concretizaram no ano passado, quando os cientistas anunciaram o primeiro hambúrguer feito em laboratório.

Hamburguer artificial (Getty)
O hamburguer produzido em laboratório foi anunciado por cientistas no ano passado
Os críticos podem estar divididos se Asimov tinha razão ao dizer que o sabor "não seria de todo mal": algumas das pessoas que comeram o hambúrguer disseram que "sentiam falta da gordura".

7. "Já existirá uma ou duas usinas de fusão de energia experimental."

Diz-se por aí que a fusão - em essência, o aproveitamento da energia que existe dentro das estrelas - é a energia do futuro.
E isso não está tão longe, se levarmos em conta o investimento internacional de US$ 22 milhões para colocar um reator em funcionamento no sul da França até 2028.

Fazenda solar na China (Getty)
O escritor foi preciso ao prever centrais de energia solar em áreas desérticas
Mas as previsões de Asimov sobre as grandes centrais de energia solar no deserto e em zonas semidesérticas como no estado do Arizona, nos Estados Unidos, e no Deserto do Negev, em Israel, foram exatas.
As centrais elétricas no espaço "que captam a luz solar por meio de enormes aparelhos parabólicos e irradiam a energia para a Terra" seguem como uma meta em aberto.

8. "Haverá um grande esforço para projetar veículos com cérebros robóticos."

Sem dúvida, esse veículo com cérebro robótico pode ser o automóvel que se dirige sozinho.

Carro do Google (Getty)
O Google atualmente desenvolve um automóvel que se dirige sozinho
Outras previsões sobre o transporte feitas por Asimov seguem como ficção. Os "aquafoils", que passam raspando sobre a água e impressionaram os visitantes da feira de 1964, não decolaram. Muito menos seus sucessores: o cinto-foguete e os aerodeslizadores.

9. "Nem toda a população do mundo desfrutará por completo dos artefatos do futuro. Uma porção maior do que a atual será privada deles, mesmo que estejam numa situação material melhor do que a de hoje."

É talvez a observação - ou advertência - mais visionária de Asimov. Isso porque a tecnologia, tanto antes quanto agora, pode transformar vidas, mas sem um esforço para torná-la acessível, pode prejudicar em vez de ajudar no objetivo de atingir a "paz por meio da compreensão".


Drone do Google (AP)
O Google e o Facebook querem usar drones para ampliar o acesso à internet

TAEKWONDO DA SUPERAÇÃO


Menino cadeirante supera limitações e descobre paixão pelo taekwondo

Hélder Rafael

Duas vezes por semana, o pequeno Luigi Palumbo, de cinco anos, encontra os coleguinhas na academia de artes marciais em Campo Grande para praticar o taekwondo, seu esporte preferido. A turma aprende os movimentos básicos da modalidade e se diverte com as brincadeiras propostas pelo mestre. Luigi é alegre e esperto como as outras crianças, mas a condição de cadeirante faz dele um exemplo de superação. É por meio do esporte que a família procura dar ao menino uma vida perfeitamente normal.

Luigi nasceu com má formação do tubo neural na espinha dorsal, o que impede o movimento dos membros inferiores. Esse defeito congênito é chamado de mielomeningocele. Logo que entrou para a vida escolar, o menino recebeu incentivo dos pais para praticar esportes e adotar um estilo de vida saudável. Luigi chegou a iniciar no karatê, mas depois que mudou de colégio, conheceu o taekwondo por indicação de uma colega de classe, que também fazia aulas.

- Nós o incentivamos porque, além de ser uma atividade física, o esporte é um meio de inclusão. Aqui ele é bem recebido pelos colegas, todos o adoram. Ele participa das aulas em iguais condições. Tudo isso trouxe reflexos no aspecto físico e emocional do menino, fez com que ele interagisse mais com todo mundo - conta o pai, o advogado César Palumbo Fernandes.

Embora o taekwondo seja uma modalidade que envolva chutes, isso não impede que Luigi aprenda os conceitos básicos e possa, inclusive, alcançar a faixa preta, como explica o mestre Tiago Brandão, faixa preta 4º Dan

- Vi que ele tem bastante interesse e vontade de aprender. Sempre chega animado para as aulas. O importante é que ele faça algo que se sinta bem. Futuramente ele pode até se tornar um mestre, caso queira continuar se dedicando ao esporte.

A academia que Luigi frequenta, na região central da cidade, atende cerca de 100 crianças e adolescentes. O mestre Tiago Brandão tem graduação em Educação Física e ênfase no ensino adaptado para deficientes físicos, o que deu tranquilidade à família do menino.

Luigi sentado na cadeira de rodas com os braços levantados e ao lado crianças sentadas no chão e aprendendo com ele os movimentos
Luigi brinca normalmente com os colegas no dojô

Nos treinos, Luigi acompanha a turma em todas as atividades, desde a reverência às bandeiras do Brasil e da Coreia do Sul - como é tradição ao entrar ou sair do dojô - até a prática dos golpes de ataque e defesa. E se a hora é de brincar de pega-pega, por exemplo, Luigi também participa. Quando os colegas tentam ajudá-lo empurrando a cadeira a todo instante, os monitores orientam que é melhor para o menino que ele se locomova sozinho.

- É bacana que os outros também aprendem a conviver com ele - diz o mestre Brandão.

Luigi frequenta as aulas há pouco mais de um mês. Desde que fez os primeiros testes, se apaixonou e não larga o kimono. Até já ganhou medalha de segundo lugar em um festival por equipes. Perguntado sobre o que pretendia ser quando crescer, adivinha o que ele respondeu?

- Quero ser mestre - diz Luigi.

Incentivo dos pais é o que não vai faltar para o menino.

- A família entende que o esporte é fundamental para qualquer criança, e nós o incentivamos muito. Acho que ele deve ter sempre uma vida esportiva ativa, mas também gostaríamos que ele focasse na formação intelectual. Se o Luigi decidir ser um atleta profissional, vai ser fantástico - diz o pai.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

PAPIRO VIRTUAL 74

 

Roberto Rillo Bíscaro

Quando resenhei o documentário sobre a bem- sucedidaficção policial escandinava contemporânea afirmei que dificilmente leria alguma. Por adorar quebrar expectativas e por persuasão do Helder, pessoa com albinismo que me recontatou declarando-se fã de Nordic Noir e me recomendando leitura, li Stille Umrkeligt Drab (2010), de Lene Kaaberbøl e Agnete Friis. Como não sei dinamarquês, recorri à tradução pro inglês (2012), The Invisible Murder.
A trama começa na pobre Hungria, onde garotos buscam coisas de valor em abandonado hospital da era soviética. Encontram. Corte pra rica Dinamarca, onde diversas histórias começam a se entrecruzar em capítulos curtos, até chegar o ponto em que húngaros e dinamarqueses se veem envolvidos numa ameaça que potencialmente pode matar às dúzias. Sem querer estragar o mistério pra futuros leitores, uma região brasileira enfrentou esse “assassino invisível” nos anos 80, caso inclusive, mencionado no livro.
Detonei Game of Thrones porque lembra um roteiro raso e me dava ganas de ler Walter Scott (leia aqui). The Invisible Murder não pode deixar de parecer com filme/série de detetive/suspense. Nosso imaginário está saturado dessas narrativas, então é impossível escapar. Mas, mesmo a tradução deixa ver que as danesas escrevem mais criativamente do que o clichezento George R. R. Martin. Há sacadas legais e até rachei o bico um par de vezes.
Deu pra supor o/a culpado/a antes do desfecho, mas a motivação é bastante original e tem forte cunho social.
É aí que reside um dos pontos fortes de The Invisible Murder: a visibilidade de temas sociais relevantes como a exploração de imigrantes, a desigualdade econômica entre as várias Europas, os conflitos e hostilidades étnicas que promovem desigualdade, perseguição, diásporas e podem levar a genocídios, como na ex-Iugoslávia.
Exceto por um finlandês psicopata – narrativas de suspense têm que ter cor! – não há bandidos e mocinhos, heróis ou vilões. Muito das ações é resposta explícita a condições sócio-históricas bem marcadas ao invés de bondade, coragem, maldade ou sordidez inatas. Não há, por outro lado, sugestão de fatalismo ou determinismo. As personagens escolhem responder desse ou daquele modo às contradições sociais, e tais escolhas têm consequências sobre outrem, mas as opções poderiam ter sido distintas (mas, claro, desencadeariam resultados igualmente díspares).
Parte do marketing do livro reside no fato de ser o segundo da série protagonizada pela enfermeira da Cruz Vermelha Nina Borg. A âncora social do tema é tão pesada, porém, que naufraga a possibilidade formal dum protagonismo detetivesco geniozinho da dedução criado por Poe (Auguste Dupin), desenvolvido por Conan Doyle ou Agatha Christie e que segue forte, vide o norueguês Varg Veum. Borg não protagoniza; faz muito pouco, é levada pelas circunstâncias por quase todo o romance.
Stille Umrkeligt Drab começa lento, ganha ritmo e é capaz de prender. Tomara que ganhe em breve tradução pro português.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

TELONA QUENTE 86

POR DETRÁS DA MÁSCARA

Roberto Rillo Bíscaro

Qualquer história que se preze do cine de horror reservará espaço e elogio à Halloween (1978), de John Carpenter. A produção independente custou pouco mais de 300 mil dólares e faturou mais de 50 milhões. Gerou varias continuações, a refilmagem de Rob Zombie e, mais importante, estabeleceu as principais convenções dos slasher films, subgênero dominante do cine de terror da primeira metade dos anos 1980.    
Se você entende inglês, vai achar o documentário Halloween: a cut above the rest (2003) muito informativo. Cenas do filme e entrevistas com o diretor, elenco, produtores e críticos dimensionarão a importância de Halloween na cronologia dos filmes de horror e darão detalhes de enquadramentos, relacionamento da equipe, de onde veio a máscara e o nome do assassino em série Michael Myers. Vez mais o canadense Black Christmas (1974) é deixado de lado como influência, mas Carpenter menciona o francês Les Yeux Sans Visage (1960), inspirador da máscara. 


BELA POLIGLOTA
Enquanto procurava vídeos pra postagem sobre cinema da próxima quinta, encontrei delicioso exemplo de globalização. Uma canção do desenho A Bela Adormecida, da Disney, em diversos idiomas. 

Japonês:

Alemão


Francês


Italiano


Dinamarquês


Norueguês

Hebraico


Grego


Árabe


Espanhol, na versão de 1959


Espanhol, versão século XXI


Inglês


Português brasileiro


Holandês


Húngaro


Búlgaro


Sueco


Turco


Sérvio


Croata


Ucraniano


Finlandês


Russo


Coreano


Tcheco


Polonês


Romeno


Albanês


Português de Portugal

quarta-feira, 23 de abril de 2014

INCLUINDO

Educação Inclusiva não é utopia: algumas dicas para professores
*Por Luciane Molina

A educação inclusiva não atrai tanto o professor do ensino regular quanto aquele que atua na educação especial. Apesar de serem modalidades distintas, com objetivos e ações específicas, o “inclusivo” e o “especial” caminham quase paralelos dentro de um sistema de ensino massificado e emergente.

Estou em contato, quase que diariamente, com professores do ensino regular e do atendimento educacional especializado. Ouço discursos dos mais apaixonados aos mais levianos, argumentos que preservam a ideia da diversidade e, outros alegando falta de formação ou suporte para atuar com o que é “diferente” aos seus olhares apáticos.

Hoje decidi investir em outra estratégia. ao invés de apontar as falhas e sugerir uma mudança de postura, encontrarei bons exemplos  para que sirvam de incentivo aos que desejam ousar e fazer a diferença na vida de seu aluno com deficiência. Falarei aqui do aluno com deficiência visual.

EVITE ATIVIDADES ORAIS
Na ausência de conhecimento sobre o sistema Braille ou da tecnologia assistiva, procure auxílio com um profissional especializado. É sempre muito cômodo investir em atividades e provas oralmente, aquela em que o aluno apenas repete/verbaliza o conceito aprendido. Essa estratégia só deve ser adotada se for utilizada com todos da turma e não exclusivamente com o aluno cego. Insistir nessa estratégia trará prejuízos no aprendizado da língua escrita, leitura e interpretação de textos por meio do registro escrito. A pessoa cega tem condições de ler e escrever utilizando o sistema Braille ou a informática com leitores de tela.

COMUNIQUE O QUE ACONTECE
A expressão corporal auxilia a comunicação verbal, entretanto quando os gestos forem usados para apontar, mostrar ou direcionar a atenção para algum ponto específico, convém que o professor verbalize e seja o mais claro possível para que o aluno cego possa acompanhar sua explicação. Por exemplo, ao mostrar um livro, diga o nome do livro que está em suas mãos ao invés de dizer “este livro”. Chame cada aluno pelo nome ao invés de apontá-los com os dedos. Informe qualquer movimentação ao redor para que o aluno cego acompanhe o que acontece. Seja sempre descritivo e quando escrever no quadro, fale em voz alta.

MATERIAIS CONCRETOS
As disciplinas são apresentadas por meio de textos e imagens. No universo visuocêntrico as figuras complementam o conteúdo textual, tornando o aprendizado muito mais atraente. O aluno com deficiência visual precisa manusear os objetos e as figuras dependem de estímulos sensoriais para serem percebidas. São texturas, aromas, formas e relevos que passam a ser os elementos fundamentais para o aprendizado. Agregar estímulos sensoriais aos visuais pode ser um recurso positivo para a turma toda. Não é preciso construir um material específico para um aluno, mas integrar elementos diversos para um mesmo objetivo. Por exemplo, para ensinar uma reta numérica o professor pode utilizar um barbante com nós. Argolas entrelaçadas para ensinar noção de conjuntos, quebra-cabeça de mapa para ensinar as regiões geográficas.

ANTECIPAR ATIVIDADES
O professor do ensino regular precisa articular seu trabalho com o professor do atendimento educacional especializado. Antecipar a matéria para que o especialista transcreva os textos para o Braille ou digitalize as páginas do livro didático a ser trabalhado pode ser uma boa estratégia, mas não delegue a esse profissional todas as responsabilidades da preparação do seu material. O professor do ensino regular precisa prever as adaptações e utilizá-las em suas aulas.

ADAPTAÇÃO
Adaptar não significa entregar um material diferente para o aluno cego ou oferecer outro conteúdo em substituição ao inacessível. Adaptar não significa privá-lo do que não pode compreender visualmente, mas encontrar um caminho para transmitir determinado conceito de maneira eficaz. Cito como exemplo a escolha de um filme dublado ao invés de um legendado para trabalhar determinado conteúdo. É preciso oferecer a todos uma forma de participar das aulas.

Seu compromisso com a educação faz muita diferença para a melhoria da qualidade de ensino e para que a inclusão do aluno com deficiência visual aconteça de maneira natural. A deficiência não está na pessoa, e sim na condição oferecida a ela para ultrapassar as barreiras físicas, atitudinais e comunicacionais.

Luciane Molina é pedagoga e pessoa com deficiência visual. Atua com educação inclusiva e formação de professores.