quinta-feira, 31 de maio de 2018

TELONA QUENTE 238


Roberto Rillo Bíscaro

Há quem tema a meia-noite como horário pra bruxarias e macumbas. Mas, cabulosa mesmo é a terceira hora da madrugada, quando os demônios se fortalecem, talvez porque seja espelho das 3 da tarde, hora em que Cristo supostamente expirou na cruz romana.
Vários filmes da franquia Amityville usam as 3:15 da manhã, porque a família DeFeo foi exterminada por um de seus membros mais ou menos a partir desse horário. Como fiz dossiê Amityville, em 2016 (confira aqui), não poderia deixar de conferir e comentar a recente adição de Amityville: O Despertar (2017) ao catálogo da Netflix.
O mundo ficcional do filme existe em um planeta onde os crimes, fenômenos sobrenaturais e até os outros filmes sobre Amityville existiram. Cenas do original de 1979 aparecem, quando as personagens adolescentes o assistem precisamente às 3 da manhã pra sentirem melhor qual é a vibe da casa. Pena que esse caráter metacinematográfico não seja aprofundado. Se bem que em Amityville: O Despertar nada é. É bem filmado, correto, mas não passa disso.
Cônscia do passado macabro da residência, uma mãe se muda pra lá com 2 filhas e um filho em coma. Secretamente, ela espera de verdade que o cérebro vazio do rapaz seja preenchido por algum demônio. Como dizem que é bom ter cuidado com o que se pede aos deuses, quando é atendida, as coisas vão mal.
Como contraponto, o demo terá uma adolescente meio gótica, que percebe que a recuperação súbita do mano é boa demais pra ser vera. Pra que Bella seja informada sobre os antecedentes letais da morada é que aparecem de forma absolutamente arbitrária, as 2 personagens teens, sendo que um deles é o Noah do filme, ou seja, o menino que sabe tudo sobre filmes de terror e suas mitologias.
Amityville: O Despertar traz um ou dois sustos, mas nunca decola, porque nada e aprofundado e nem morte quase tem. Dá pra ver, passa o tempo, é melhor do que muita porcaria da franquia, mas é só pruma vez e pronto.

quarta-feira, 30 de maio de 2018

CONTANDO A VIDA 233


VAMOS FALAR DE ALZHEIMER...

José Carlos Sebe Bom Meihy

Somos mortais, é muito bom não esquecer. Mas, quando justamente o esquecimento torna-se matéria relativa a o drama final da existência, tudo se emaranha, e, de maneira instintiva, em atropelos defensivos, sentimos o peso da mão que apaga a fantasia da eternidade. E ficamos quietos, atônitos, perdidos. O silêncio, nesses casos, é cruel e tudo fica ainda mais sinistro quando constatamos que a cultura consagra a lembrança como meta. É assim que, como patologia pessoal e social, a erosão da memória de um ser humano se transforma em espetáculo impiedoso, e coloca o conjunto familiar em cenas dantescas, horripilantes mesmo. E desconhecidas.

Calcula-se que atualmente existam em nosso planeta cerca de 800 mil pessoas acometidas do chamado Mal de Alzheimer. Avalia-se que em 2050 serão 135 mil. Tudo se complica na medida em que a longevidade ganha terreno - vivemos muito mais do que nossos antepassados -, e os avanços da medicina multiplicam sucessos afeitos a sobrevivência. No rastro dessa trajetória, o Alzheimer alça protagonismo, pois acometendo pessoas com mais idade impõem diferenças de outros males comuns a senilidade. Antes falava-se de demência em geral, hoje sabe-se de especificidades. Diagnosticada pela primeira vez em 1906, pelo psiquiatra alemão Alois Alzheimer – que a descreveu como “uma doença peculiar” – demorou-se muito para que a comunidade médica a distinguisse do simples desgaste ou degenerescência. Aos poucos, insidiosamente, como visita impregnante, sua presença indesejável vem se fazendo notar, a cada dia mais próxima de nós. E demorou para ser entendida. Entre os fatores que atrapalharam as indicações do Dr Alzheimer situava o prestígio das teorias de Freud que àquela altura encantavam plateias com detalhamento do inconsciente, id, ego, superego, complexo de Édipo. Alzheimer, por sua vez, partia de uma corrente menos sedutora, e defendia que toda variação do que se conhecia como demência ou senilidade crônica tinha como raiz um fundamento biológico.

E foram precisos nomes ilustres para que a sombra dessa amedrontadora “nova doença” se anunciasse mundo afora: Rita Hayworth, Charlton Heston, Margareth Thatcher. Sem dúvida, a comovente mensagem escrita pelo ex-presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, ao tomar conhecimento da moléstia que o atingira, foi o mais eloquente anúncio do alastramento da doença. Desde então, a coleção de histórias trágicas enternece e assusta a todos. O medo decorre também do desconhecimento de causas, mas há evidências de transmissão pela carga genética. E nesse sentido, timidamente, sinto-me candidato. Quatro tios, minha mãe e meu irmão morreram com a doença. É bom que se diga que entre suas fatalidades, talvez a mais estranha é que ela propriamente não mata. A causa da morte sempre é outra, mais óbvia.

Os sintomas são sutis, chegam devagar, e são facilmente confundidos com lapsos, ausências fortuitas ou distração. Um esquecimento aqui, outro logo mais, a repetição crescente e atordoante das mesmas coisas, a falta de registros de fatos recentes, a perda da noção de espaço, tudo somado vai se amiudando na aparência de loucura. E junto algumas manifestações que deixam estonteados os familiares, amigos e circundantes: a violência explosiva, ou a passividade absoluta, a intermitência de reconhecimento. De todas diria que a síndromes de penúria, o sentimento de que se está sendo roubado ou ficando pobre, me parece, é a mais atormentadora. O olhar desconfiado, o apego a bens materiais, o zelo desmascarado pelos próprios pertences nos dimensiona a profundidade da ilógica. Frente a essa trama impõe-se outra determinação da doença: a necessidade de reposicionamento de todos os que convivem com a pessoa atingida. Sim, para quem não padece do mal em si, a vida continua normal, os acontecimentos cotidianos transcorrem na mesma dialética. É assim que demoramos para aceitar o próximo que vai se diferenciando, se alienando, se constituindo em um mundo que não nos reconhece, e o que é pior: onde não mais cabemos.

A tristeza da situação é amargada pelo não caminho de volta. À favor da fatalidade em muitos casos pessoas tornam-se como crianças. Ainda que haja muita pesquisa para tratamentos, os que estão dispostos ao público são meros paliativos, e isso contribui para um dos fenômenos mais imediatos, a depressão de familiares. Não sabemos como trabalhar com esta situação e na tradição em geral, onde o culto ao corpo ostenta a bandeira da saúde juvenil, isso fica mais ultrajante. E nem há muitas casas especializadas no cuidados, fato que transforma alguns logradouros em verdadeiros depósitos humanos.

Não se pretende com esta reflexão multiplicar os tétricos corredores do labirinto desse mal. O que se propõe é que comentemos sobre o assunto e exercitemos nossa fala no esforço de entendimentos que superem a surpresa e a piedade. Até pouco tempo, o autismo era pouco admitido, mas campanhas ampliaram o espaço de seu entendimento. O Alzheimer agora nos desafia além do medo. Vamos falar sobre o assunto. Vamos?

terça-feira, 29 de maio de 2018

TELINHA QUENTE 311


Roberto Rillo Bíscaro

Para tantos estrangeiros, a Holanda é paraíso/pesadelo permissivo de drogas e sexo livres. Mas, o pequerrucho reinado tem bolsões onde impera religiosidade em moldes bem Puritanos. Onde mulher é submissa, anda de vestidão e não faz aborto; onde ninguém fuma haxixe ou consome álcool.
Foi desse ambiente rural, que fugiu Eva (olhem que nome simbólico, gentchy!) para viver com seu namorado Peter, crítico de música pop que jamais fumara um baseado até o capítulo 4 ou 5, WTF? Vivem em Amsterdã, mas decidem adquirir casa no subúrbio pra melhor criar a vindoura neném. Mas, quando se mudam pra lá, uma tragédia já se passara com o casal e isso mudará muita coisa.
Essa é a premissa da primeira temporada de Nieuwe Buren. Os Novos Vizinhos do título logo fazem amizade com Steef e Rebecca, liberais que fumam baseado e fazem troca de casais, daí o título internacional The Swingers, que empresta bastante conotação moral ao show, diferentemente do original holandês.
A interação entre essas personagens causará grande explosão emocional, que começamos a descobrir já na cena de abertura. Durante todo o percurso, sabemos que tudo acabará num banho de sangue. Não sabemos quantos morrerão, mas cada capítulo abre com trechos de interrogatório ou um detalhe do tiroteio, pra depois seguir com legenda tipo “11 semanas antes”.
Desse modo, em Nieuwe Buren supostamente deveria interessar o percurso condutor à tragédia; o porquê aconteceu e não muito o quê. Não é bem isso que ocorre.
Novelão vulgar no fundo d’alma, Nieuwe Buren não necessitava duma dezena de episódios pra nos fazer entender os motivos que levaram à tragédia, O roteiro é por demais reiterativo e às vezes a ingenuidade boba de Peter ou a desnecessidade do “alívio cômico” de Jasper incomoda.
Os dois casais são material estético de soap opera: lindos e gostosos a sua maneira manipulada de representação: Peter e Eva mais clean, “inocentes”; Steef e Rebeca, mais malandros e morenos. Segredos vão sendo revelados e tramas paralelas juntam-se pra desaguar no final sangrento, que traz surpresa, mas depois de demasiada enrolação. Daria pra fazer tudo e ter até efeito melhor, em cinco capítulos.

segunda-feira, 28 de maio de 2018

CAIXA DE MÚSICA 316

Roberto Rillo Bíscaro

Em entrevista ao Sunday Express, Midge Ure revelou que o Ultravox provavelmente tenha terminado. Aos 64 anos, ele é o caçula dos synthpopers e já não há mais clima, tempo e disposição pra tentar “fazer a América”. O grupo foi especialmente famoso na primeira metade dos anos 80, mas nunca popular nos EUA, sonho dum monte de artistas de países de língua inglesa.
Condecorado pela rainha; sóbrio há anos; coautor do clássico Do They Know It’s Christmas, pra ajudar etíopes famintos, Midge não deveria se sentir inferiorizado por não ter conquistado a bastante impermeável ianquelândia. Sua carreira-solo também teve apogeu comercial nos 80’s, mas o músico volta e meia voltava com material.
Ainda com cacife para garantir contrato em gravadora major, dia 1 de dezembro saiu Orchestrated, pela BMG. Assim como fizeram Echo & the Bunnymen e seu falecido colega no Visage, Steve Strange, Ure repaginou sucessos solo e com o Ultravox, em versões orquestrais. Para tentar mais ainda os fãs remanescentes, o britânico colocou a inédita Ordinary Man na tracklist. Ela é até mais legal que a dispensável Lament, mas padece da maldição de estar sanduichada entre canções com as quais estamos familiarizados há décadas, inclusive Lament, daí não tem muita chance.  
O Ultravox não fugiu à contradição inerente a muito do synthpop que ganhou as paradas no início dos anos 80: o instrumental aspirava à assepsia gelada, mas os vocais eram fogosos e apaixonados. Em Orchestrated, essa dicotomia não faz mais sentido: é tudo dramático. Hymn e Dancing With Tears In My Eyes foram desaceleradas e ganharam nova vida: a primeira muito mais afinada com sua letra fervorosa e a segunda mais atinente à melancolia do holocausto nuclear de que fala a canção. Não que os originais tenham errado em ser synthdance; não se trata de dizer que melhoraram, apenas ficaram diferentes e a partir de agora podemos amá-las também nessas versões.
Man Of Two Worlds também está mais vagarosa, mas continua celta: antes a gente cantaria durante imaginária batalha; agora é pra preparar o espírito no pátio do castelo. Death In The Afternoon quase dobrou de tamanho, ficou mais grandiosa e cheia de suspense do que o original, sem perder a pegada dançante em seu miolo. Midge Ure consegue botar fã pra dançar até com orquestra. Não é mais locomotiva synthpop, mas The Voice e Reap The Wild Wind ainda mexem quadris.
Qualquer compilação ou releitura ultravoxiana terá seu centro no hino New Romantic, Vienna. Em 1980, Ure e companheiros já misturaram orquestração com synths esparsos; extremidades lentas, com miolo mais animado; Kraftwerk encontrava Strauss. Vienna impressiona até hoje, é tesouro nacional na Inglaterra e sagrada pra fãs da banda e dos anos 80, em geral. Ou seja, melhor não desfigurar o sagrado pra não ser queimado como herege. Respire aliviado quem ainda não ouviu ou sequer sabia sobre Orchestrated: a macacovelhice de Ure conseguiu a proeza de manter tudo que Vienna oferece, mas em versão orquestral (com alguma ajudinha tecnológica, claro, porque ninguém é só acústico).
Se nem o Ultravox foi tão grande em sua terra natal (no Brasil então...), imagine a carreira-solo de Midge Ure. Mas, é difícil não se derreter com a doçura apaixonada de Breathe. Quem não sonha em ouvir “breathe some soul in me/breathe your gift of love to me/breathe life to lay 'fore me/to see to make me breathe”? Além do que, Midge tá cantando melhor do que no original. Quero ver você resistir ao crescendo de If I Was e não querer entoar junto.
If I was a soldier
Captive arms I'd lay before her
If I was a sailor
Seven oceans I'd sail to her
If I was a painter
I'd paint a world that couldn't taint her
If I was a leader
On food of love from above I would feed her
If I was a poet
All my love and burning words I would show it
Nossa, muito lindo esse álbum!

domingo, 27 de maio de 2018

DUPLA SUPERAÇÃO GUATEMALTECA



Roberto Rillo Bíscaro

A Guerra Civil da Guatemala ocorreu de 1960 a 1996, entre o governo e vários grupos de guerrilha que a ele se opunham. Estima-se que cerca de 150.000 pessoas pereceram e 40.000 desapareceram.
Nesse contexto, atentados terroristas eram rotineiros. Em 5 de setembro, de 1980, uma bomba explodiu num terminal de ônibus na capital guatemalteca ensurdecendo o bebê Fausto Müller para o resto da vida e matando sua mãe.
Trinta e sete anos depois, o irmão de Fausto, o músico e cineasta Kenneth Müller roteirizaria e dirigiria Septiembre, Un Llanto en Silencio, provavelmente o único filme guatemalteco da grade da Netflix.
Só por isso já deveria despertar curiosidade por uma checada, afinal, quantos filmes centro-americanos você já viu? Sintomático que os atores centrais sejam mexicanos; não deve haver mesmo indústria cinematográfica pujante no pequeno e pobre país. Isso deve ser lembrado para os devidos descontos para um roteiro que se desenrola aos sobressaltos e nada aprofunda.
Malgrado suas diversas falhas, Septiembre, Un Llanto en Silencio tem o mérito de apresentar uma personagem surda, mais humanizada, fazendo birra, se envolvendo com o cara errado, sendo sexy, desafiando o pai. Enfim, não se trata do deficiente como ser “especial” ou cuja defasagem é o centro de sua existência.
Müller transformou sua inspiração em personagem feminina e mostra um pai que ficou só e teve que enfrentar a barra de criar a filha surda. Ressente-se que a estória não tenha sido lapidada, mas espectadores formalmente menos exigentes poderão focar no aspecto humano da superação e apreciar Septiembre, Un Llanto en Silencio, que por si só já é história de superação, afinal, em cenário tão ofuscado quanto o da Guatemala, o diretor vendeu seu produto que custou 200,00 dólares à gigante do streaming.

sábado, 26 de maio de 2018

ALBINISMO NO CONEXÃO BAHIA - ASSISTA

No Conexão Bahia de sábado, 26, o programa colocou em pauta o albinismo, bateu um papo com pessoas que tem esse distúrbio congênito e com a associação que promove conscientização sobre o assunto.

O programa mostra o trabalho da Apalba, Associação de Portadores de Albinismo da Bahia, que busca conscientizar os albinos acerca dos cuidados e peculiaridades dessa condição, além de promover aceitação e melhora da autoestima.

Você assiste à matéria, no link:


https://gshow.globo.com/Rede-Bahia/conexao-bahia/noticia/reveja-os-videos-do-conexao-bahia-de-sabado-265.ghtml

sexta-feira, 25 de maio de 2018

NEM TUDO QUE É BRANQUINHO...



Albinismo não é a única alteração genética que deixa as cobras brancas

Na natureza outras situações alteram a cor e a pigmentação dos répteis. Cor dos olhos indica se é albinismo ou não.


Com certeza você já ouviu falar no albinismo, uma alteração genética que pode ocorrer entre os seres vivos e consiste na ausência completa de melanina. A maioria das cobras albinas tem em comum a cor dos olhos, eles são vermelhos, uma vez que falta pigmentação suficiente para ter olhos de outras cores. A cor branca é predominante, mas o que pouca gente sabe é que existe uma variedade de padrões e cores que as cobras albinas podem ter. Algumas são mais amarelas e pálidas, outras puramente brancas.

Além dessa condição outros nomes explicam fenômenos parecidos, mas não relacionados geneticamente com o albinismo. É o caso do xantismo, piebaldismo e leucismo. Esse último, por exemplo, apesar de visualmente parecido com o albinismo, se diferencia por pequenas características. Enquanto o albinismo é a falta exclusivamente da melanina, o leucismo é a falta de pigmentação no geral, podendo ter fundo genético hereditário ou não. Nesse caso pode ocorrer de todo corpo ser branco ou apenas algumas partes. Para diferenciar visualmente as duas condições é necessário observar o olho da espécie, nos animais com leucismo os olhos tem a coloração normal enquanto os albinos têm olhos rosados ou vermelhos.

Já o xantismo consiste na presença exclusiva do pigmento amarelo conhecido como xantina. Assim como as outras condições, resulta em uma coloração diferente na pele, nesse caso amarelada. Curiosamente essa anomalia não é comum em répteis silvestres, uma vez que gera perda da camuflagem, mas é possível que aconteça, como é o caso dessa cascavel fotografada pelo biólogo Cezar Santos.

Nas espécies com piebaldismo a pele branca se mistura com a pigmentação natural. Isso resulta uma combinação exótica e chamativa. Essa desordem genética causa despigmentação apenas em certas áreas do corpo ou pelagem do animal e pode aparecer em diferentes espécies, desde cobras até mamíferos.


quinta-feira, 24 de maio de 2018

TELONA QUENTE 237


Roberto Rillo Bíscaro

Em 2011, a Dinamarca levou o Oscar de melhor filme estrangeiro, com Em Um Mundo Melhor, da diretora Susanne Bier. Em um mundo onde até a ex-idílica Escandinávia teme a violência, a produção faz questionamentos liberais, cujas respostas, claro, funcionam só pruma minoria.
A trama envolve 2 famílias entrecruzadas pela amizade de 2 garotos, o dentuço Elias e Christian, que perdera a mãe recentemente e era uma bomba pronta a (literalmente) explodir. O pai de Elias é um médico sueco que atende em campo de refugiados na África, sabe-se lá em qual país, afinal, tudo é “África”, é tudo igual (SQN). A comunidade no local é aterrorizada por gangue que estripa grávidas, dentre outras gentilezas.
Na Dinamarca, seu filho é vítima de bullying muito pesado na escola, não apenas pelos dentes, mas por ser sueco, porque a Escandinávia também não é uma coisa só, harmoniosa, como forasteiros fantasiam. Viram como todos temos nossas “Áfricas”? Mesmo que sejam ricas...
Quando Christian começa a frequentar a instituição e também bullynado, sua reação é de arrancar sangue da fuça do agressor. Assim, nasce a amizade entre os discriminados e infelizes garotos.
Um dia, ambos presenciam o pai de Elias, o Dr. Anton, ser humilhado e agredido publicamente por um mecânico dinamarquês (Kim Bodnia, o Martin Rohde, de Bron/Broen). Como o sueco é adepto da não-violência, vira a outra face, mas os meninos ressentidos não gostam e começam a tramar algo. Enquanto isso na África, o médico terá que confrontar novamente sua atitude supercristã de apanhar e ficar quieto, quando o líder da facção que assombra o acampamento chega de surpresa, cheio de capangas e com a perna podre. 
Com problemas paralelos na “África” e na Dinamarca, Em Um Mundo Melhor é cristalinamente claro nas perguntas que propõe e em seu propósito parabolizante. Faz isso de maneira competente, bem atuada, com suspense e drama, mas sua lógica interna tende a enxergar como violentos mais os povos e pessoas “primitivos”: os africanos e o mecânico, o qual Anton paternaliza que não teve escolha, que não se consegue se controlar. Uau, tão próximo de animais, tadinho, SQN.
Outro nó é que as decisões tomadas por Christian/Elias e Anton pra reagir à violência na Dinamarca e na “África” são problematizadas e têm desdobramentos apenas na primeira. É como se na “África” valesse fazer qualquer coisa. Como os colonizadores d’outrora.
Esses questionamentos não inviabilizam Em Um Mundo Melhor. Pelo contrário, colocam mais lenha pra discussão, afinal, quem já não teve vontade de se vingar na porrada dalguma das constantes violências que sofremos?

quarta-feira, 23 de maio de 2018

ALBINISMO NO CONEXÃO BAHIA'

Sábado, 26: associação luta pela conscientização de albinos

albinismo se caracteriza pela ausência total ou parcial de melanina, pigmento que dá coloração à pele. O Conexão Bahia deste sábado, 26, conversa com pessoas que têm esse distúrbio congênito e podem se entender e aceitar através da Apalba. A associação luta pelos direitos e pela conscientização dos albinos, especialmente nos cuidados que precisam ter para evitar problemas de pele e visão, característicos da condição.

terça-feira, 22 de maio de 2018

TELINHA QUENTE 310

Roberto Rillo Bíscaro

Tente imaginar versão bossa-nova de God Save the Queen, dos Sex Pistols. Versos como God save the queen/The fascist regime/They made you a moron/A potential H bomb malemolementemente sussurrados e acompanhados por minimalista violão joãogilbertiano. Não dá, né? É algo desse quilate o desastre em câmera lenta e som baixo da minissérie francesa Le Chalet (2017), que a Netflix incorporou a seu catálogo bem discretamente. Dessa vez há que agradecer a fortuidade: diminui a chance da meia dúzia de capítulos entediarem em escala viral.
Numa aldeia propositalmente isolada por um acidente (única cena legal de todo o show), pessoas indistinguíveis umas das outras são eliminadas e aos poucos descobrimos o segredo do passado que deflagra o massacre. Provavelmente por timidez orçamentária, a TV francesa (a Netrlix deveria se envergonhar de chamar isso de ’série original’) pegou conteúdo slasher e formatou-o como drama interpretado por atores que anunciam que alguém está morto como se dissessem que vão à vendinha da esquina comprar duzentos gramas de provolone.
Slasher precisa gerar suspense, mesmo que inflacionado, e ter mortes legais. Le Chalet não tem nada: numa das mortes, a guria tropeça, cai pra trás e bate o coco numa pedra; parece fan video dalguma franquia slasher de sucesso. A música de abertura é ótima, voz de criancinha cantando canção de ninar que fala em massacre. Mas, a trilha incidental causa tanto suspense, quanto a versão bossa-nova dos Pistols causaria.
Além de toda a sensaboria e canastrice, Le Chalet ainda dá trabalho mental pra separar o que se passa no presente e o que ocorreu, que explicará o ocorrente. Portanto, quem quiser investir tempo nisso, já se sinta avisado. E preparado pra descobrir quem são os assassinos lá pelo terceiro capítulo. Mas isso não ajuda muito, porque não sabemos qual(is) do grupo é/são e nem se está(ão) lá. Mérito pra minissérie que poderia ter sido muito legal caso tivesse injeção de capital pra adrenaliná-la.
Francamente, a tal “linda aldeia nas montanhas” não foi a mesma que vi, mas um monte de casa de madeira no meio do mato. Qualquer produção nórdica tem florestas muito mais sensacionais e séries francesas como Le Mystère du Lac (2016) são ambientadas em locais que dão de dez.
Sem qualquer traço redentor, aguentei Le Chalet até o fim, porque sou viciado em slasher e já havia visto Scream e Slasher, do catálogo netflixiano. Por que a Netflix não usa melhor o dinheiro de minha mensalidade e compra direitos de séries francesas decentes, como Missions ou Lanester?

segunda-feira, 21 de maio de 2018

CAIXA DE MÚSICA 315

Roberto Rillo Bíscaro

Enfadonho o mimimi de gente preguiçosa que não sai do pior das redes sociais e sintoniza apenas a macromídia mais peba e se lamuria de que não há mais música boa no Brasil.
Há fartura de projetos e carreiras musicais em tudo quanto é estilo. Existe grupo baiano de bluegrass, selo independente de noise eletrônico em Porto Velho, shoegaze em Sampa, stoner no sul, lo-fi em Minas.
Pros apreciadores da MPB mais “tradicional” (o que quer que isso signifique, mas neste blog é a que soa meio como a produzida nos 70’s e 80’s iniciais) a oferta também não é escassa; é só querer procurar na rede, porque ela abunda em sites, inclusive oferecendo muito material grátis.
Trabalho excelente da safra atual é o do compositor e multi-instrumentista Flávio Tris, que, felizmente, abandonou a advocacia pra se dedicar em tempo integral à música. Há uma década fazendo trilhas-sonoras e espetáculos, o paulistano lançou EP independente, em 2011. Cinco faixas compostas por Tris e executadas por ele, mais Tchelo Nunes, Maurício Maas e Gianni Dias, participando na guitarra da canção Pra Ver a Voz. As instrumentações são densas e lindas, com violino, harmônio (espécie de órgão), acordeão e percuteria.
A hibridez de subgêneros é um dos traços característicos da sigla MPB, criada lá pelos fins dos anos 60 pra dar conta, dentre outras coisas, da acelerada fusão de ritmos, estilos e influências na música popular feita por aqui, a partir da geleia geral tropicalista e da fusão bem mais subcutânea do pessoal do Clube da Esquina. É a isso que me refiro ao afirmar que o som de Tris vai agradar em cheio a fãs de MPB setentista: ele funde estilos diversos, mas sem chegar à contemporaneidade hip-hop ou electro. E claro que não seria defeito se o fizesse.
Alento Noturno abre só no violão pra se transformar em tango seresteiro valsificado. Asa de São João inicia com “quando olhei...”, como sua ancestral Asa Branca. E quem disse que fãs de Belle and Sebastian também não podem amar a pegada de violão bem semelhante à de If You’re Feeling Sinister? Escócia do baião! Em Pra Ver a Voz, a guitarra, que em sua maior parte segue acobertada pelo violão, rebela-se bem no finalzinho, quase ensaiando um noise básico.
A hipnótica Brisa Boa, Vento Leste é a única que não aparecerá no primeiro álbum de Flávio, mas o EP não é obrigatório só por isso. Mesmo as repetidas mais tarde, virão com arranjos diferentes.


Em 2013, saiu a estreia em álbum homônimo com 9 inéditas, além de 4 já constantes do EP. Nestas últimas, não dá pra dizer que são melhores ou piores; estão diferentes: Pra Ver a Voz ficou mais djavaneada; Alento Noturno tem cantar um bocadinho menos enfático e por aí vai. Qualquer colecionador (e Flávio merece ser colecionado) quererá ter ambas versões.
Nas inéditas, só material bom, como a faixa de abertura, com seus violões de madrigal e flautas misteriosas. Selva sassarica maliciosamente num clima jazzy anos 1920. Super Miss Fisher's Murder Mysteries! No bolero Sejas Tu, o sotaque de classe-média paulistana de Tris encontra o de Tulipa Ruiz. Este álbum tem uns balanços bons, tipo De Manhã com seu funk jazzificado e a marchinha final, Tudo, que acaba ligando Tris a seus coetâneos Pitanga em Pé de Amora. Os “efeitos sonoros” como pássaros cantando e macacos na xotosa Pandora e o clima épico de música de Festival sessentista suavizar-se-ão deveras no trabalho seguinte.


Entre 19 e 22 de dezembro, de 2016, Tris gravou Sol Velho Lua Nova, lançado ano passado e que representou bombástica novidade silenciosa. Despindo os arranjos ao mínimo necessário, sua poesia por vezes rosiana e voz quente à Dori Caymmi sobressaem-se em 9 faixas de calma e/ou mistério. O EP e o álbum primeiro são ótimos, mas faixas como a título, por exemplo, possuem aura de delicadeza até então inédita em sua carreira.
Não que seja álbum de, mas na pátria da bossa nova, Tris parece mais ligado a ela nesse trabalho, como mostra a primeira parte de Quinze Mil Eras, que também serve de exemplo pra dizer que o fato de Sol Velho Lua Nova ser mais minimalista e centrado na voz e violão, não significa que seja “música de barzinho”, em seu acepção mais breguinha. Há outra instrumentação e efeitos sonoros, no caso, chuva em Quinze Mil. O que ocorre é que o violão toma o centro e em seguida algum outro instrumento o acompanha.   
Difícil ouvir o louvor Terra Terra e não catalogá-la como canção-irmã daquela de Caetano, mas sem ser cópia. Em In Silence, o cantor-compositor adentra terreno folk sessentista; soa como se a qualquer segundo a gaita de Bob Dylan vá entrar. As influências afoxentas nordestinas ainda informam Flávio, como em Okiri ou Uma Canção, mas é tudo mais minimalista; às vezes primeiramente sinalizado no cantar, antes do que na esparsa instrumentação.
Inacessibilidade para ouvir essa maravilha não é desculpa, porque a excelente discografia de Flávio Tris sai de graça em seu site.
E vamos parar de dizer que a MPB morreu e outras sandices preguiçosas? Procura, que tem! 

sábado, 19 de maio de 2018

ALBINO GOURMET 259

sexta-feira, 18 de maio de 2018

PAPIRO VIRTUAL 126


Roberto Rillo Bíscaro

Quando Policarpo Quaresma cisma em aprender a tocar violão, sua reputação de home sério começa desmoronar perante os vizinhos. À época de Triste Fim de Policarpo Quaresma (1915), fino era tocar piano. Violão era coisa de seresteiro vagabundo. O instrumento era associado às classes populares pardas e pretas.
Naquele tempo, muito do que hoje é considerado tipicamente “brasileiro” era marginalizado. Mais ou menos a partir dos anos 1930, o populismo de Getúlio Vargas começa a valorizar, violão, samba, feijoada, miscigenação, carnaval, futebol.
Segundo determinado viés explicativo, esses e outros elementos da influência afro em nossa cultura são apropriados pelos brancos, num crescente processo de branqueamento da cultura.

Em 2008, Patrícia Fátima Crepaldi Bento da Silva defendeu dissertação de mestrado na PUC paulista intitulada As transformações na música popular brasileira: um processo de branqueamento, na qual defende que o movimento da Bossa Nova foi o grande catalisador da exclusão dos músicos negros do panteão dos grandes da MPB.
Os meninos e ninas brancos da zona sul carioca, envoltos no afã modernizador dos anos JK, propuseram-se a refinar nossa música popular, despindo o samba de sua negritude e excluindo afrodescendentes, como Alaíde Costa e Johnny Alf. Segundo a autora, Jobim & Cia desprezavam o sambão suburbano e transformaram-no em algo mais “branco”, palatável para a classe-média ansiosa em ser cosmopolita. Com isso, o violão e a própria profissão de músico passaram a ser valorizadas e influenciaram todo o desenvolvimento histórico de nossa música popular, que passaria a se chamar MPB alguns anos depois.
Nessa mesma perspectiva, a socióloga defende que todos os “movimentos” musicais até o Tropicalismo fizeram o mesmo, a saber, a canção de protesto, a jovem guarda e os festivais da canção.
Partindo do arcabouço crítico de José Ramos Tinhorão, que sempre teve má vontade com tudo que não seja “popular”, a dissertação peca por não problematizar seus referenciais teóricos, até porque Tinhorão não morreu de amores pelo Tropicalismo só porque Gil é negro. Na verdade, ele afirmou que era “uma boa malandragem”. Nem o “autêntico” Cartola escapou da metralhadora tinhorânica: As Rosas Não Falam seria um plágio. E Cartola era negrérrimo e não-bossanovsita.

A autora tem razão quando denuncia as tentativas de minimizar ou desconsiderar os reclames dos afrodescendentes como vitimismo ou apresentando as exceções confirmadoras da regra da exclusão. Seria o caso do icônico Milton Nascimento, que aliás, também não escapou de Tinhorão. Um breve passeio, que fosse, pelas principais posturas do controverso crítico enriqueceria o trabalho.
As transformações na música popular brasileira: um processo de branqueamento está disponível para leitura/download no site: