quarta-feira, 30 de setembro de 2015

CONTANDO A VIDA 125

Nosso historiador-cronista - especialista na obra de Lobato - anda cheio das releituras acusatórias contra o autor do Picapau Amarelo. As acusações de preconceito racial não deveriam ser contextualizadas no momento da produção das obras? E mais, não há plurais exemplos de diversidade na obra lobateana? 

PARA LER LOBATO HOJE – PERGUNTAS SOBRE 
DIVERSIDADE E PLURALISMO

José Carlos Sebe Bom Meihy

Um dos graves problemas afeitos às leituras de autores que escreveram em outros tempos é a “presentificação”. A retomada de livros produzidos em contextos diferentes tem implicado em deformações que, quase sempre, anulam o espaço e tempo da escrita, bem como as características das recepções públicas de tais trabalhos, constantemente reeditados. Tomando Monteiro Lobato como exemplo maior em nosso círculo, deve-se considerar algumas particularidades desse escritor que figura entre os cinco mais lidos na cultura brasileira. Falecido em 1948, desde 1914 teve seus textos estampados em diferentes suportes: artigos de jornal, panfletos, cartas e, sobretudo em livros. Tanto a chamada “literatura infantil” como a “obra adulta” geraram leitores de várias gerações, ao ponto de se justificar a expressão “Filhos de Lobato”.
De diferentes maneiras, tipos sociais brasileiros e estrangeiros foram abordados pelo escritor de Taubaté. Tais figuras, pela pujança da narrativa lobateana, ganharam destaque como referência na cultura brasileira como um todo. Assim, personagens como: o caipira, o negro, o índio, o imigrante, se combinaram em diferentes tramas que também envolviam crianças, adolescentes, familiares e neste caso, principalmente, uma composição relacional bastante diferenciada, fugida da convenção parental que reza a regularidade da presença de pai, mãe, irmãos. Reside nessa concepção plural de mundo uma das riquezas do autor de “Caçadas de Pedrinho” e “Cidades Mortas”. É chegada a hora de se pensar as contexturas de tais personagens. Que acordos, ajustes e pactos existiriam entre tão cativantes e diversificados tipos? Além da procedência – campo ou cidade –, da cor da pele ou etnia – brancos, pretos, índios, mestiços, imigrantes –, como se deram os laços afetivos que articulavam os casos? É justo analisar em exclusivo, tipos descontextualizados? E o que dizer do conteúdo de “outros seres como “boneca de pano”, “sabugo de milho”, animais falantes e personagens importados de outras literaturas e cinemas?
Há, perversamente, razões maiores para a retomada da obra de Monteiro Lobato hoje: a existência de campanhas que se arvoram como libertárias de preconceito e que, portanto, trabalham com a noção de identidade – em particular identidade étnica – isolando dos casos alguns tipos sociais, em particular o negro. A reinserção desses personagens nas histórias significaria alguma coisa a mais? Pensemos nessa pergunta para avançar na interpretação de Lobato como pensador que, sobretudo, propôs a diversidade inscrita na ficção. Além da prolífica multiplicidade de personagens, da mistura fina de faixas etárias, da movimentação de gente do campo, da “cidade morta”, das metrópoles, de tipos oriundos de outros países e até de esferas invisíveis, seria justo anular as formas de tratamento de uns com outros. Falemos de empatia e dedicação. É possível ler Lobato sem considerar o significado da graça narrativa? Tomemos, a propósito o caso de negros, tanto na obra dita “para crianças” como “para adultos”. Se de um lado temos a cativante “Tia Anastácia” como detentora de “causos”, depositária de lendas e repertório de receitas da melhor culinária, não residiria exatamente nessas qualidades o imenso afeto que a torna algo mais do que “macaca”? Por que não considerar o termo “tia” como capital? Que dizer então de “Negrinha” que foi deixada na fazenda vendida como objeto? Não haveria aí um brado de denúncia? E o “Jardineiro Timóteo”? Pode-se, curiosamente, multiplicar tais situações pelos índios – veja-se o conto “Marabá”, por exemplo –, ou pelos mestiços como se passa com o surpreendente “Bocatorta”.
É tempo de se repensar Lobato. Até, saudando as críticas atemporais, torna-se importante (re)apropriar aqueles escritos como dimensão histórica e intensificar o debate. O respeito à produção de Monteiro Lobato reclama reflexões sobre o preconceito como tema, mas muito mais sobre a combinação da diversidade.

terça-feira, 29 de setembro de 2015

EDIMBURGO

A capital da Escócia é deslumbrante em mais de um sentido. Arquitetonicamente é um arraso; caminhar pelas planas ruas e avenidas da cidade não muito grande é um prazer aos olhos. Cultural e gastronomicamente você encontra de um tudo. Não deixe de tomar um refrigerante local artificialésimo, mas orgulho deles. É doooce pra burro e tem meio cor de refri de laranja,, mas sei la que tinta é aquilo. Não lembro o nome, mas você achará em tudo quanto é canto; basta perguntar pelo refri local.
Pra albinos, Edimburgo é fantástica, mesmo no verão. Não faz sol!! Paraíso! Mas, tem que passar bloqueador solar, porque os raios UV não deixam de existir. Fiquei alguns dias em julho e choveu todo dia. A maioria dos ocais é totalmente acessível, o trânsito respeitoso, enfim, destino indicado pra deficientes visuais.
Edimburgo, totalmente voltável e morável.  















TELINHA QUENTE 179

Roberto Rillo Bíscaro

Assim como minha geração se encanta garimpando pérolas B dos anos 50/60 com seus filmes de monstros atômicos e animais ensandecidos, a moçada do futuro terá fartas minas nesse início de século 21, quando a produção pra cine e TV é zilhões de vezes maior, há muitos centros de produção e não falta talento pra produzir podreiras de praticamente qualquer sub-sub-sub-gênero imaginável.
Um desses nichos é o de filmes sobre tubarões, essas simpatias que não saíram da moda desde o de Spielberg. Parcialmente responsáveis pela má reputação do pobre animal, as produções tubarônicas abundam e foram temas de pelo menos 2 postagens (aqui e aqui) uma, inclusive, dum tubarão albino; sem contar a do desenho do Tutubarão, fofurizando o peixão. Se eu fosse seguir a produção, teria que ter visto Sharktopus, Sharktopus vs. Pteracuda e mais.
A computação gráfica fez esses filmes serem bem baratos, por isso a TV é a grande responsável por essa rede de tubarões mutantes insanos.  O canal Syfy e a produtora The Asylum são os culpados por Sharknado (2013), que enrolei pra ver, mas me rendi: como escapar dum cult instantâneo? Um megaciclone transporta milhares de tubarões pros esgotos e piscinas da Califórnia e os bichões literalmente caem do céu, daí a mistura de shark (tubarão) com tornado.
Tudo é tão ruim que se torna divertido. Pra curtir Sharkando você não deve se preocupar com detalhes do tipo: como tubarões sobrevivem tanto tempo fora d’água? Com podem nadar numa sala de estar na qual os personagens conseguem andar com a água batendo nos joelhos? Como em uma cena o céu está carregadíssimo e os protagonistas em desespero e na seguinte esses mesmos desesperados estão sob céu ensolarado com a vida em Los Angeles transcorrendo tranquilamente? Mas, na verdade, quem aceita assistir a um filme chamado SHARKNADO nem deveria cogitar tais perguntas.
O negócio é reunir amigos, pegar pipoca e cerveja e gargalhar. E ver John Heard, excelente e premiado veterano, ganhando uns trocados pra garantir a aposentadora “interpretando” um bêbado que logo é eliminado. Sorte dele.
Em 2014, houve sequela, dessa vez com um tornado de tubarões atingindo Nova York. Kelly Osbourne e diversas (sub-) celebridades nova-iorquinas fizeram ponta, mas a piada perdera a graça. E um terceiro sharknado, agora em DC, atingiria as telinhas ianques, em julho, mas sequer confirmei no IMDB se houve mesmo exibição. Síndrome de tubarão: a gente vê, devora e parte pra outra. Sharknado é passado, quero novidade. 

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

CAIXA DE MÚSICA 185

Roberto Rillo Bíscaro

Dobradinha de novo; desta vez a união entre os álbuns é sua ligação com a Melhor Década.

Em 2013, da Inglaterra veio o single Something About You, dum Dornik, faixa downtempo de neo soul meio esfumaçada. Depois vieiram Drive com guitarrinha suingada e produção a la acid jazz de início dos anos 90 e Stand In Your Line, com seus mais de 6 minutos de eletrosoul. Silêncio até mês passado, quando saiu álbum de estreia homônimo, com 10 faixas, sendo que as 3 canções já lançadas constam no trabalho.
Dornik abre com Strong, que tocaria em todas as aulas de aeróbica da primeira metade dos anos 80, que é de onde saiu – assim como boa parte do álbum. Percussão de Prince fase-1999 e, sobretudo, aquela voz influenciada pelos maneirismos e timbres de Michael Jackson. O fantasma do Rei do Pop assombra Dornik – álbum e artista – pro bem e pro mal. Wacko Jacko era genial, mas depois dalgumas faixas ouvindo quase imitação de alguns de seus tiques, pode dar vontade de tocar o original. Por mais que Shadow seja sombra de Human Nature, a sétima faixa de Thriller é superior demais pra Dornik ficar aguçando nosso desejo de ouvir Sua Trágica/Mágica Majestade. Em sua maior parte, Dornik-álbum é eletrosoul downtempo agradável de se ouvir, mas meio indistinto um do outro, exceto pela deliciosa Chain Smoke, que parece gravada no 1985 de nossa memória.
Como primeiro álbum, Dornik está bastante bom: compraz, entretém e oferece agradáveis jams com voz gostosa. Mas, o meninão tem que tratar de burilar identidade mais forte, senão se perderá nas areias do tempo como Rockwell.

Há um punhado de canções nesta playlist:

Greg Kurstin é produtor requisitado/premiado, então, todo mundo quer trabalhar com ele: Lana del Rey, Sia, Billy Idol, Lily Allen são fração dos produzidos. Inara George vive ocupada com projetos múltiplos e a família. Por isso, The Bird and The Bee (TBATB), a dupla de indie pop formada pelos 2, grava tão esporadicamente. O último lançamento fora Interpreting the Masters Volume 1: A Tribute to Daryl Hall and John Oates, resenhado aqui. Os mestres calaram fundo no TBATB, porque Recreational Love, lançado em julho, traz um (dance) pop básico e bastante influenciado por Hall & Oates e anos 80, sem jamais soar como cópia. As influências estão mais na composição e nos detalhes dos arranjos das 10 canções, perfazendo um CD de menos de 35 minutos.

A elegância deslizante da faixa-título recria Hall & Oates com arranjo esparso e pitadas de soul, virando TBATB e não carbono. Doctor inicia soando como synth pop a la Flock of Seagulls e tem até solo de sax, instrumento-instutuição da saxodécada, mas evita a mecanicidade de parte da produção oitentista. Ao invés, é uma melodia com alma e pegada irresistível pra dançar, com sua ironia pedindo comprimidos ou amor ao médico. TBATB faz pop pra adultos com letras sobre filhos e jovens arrogantes quebrando a cara (prazer não muito disfarçado de muitas testemunhas de meia-idade). Jenny é uma locomotivazinha balançante onde a voz de anjo de Inara fica nervosa! Los Angeles é declaração à cidade-natal com refrão grudento; não paro de cantarolar “living in La, la la la la la” levitando pelas calçadas. Lovey Dovey é pop de ninar que diz tudo no título e encerra um disco curto pela falta de tempo do duo, mas também porque como sabem como e o que dizer, não precisam enrolar.

Pop fofucho cuti cuti.

Diz que nesta playlist Recreational Love está completo. Tente:

MELECA NO OLHAR

Por que nossos olhos formam a remela?

A primeira coisa que faço quando acordo de manhã é checar a longa lista de alertas que se acumularam silenciosamente no meu smartphone enquanto eu dormia. A segunda coisa que eu faço é limpar a “meleca” que se acumulou silenciosamente nos cantos dos meus olhos no mesmo período.
Apesar de a remela (ou ramela) ser algo comum a todos nós, sempre me intrigou saber do que ela é feita e por que ela existe. Então, decidi investigar.
Tudo começa com a lágrima – ou mais exatamente com o filme lacrimal que reveste nossos olhos.
Em todos os mamíferos terrestres, essa película contém três camadas e permite que os olhos funcionem bem. A camada mais interna é a de glicocálix, formada principalmente por muco. Ela reveste a córnea e atrai a umidade, o que permite a distribuição uniforme da segunda camada, a aquosa.
Essa segunda camada tem a mesma espessura de um fio de teia de aranha, mas é muito importante, pois é ela que mantém nossos olhos lubrificados e os defende de possíveis infecções.
A camada mais externa é composta de uma substância oleosa chamada “meibo”, formada por lipídeos, como ácidos graxos e colesterol.


Image copyrightSPL
Image captionRelaxamento dos dutos de glândulas faz secreção escorrer pelas pálpebras

O meibo está altamente afinado com o organismo dos mamíferos: a uma temperatura corporal normal, trata-se de um fluido oleoso transparente; com apenas 1ºC a menos, no entanto, ele se torna mais sólido, esbranquiçado e parecido com uma cera.
São dois os principais fatores que fazem grandes blocos desse sólido se formarem durante o sono. Em primeiro lugar, porque o corpo costuma se resfriar ligeiramente durante a noite. Portanto, parte dessa substância se torna fria o suficiente para se tornar sólida.
Em segundo lugar, de acordo com um estudo do oftalmologista Robert G. Linton e seus colegas do Royal Perth Hospital, na Austrália, porque o sono relaxa a ação muscular dos dutos das glândulas meibobianas.
“Isso é suficiente para provocar um excesso que corre pelas pálpebras e raizes dos cílios durante o sono”, afirma o médico.
Não se trata de um problema difícil de resolver: basta lavar bem os olhos para nos livrarmos da remela. Mas por que ela existe?
Para começar, porque ela evita as lágrimas caiam dos olhos constantemente e saiam rolando pelas nossas bochechas, o que seria um enorme incômodo. E, ao reter a lágrima nos olhos, o meibo faz outra coisa: ele ajuda a manter os olhos umedecidos.
Evitando os olhos secos


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Image captionAtividades do dia-a-dia moderno têm feito pessoas piscarem menos do que o necessário

Essa substância não é o único fator que ajuda a evitar que os olhos se sequem. Piscar também é importante, já que o movimento estimula eficientemente as glândulas meibomianas. Isso faz com que um pouco de meibo extra seja depositado nos olhos para além do fluxo constante da substância.
Piscar também ajuda as lágrimas aquosas e oleosas a se misturarem para formar a emulsão chamada de filme lacrimal. Se alguém passa muito tempo sem piscar, essa emulsão deixa de existir e a córnea pode ficar exposta ao ar.
Na melhor das hipóteses, trata-se de uma situação desconfortável. Mas o mais comum é que a deterioração crônica do filme lacrimal leva a uma doença chamada ceratocunjuntivite sicca ou “síndrome do olho seco”.
O oftalmologista japonês Eiki Goto, da Universidade de Tsurumi, costuma se referir a essa síndrome como um “grande distúrbio de deficiência de lágrimas” que atinge milhões de pessoas em todo o mundo.
Além do ressecamento, o problema acarreta fadiga ocular, olhos vermelhos, irritação e a sensação de que os olhos estão mais pesados do que o normal. Em casos mais graves, o distúrbio pode até debilitar a visão.
Mas, apesar da frustração associada à doença e de seu impacto na qualidade de vida, não se trata de algo considerado pela comunidade médica mundial como um problema grave.
Goto, no entanto, discorda. Usando um sofisticado teste de acuidade visual, ele descobriu que o olho perde sua superfície lisa quando o revestimento fluido seca. Problemas ópticos começam a se tornar mais comuns, porque a luz tende a se disseminar mais em uma superfície áspera, dificultando a formação de uma imagem nítida na retina.
O cientista japonês notou que pacientes com a síndrome dos olhos secos chegavam a piscar o dobro de vezes do que aqueles com lubrificação ocular normal. É possível que isso aconteça porque eles estejam tentando manter sua acuidade visual, inconscientemente.

A importância de piscar

É fácil imaginar que a solução para o distúrbio seria simplesmente piscar o mais frequentemente possível. Mas, infelizmente, nosso mundo atual e suas tarefas – ler, dirigir, usar um celular ou um computador – nos incentivam a manter um olhar constante, sem piscar.
Consequentemente, por reflexo, todos nós reduzimos a frequência com que piscamos durante essas atividades.
E, segundo outro estudo de Goto, a acuidade visual funcional média em pacientes com olhos secos era de 0.3 – muito menos do que os 0.7 necessários para uma pessoa poder dirigir um carro no Japão ou que os 0.5 exigidos nos Estados Unidos.
Portanto, amanhã, quando acordar e começar a limpar seus olhos, lembre-se de quão importante é essa “meleca”.

domingo, 27 de setembro de 2015

ZOOFILIA VAMPIRA!

Raro morcego vampiro albino é capturado em ação da Adepará


Em ação de controle de foco de raiva em herbívoros, realizada entre os dias 20 e 24 de setembro, no município de Pacajá, no sudoeste do Pará, servidores da Adepará (Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará) capturaram um raro morcego vampiro albino, da espécie Diaemus youngi, hematófago que se alimenta preferencialmente do sangue de aves. Como o animal estava em uma área de coleta de morcegos que se alimentam de mamíferos, ele foi capturado, tratado pelos técnicos da Agência e, em seguida, liberado para voltar ao ambiente natural.
“Essa espécie, quando capturada em situação normal, é liberada porque não faz parte do foco de controle, já que não se alimenta do sangue de mamíferos. Mas, por ter sido capturado em uma área de alimentos de mamíferos, ele foi tratado”, explicou a gerente do Programa Estadual de Controle da Raiva em Herbívoros da Adepará, a médica veterinária Elvira Colino.
Foi apenas a segunda captura registrada no Brasil de um exemplar albino dessa espécie, de acordo com informações do Dr. Wilson Uieda, pesquisador do Departamento de Zoologia da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Botucatu, especialista em Zoologia e Ecologia de Morcegos. Normalmente, o Diaemus youngi tem a pelagem parda amarelada e a dorsal é mais escura que a ventral.

FUNK DA SUPERAÇÃO

Conheça um pouco da história de Camila Monforte, transsexual rejeitada pela família, que teve de viver na rua, mas encontrou no funk uma forma de superar barreiras. 

sábado, 26 de setembro de 2015

O SONHO DE BARAKA

Garoto albino que teve mão decepada vai à escola e sonha ser médico

Após ter a mão decepada, o garoto tanzaniano Baraka Cosmas Rusambo, de seis anos, está indo para a escola pela primeira vez e sonha ser médico quando crescer. Baraka é uma das cinco crianças com albinismo levadas da Tanzânia aos Estados Unidos, em junho deste ano, após terem sido vítimas de mutilação para rituais no país africano. 
Atacado com um facão, Baraka, no entanto, ganhou uma segunda chance. Foi levado pela organização Global Medical Relief Fund para o país norte-americano, onde passa por tratamento e recebeu uma prótese.
Ao Daily Mail, o garoto contou que, desde que chegou aos EUA, o que mais o divertiu foi dançar com seus amigos. "Eu sempre gostei de dançar e desde que cheguei, eu tenho dançado ainda melhor", garante Baraka, que tem como canção favorita a música Nana, da cantora tanzaniana Diamond Platnumz.
A tutora de Baraka, Ester Mulungi, conta que, apesar de ter sido atacado por uma gangue, ter tido a mão decepada e vendida, o menino está sempre sorrindo e tem sido bem tratado por todos. 
Segundo ela, depois de receber a mão protética a vida de Baraka mudou bastante. "Ele pode usar os banheiros de forma independente e também consegue escovar os dentes sozinho", conta Ester. "Ele ainda quer começar a tomar banho sozinho, mas eu ainda não deixo - continuo ajudando nisso", acrescenta ela.
Ansioso para ver a mãe e as irmãs, o garoto deve voltar para a Tanzânia, mas não quer voltar para a vila onde foi atacado. "Ele se sente bem e está muito feliz. Sempre sorrindo agora ele recebeu a prótese", conclui a tutora. 
De acordo com a ONU, uma a cada 15 mil pessoas são afetadas pelo albinismo na Tanzânia. Essas pessoas, adultos ou crianças, correm risco de serem atacadas mesmo após o governo tanzaniano ter proibido a prática da feitiçaria para tentar diminuir o número de ataques. 

ALBINO GOURMET 187

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

BENEFÍCIO SUSPENSO

Quase cega, mulher albina tem benefício do INSS suspenso em GO

Ela diz que não pode trabalhar e perícia alegou que ela não é incapaz.
Dona de casa passa dificuldades e não consegue recorrer por causa da greve
Mulher albina depende de benefício do INSS para sobreviver em Rio Verde, Goiás (Foto: Reprodução/ TV Anhanguera)

Com problemas graves de visão em função do albinismo, a dona de casa Edinair Francisca da Mata, de 31 anos, afirma que não tem condições de trabalhar e depende de um benefício do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) para sobreviver, em Rio Verde, no sudoeste de Goiás. No entanto, o auxílio-doença foi suspenso neste mês, depois que a perícia alegou que ela não atende aos requisitos de incapacidade.



Para piorar, ela não consegue recorrer em função da greve dos servidores, iniciada no último dia 7 de julho. “Moro de aluguel, o [valor] daqui já é puxado. Para mim está sendo difícil porque o dinheiro que eu tenho mensalmente, tinha, aliás, era esse salário. Hoje não tenho nada. Estou vivendo com a ajuda de conhecidos”, lamenta a dona de casa, que tem uma filha de 7 anos.
Quando solicitou o auxílio-doença, há 12 anos, Edinair morava em Iporá, a cerca de 170 km de Rio Verde. Por isso, no último dia 1º de setembro, ela teve que ir até o município para passar pela perícia. Mesmo com a paralisação, ela foi atendida.

“A perita olhando para a gente já reconhece o problema de cada um de nós. Se ela tivesse um pouquinho de consciência veria isso. Ela falou que por ela estava tudo certo, mas a carta que eu recebi era falando que [o benefício] estava recusado por ela”, conta Edinair.
De acordo com a beneficiária, o documento expedido informa que ela “não preenche os requisitos estabelecidos” para receber o auxílio-doença.

Com isso, Edinair teme ficar sem o benefício definitivamente. O problema é que não consegue entrar com um recurso, já que não tem condições financeiras de voltar a Iporá, e os atendimentos estão suspensos em Rio Verde por causa da greve.

O INSS confirmou que o auxílio doença da dona de casa passou por revisão, como foi determinado pelo Tribunal de Contas da União. De acordo com o órgão, a suspensão do benefício ocorreu porque ela não atendeu aos requisitos de incapacidade para o trabalho durante a perícia.
O órgão destacou que mulher tem até esta quinta-feira (24) para apresentar defesa. Apesar da greve, o INSS a orientou a entrar em contato pelo telefone 153 ou pelo site do Ministério da Previdência Social.
Albinismo
O albinismo é caracterizado pela ausência completa ou parcial de pigmento na pele, cabelos e olhos. A doença pode ser considerada rara, já que aproximadamente uma em 20 mil pessoas têm um dos tipos do distúrbio. Por conta da condição genética, que provoca problemas de visão, Edinair diz que quase não enxerga.
A dona de casa possui um laudo de um oftalmologista atestando a deficiência visual. Além disso, há cinco anos, ela também faz tratamento com a dermatologista Angélica Gonçalves. A médica afirma que a paciente não tem condições de trabalhar.
“Ela precisa sempre, regularmente estar em tratamento, fazendo cauterizações, muitas vezes cirurgias que a gente faz para a manutenção da qualidade da pele. Tem laudo, inclusive do oftalmologista, atestando a cegueira dela”, explica a profissional.
NOTA: a reportagem em vídeo pode ser assistida no link abaixo:

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

ALBINISMO NA AGÊNCIA J. PRESS

Agência J.Press de Reportagens é um projeto do núcleo de Jornalismo da Jornalismo Júnior, empresa vinculada à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Há algum tempo contatei os editores para uma possível pauta sobre o albinismo. Logo depois, a Victória de Santi me escreveu e começamos a trocar informações e contatos, como o da Andreza Cavalli. O resultado é esta bela matéria, com fotos do Gustavo Lacerda

Valeu, Victória e galera da J. Press, vocês ajudaram demais a causa!

A realidade desconhecida dos albinos brasileiros

Através das redes sociais, o movimento albino vem se fortalecendo desde a última década. Ainda pouco conhecida, essa população assume seu espaço de luta por direitos.
Por Victória de Santi (victoriadesantiserafim@gmail.com)
Ignorada pelo Censo, pouco se sabe sobre a população albina brasileira. A invisibilidade social os fazia, até pouco tempo, desconhecidos inclusive por si mesmos. No entanto, a luta por reconhecimento hoje tem forma, e já atingiu importantes conquistas.
O albinismo, de forma simplificada, é uma condição genética que faz com que a pessoa nasça com pouca ou nenhuma produção de melanina no corpo. Ausente essa proteína que protege da radiação solar, a pessoa albina é muito mais sensível à luz e ao calor, o que torna necessário o uso constante de protetor solar. Além disso, é muito comum que pessoas albinas tenham problemas de visão e grande sensibilidade à luz, sendo quase inerente à sua condição a necessidade do uso de óculos de grau e de sol. Essas duas características tornam o albinismo uma condição cara, e viver em um país tropical, como o Brasil, aumenta muito o risco de queimaduras e câncer de pele.
Hoje, no país, a referência de luta por direitos da população albina é a Associação das Pessoas com Albinismo na Bahia, a APALBA. Surgida em 2001, é tida como uma das mais organizadas associações brasileiras para discutir as necessidades dessa população. Em Salvador já há a distribuição gratuita de protetor solar, que se intensifica no verão, além do atendimento oftalmológico e dermatológico preferencial na rede municipal de saúde. Essas conquistas são atribuídas à luta que a entidade realiza.
Segundo avalia Roberto Bíscaro, ativista e autor do Blog do Albino Incoerente, no restante do país a mobilização de grupos albinos ainda é majoritariamente virtual, em especial no Sudeste. “Acho que a falta de uma organização do tipo [como a APALBA] no sul e sudeste  contribui muito para que não tenhamos esse tipo de programa [assistencial] por aqui”, afirma.
A luta no Sudeste
A mobilização da população albina no Sudeste do país surge na época do Orkut. Andreza Cavalli foi uma das primeiras a criar uma comunidade na rede social, em 2004, voltada para essa população. Chamada de “Albinos do meu Brasil”, foi através desse meio que diversas outras pessoas albinas puderam ter contato entre si para compartilhar histórias de vida e se identificar.
Andreza, que tem dois irmãos também albinos, conta que à época eles não conheciam outras pessoas albinas e, ao buscar na rede social comunidades sobre o tema, se deparava com grupos preconceituosos. Sentiu, então, a necessidade de criar algo voltado para as pessoas com albinismo, e a partir da criação do grupo começaram os encontros, o primeiro foi em uma pizzaria em São Paulo. “No final de 2004 a gente criou essa comunidade, e aí começaram a aparecer essas pessoas. Em fevereiro de 2005, de albinos éramos eu, duas moças e os meu irmãos”.
Reconhecimento e representação
A comunidade foi impulsionada com matérias em diversos meios de comunicação, e o número de membros cresceu. Com o tempo, o grupo foi levado ao Facebook e renomeado como “Albinos do meu Brasil e do mundo” e conta hoje com o significativo número de mil membros.
Foi através dessa mesma comunidade que Roberto Bíscaro teve contato com outros albinos, o que o motivou a criar, cinco anos depois, em 2009, seu blog. Meio encontrado de desmistificar preconceitos, o site não foca apenas na questão das peculiaridades da vida da população albina, mas tem conteúdo variado, uma forma de mostrar que a vida dos albinos, tomando os cuidados que a condição exige, pode ser perfeitamente normal.
A comunidade permitia que acontecessem fóruns de discussão. Andreza relembra que, com o lançamento do filme O Código da Vinci, em que o personagem albino era o vilão, veio à tona o questionamento sobre a representação que era dada à população no cinema. “Aí começou a ter aquela discussão: por que o albino é o vilão, é o revoltado, ou como no filme ‘Eu, eu mesmo e Irene’, é o bobão?”.
Andreza, que já participou de diversos ensaios fotográficos artísticos e de moda, sabe a importância da visibilidade pra comunidade albina, além da questão da autoestima. É importante que haja a presença de albinos nos meios de comunicação para que as pessoas tenham conhecimento da condição. Da mesma forma que Roberto faz no blog, é através da informação que os preconceitos são desconstruídos e o albino naturalizado no imaginário popular.
Para isso, Andreza usa seus trabalhos como um estímulo: ela conta que cita e compartilha os trabalhos com o grupo e propõe a ressignificação da beleza albina. “Não é porque não está no padrão físico de cor que a gente não tenha uma beleza”, diz.
andreza 2
Barreiras sociais 
Tanto Andreza quando Roberto sofreram, principalmente na infância e adolescência, com o preconceito. A falta de conhecimento sobre a condição fez com que tivessem que lidar com apelidos dos colegas e o despreparo de professores.
Em diversos vídeos do canal  de seu blog no Youtube, Roberto narra a sua trajetória na infância e adolescência como o centro das atenções e o foco do bullying em uma pequena cidade na qual era o único albino. De maneira divertida, conta que era apelidado com uma infinidade de alcunhas, algumas sem qualquer sentido: “Embora eu não seja verde, ouvia [me chamarem de] marciano”. As ofensas eram ditas diretamente a ele, por vezes gritadas na rua.
Andreza conta que durante alguns anos, no ensino fundamental, tinha a sua cadeira colocada em cima do tablado – forma que a professora encontrou para tentar transpor a dificuldade visual da menina, mas que apenas reforçava a exclusão com o deslocamento de Andreza em relação ao restante da classe. Além disso, sofria com professores que atribuíam nota ao caderno: como tinha dificuldade em enxergar o quadro, ela costumava tirar xerox do caderno de amigos para estudar. Era, então, obrigada a ter uma outra tarefa todos os dias, a de transcrever todas as matérias. A falta de preparo era também evidente nas aulas de educação física ao ar livre, que limitavam a participação dos alunos albinos, mais sensíveis ao sol.
Implicações políticas da invisibilidade
Sabe-se que a ocorrência do albinismo é mais comum em populações negras. Estima-se que em comunidades europeias e norte-americanas a proporção seja 1 albino em cada 17 mil pessoas, enquanto em certas comunidades africanas esse número é bastante maior, 1 em cada 1500¹.
Diante disso, acredita-se que haja, no Brasil, uma distribuição desigual da população albina: em função da descendência africana presente mais fortemente na região nordeste e em estados como Rio de Janeiro, é esperado número maior de albinos nesses locais. No entanto, não há dados oficiais; o censo do IBGE não apresenta a opção de se declarar albino, o que deixa essa população reduzida às estimativas.
Além de refletir na própria representatividade, não saber quantos são afeta outros aspectos fundamentais na luta por direitos.“Isso [não ser contado no censo] nos coloca numa desconfortável e contraproducente posição de invisibilidade, porque fica mais complicado planejar políticas públicas de saúde realmente eficazes e eficientes sem saber quantos somos e onde estamos. Teoricamente estamos em todo o território, mas deve haver regiões onde a concentração seja maior”, explica Roberto.
Andreza e seus irmãos já perceberam o reflexo da ausência de números oficiais na prática: “Há uns anos atrás meu irmão chegou a escrever para o Ministério da Saúde falando das necessidades das pessoas com albinismo. Se teria algum meio de o protetor solar ser mais facilmente adquirido, porque é visto como cosmético pela Anvisa, por isso justificam que ele não pode ser distribuído de forma gratuita”. No entanto, a resposta do Ministério afirmava que não havia como saber a relevância da distribuição, já que não há números oficiais sobre a população.
Pró-Albino Santa Casa
Existem algumas iniciativas, à exemplo do que acontece em Salvador, que dão assistência à comunidade, como o Programa Pró-Albino,  da Santa Casa de São Paulo.
Idealizado pelo dermatologista Marcus Maia e o oftalmologista Roberto Yuti Sano, o Programa Pró-Albino foi criado em 2012. Andreza participa do programa desde o ano de sua criação. “Uma vez ele [o Marcus] me encontrou na rua e falou desse programa. Fui conhecer e desde 2012 estou nele . Tem mais de cem albinos cadastrados aqui de São Paulo”.
Ela conta ainda que  o programa é voltado para a prevenção. “Eles começaram a receber na Santa Casa muitas pessoas albinas, mas com câncer avançado […] já com casos de doenças espalhadas pelo corpo. O médico resolveu fazer um programa de prevenção, de acompanhamento”. A cada três meses é feito o acompanhamento dermatológico e, quando necessário, o atendimento oftalmológico.
Apesar de iniciativas como essas, o quadro ainda está muito distante do ideal. São assistências limitadas geograficamente, restritas. Em artigo², Roberto explicita: “deduz-se a existência de um contingente albino no país, que, além dos problemas inerentes à condição genética, não dispõe das condições mínimas para a aquisição dos produtos que nos são indispensáveis – bloqueador solar e óculos, por exemplo”. Essa população está espalhada em todo o Brasil; por isso, é necessário que o acesso a esses produtos seja garantido pelo governo, a nível nacional.