sexta-feira, 4 de setembro de 2015

PAPIRO VIRTUAL 96


Roberto Rillo Bíscaro

Li o terceiro romance da série policial protagonizada pela enfermeira Nina Borg. Coincidentemente, meu 3º é o número 3 duma sequência que nem fiz questão de seguir. Lene Kaaberbøl e Agnete Friis lançaram Nattergalens Død, em 2011, na Dinamarca, mas como não leio a língua, optei pela tradução pro inglês de Elizabeth Dyssegaard, publicada em 2013 com o título Death of a Nightingale (DOAN).  The Invisible Murder e The Boy in the Suitcase (clique nos links pra ler as resenhas) ganharam traduções em português, respectivamente Morte Invisível e Menino da Mala. Semana passada, meu endocrinologista contou do amor de sua esposa pelo norueguês Jo Nesbø, enfim, Nordic Noir segue tendência forte.
Em DOAN, as autoras apontam os holofotes pra Natasha e Rina, refugiadas ucranianas no campo da Cruz Vermelha, onde Borg é enfermeira e que haviam aparecido secundariamente em não lembro qual livro da série. Natasha estava presa acusada de tentar matar seu abusivo ex-marido dinamarquês. No dia da audiência com o juiz, Natasha foge dos guardas pra ir atrás da filhinha Rina. Nesse interim, o maridão agressor é encontrado morto e as suspeitas recaem sobre a jovem imigrante ilegal. Mas, não é apenas a sorridente polícia danesa (nos termos irônicos do narrador) que fareja Natasha e Rina. Há policiais ucranianos e um par de malvados do submundo também atrás dela, que fora casada com um jornalista escritor de artigos desagradáveis a certas pessoas. Intercaladas a esse tronco aparentemente central, correm as narrativas duma família na Ucrânia dos anos 30, dominada pelo jugo stalinista e dizimada pela fome e das cenas felizes ou não do casamento de Natasha com o Sapo Encantado Pavel. Claro que no final entenderemos como a história das irmãs Olga e Oxana cruzará a reta da pobre e sofredora Natasha.
As partes dedicadas ao período stalinista são infinitamente mais fascinantes do que a história policial mal contada de DOAN. Este é o livro menos interessante da série. Além de o desfecho ser anticlimático, a trama tem mais marmeladas do que nossa suspensão de descrédito consegue relevar. Natasha precisava dum carro e encontra numa casa onde houvera uma festa um jovem saindo bêbado com as chaves na mão. Há pessoas na porta, mas o narrador diz que o moço espera que elas entrem pra entrar no carro. Nem lembro a pífia desculpa pra isso, mas foi algo que me fez rir. Sem contar os repetidos dribles que a polícia dinamarquesa e um sistema de câmeras leva de Natasha e até duma garotinha asmática de 8 anos! E será que basta ligar pro 0800 duma megaoperadora de cartões de crédito que a mocinha vai falar pro chefona que alguém não identificado tem uma mensagem vital pra dona???
Se as autoras tivessem optado por escrever um drama social com final surpreendente sobre a sub-trama na Ucrânia dos anos 1930, provavelmente teria resultado numa história muito mais interessante. Crítica social faz parte do repertório delas, que não poupam de ironia a rica e liberal Dinamarca, mas o contraponto com locais tão qualitativamente mais deteriorados acaba reforçando a visão da península jutlândica como porto mais seguro, a despeito de seus defeitos, afinal, é lá que as personagens encontram pelo menos a possibilidade de viverem melhor.
DOAN sendo meu terceiro livro das escritoras, percebi que sua ambientação climática parece férias de professor: ou a Dinamarca está fervendo no verão ou congelando no inverno, caso desta narrativa. Não existe meia estação, como em nossas oportunidades de viagem, apenas em janeiro/julho. Lógico que isso Romanticamente reforça o drama.


Não que DOAN seja destituído de interesse em seguir lendo; apenas este não reside no foco supostamente central, que seria o policial. Com isso em mente, dá pra curti-lo legal. Mas, meu favorito continua The Invisible Murder

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