terça-feira, 8 de setembro de 2015

DE VOLTA PRA CASA

Primeira Jovem Albina Com Prótese Volta Para Casa
VERENA DOBNIK
(Tradução: Roberto Rillo Bíscaro)
1st of Tanzanian albino kids with missing limbs goes home photo

Kabula Nkarango Masanja retornou para a Tanzânia com uma nova prótese de braço, substituindo o membro decepado com um machado por adeptos da feitiçaria africana.
Ela é uma das crianças tanzanianas com albinismo, condição que deixa as pessoas com pouco ou nenhum pigmento na pele, cabelo e olhos. As partes cortadas de seus corpos são usadas em poções que os curandeiros creem trazer riqueza e boa sorte. A jovem de fala mansa, de 17 anos, agora é uma das afortunadas.
Médicos de um hospital infantil na Filadélfia recentemente criaram novos membros artificias para Kabula e 4 outros jovens. A nova-iorquina Elissa Montanti forneceu acomodações a 2 horas de viagem, em Staten Island, e providenciou todas as necessidades médicas e de transporte.
Kabula embarcou para Dar es Salaam, capital da Tanzânia, na terça. Ela estava nos EUA desde junho com 4 outas crianças, com idades entre 5 e 15 anos, que também foram beneficiadas com próteses. 
“Fique com Deus até nos vermos novamente”, escreveu a menina em um bilhete para Montanti e a instituição de caridade por ela fundada, o Fundo Global de Alívio Médico. Há anos, Montanti traz para os EUA crianças com membros amputados, de diversas zonas de conflito, como Bósnia, Haiti, Iraque, Afeganistão e Síria. “Mas, nunca me comovi tanto como com essas crianças”, desabafa a ex-técnica em radiologia, de 62 anos de idade. 
1st of Tanzanian albino kids with missing limbs goes home photo
Enquanto as mais ou menos 200 crianças ajudadas por Montanti eram vítimas de minas terrestres, terremotos, tsunamis e outros desastres, “esses casos são intencionais”, ela disse sobre as vítimas de feitiçaria.
Carentes de pigmentação natural, albinos parecem quase brancos – fantasmas de seres humanos que se foram, segundo os curandeiros, que encomendam partes de seus corpos. Mais de 200 curandeiros foram presos até agora pelos assassinatos de albinos na Tanzânia. O governo ilegalizou os curandeiros ano passado. 
Mesmo assim, os ataques continuam; pelo menos 8 foram registrados na Tanzânia no ano passado. Há, porém, um dado ainda mais cruel.
Alguns pais são colaboradores, porque creem que seus filhos são amaldiçoados, revela Ester Rwela, assistente social que acompanha as crianças e atua como tradutora de Swahili, língua utilizada pelos menores.
O pai de Baraka Cosmas Lusambo, de 5 anos, foi preso depois que parte do braço direito de seu filho foi decepada em março, em meio a gritos lancinantes.
Negociantes de diamantes, políticos e empresários tanzanianos têm pago quantias que chegam a 75 mil dólares por essas poções. Rwela conta que eleições são períodos lucrativos para curandeiros. “Os albinos vivem com medo”, conta.
As crianças, no entanto, não se encontram consumidas pelas monstruosidades.
“Sabe, elas ainda são capazes de amar”, emociona-se Montanti, que constantemente lhes segura as mãos e as abraça.
Elas cantam na van que as transporta à Filadélfia para terem as próteses ajustadas e aprenderem a usá-las.
1st of Tanzanian albino kids with missing limbs goes home photo
Emmanuel Festo Rutema, um garoto de 13 anos que perdeu o braço esquerdo e diversos dedos da mão direita, também vai ao dentista para substituir os dentes da frente, os quais também perdeu no ataque. Os agressores tentaram também cortar sua língua, mas só conseguiram danificá-la.
Em uma tarde de verão, no abrigo em Staten Island, as salas estão vivas com risadas. "Baraka Obama!" Esse é o apelido que os companheiros deram para o garotinho. Ele sorri timidamente e revela: “Não sei quem é Obama.”
No sofá, Emmanuel joga baralho com Mwigulu Matonange Magesa, 12, que usa uma extensão com gancho em seu braço esquerdo, pra pegar as cartas. É mais fácil do que com a prótese, que ele ainda não domina totalmente.
Kabula está estudando para os exames escolares que terá que enfrentar depois que voltar a Dar es Salaam, onde ela e os outros 4 vivem em um abrigo distante de suas aldeias miseráveis.
1st of Tanzanian albino kids with missing limbs goes home photo
“Deus diz para perdoarmos nossos inimigos, mas, como ser humano, não consigo perdoá-los, porque eles podem fazer isso de novo”, conta a adolescete, que teve o braço direito cortado na altura da axila. Ela quer se tornar uma advogada especializada em direitos humanos.
No aeroporto, Kabula enxugava as lágrimas, desanimada com a perspectiva de deixar seus amigos e a segurança de Nova York. “Eu disse a ela, que aquilo não era o fim, apenas um brilhante recomeço”, conta Montanti.
As outras crianças partirão no final de setembro, mas retornarão ano que vem para experimentar novas próteses. 

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