sexta-feira, 7 de novembro de 2014

PAPIRO VIRTUAL 83

The Boy in the Suitcase (Nina Borg, #1)


Roberto Rillo Bíscaro

Tantos escritores da rica Escandinávia dedicarem-se a histórias de horrenda brutalidade deve-se a decadência do Estado do Bem-Estar Social na era da globalização? Ou esse estado tem sido tão bem sucedido a ponto de proporcionar tempo, oportunidades e dinheiro prum grande número de escritores e leitores dedicarem-se a imaginar uma Dinamarca/Suécia/Noruega, que obviamente não é a mesma do idealizado sonho dos anos 50 a 70, mas também não corresponde ao inferno de misoginia, drogas e violência mostrados nas obras de Nordic Noir?

Um pouco de cada e mais alguma coisa devem explicar o sucesso do subgênero e também as coincidências temático-formais entre os produtos literários, fílmicos e televisivos do Scandi Drama. Li o primeiro romance da série de aventuras de Nina Borg – aqui minha resenha pra The Invisible Murder – e a crítica ao estado dinamarquês, especialmente no que tange ao (não) acolhimento de imigrantes e ao tratamento a estrangeiros está no cerne das reclamações do narrador criado por Lene Kaaberbøl e Agnete Friis. Drengen i kufferten (2008) foi traduzido pro inglês em 2011 com o título The Boy in the Suitcase e foi essa a versão que li.

O garoto na mala é Mikas, lituano transportado pra Dinamarca dopado dentro duma valise deixada na estação central de trens em Copenhague. Ao invés do comprador pegar o petiz, quem o encontra é a enfermeira Nina Borg, que ao invés de entregá-lo às autoridades perambula pela cidade tentando salvá-lo.

Nina exemplifica bem o paradoxo questionado no parágrafo de abertura. Ela suspeita do Estado e das instituições cuidadoras do bem-estar e dos direitos de estrangeiros. Seu ativismo humanitário – sintomaticamente patologizado pelo narrador-, porém, só se torna possível pelas condições materiais fornecidas por esse próprio Estado, afinal, não é qualquer um que pode largar a família e ir pra Darfur fazer caridade.

Típico nas narrativas Nordic Noir, a ação se desencadeia aos pulos entre distintos núcleos, que ao final se interligam e entrechocam, provocando o clímax. Como em The Invisible Murder, Nina Borg não é protagonista no sentido de resolver a trama; ela entra nela por acaso e é levada à cena do confronto final, não chega lá por ação voluntária.

O narrador é bem menos simpático com Borg nessa sua estreia no mundo literário. Esquelética e compulsiva são apenas 2 adjetivos com os quais é descrita.    Absorvente, The Boy in the Suitcase é bom, mas The Invisible Murder é mais eletrizante e surpreendente, sem contar que suas descrições da Dinamarca são mais agradáveis do que as de The Boy..., que fazem o país parecer uma fornalha fedorenta no verão.  

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