quarta-feira, 12 de novembro de 2014

CONTANDO A VIDA 87

Nosso historiador-cronista nos faz pensar sobre ética e moralidade na propaganda. Dá para crer que Suzana Vieira realmente usa Corega? E quais as implicações dessa mentira? 


‘ME’ ENGANA QUE EU GOSTO: propaganda e moral.

José Carlos Sebe Bom Meihy

O irônico erro gramatical do título é oportuno. Nem vou discutir questões vinculadas ao fermentado debate sobre a norma culta para justificar o dito corrente. ‘Me’ engana que eu gosto aqui é evocado para motivar debates sobre o alcance das propagandas em voga em diferentes meios de comunicação que buscam vender produtos a qualquer preço. Sinceramente, considerando o absurdo de algumas dessas práticas, poderia até falar de ética ou de moral, de manipulação ou engodo, mas vou ser mais discreto. Consideremos, como ponto de partida, o mau gosto dos emissores das mensagens que nos tratam como crédulos, ignorantes, agentes passivos, porque potencialmente consumidores dos produtos anunciados, sejam eles quais forem, independentemente da qualidade ou preço.
Já disse que não quero parecer radical, mas há determinadas propagandas (meu Deus eu ainda uso a palavra propaganda! Bem, melhor propaganda do que reclame, não é?). Voltemos ao tema central os advertisings (viu como posso ser moderninho?) tem exagerado e não pouco. Vou provar isso a fim de promover meditações sobre a alienação do público em geral que se vê obrigado a imitar os artistas ou personalidades que mostram as mercadorias. Vejamos: quem acredita que a Suzana Vieira use dentadura e que diariamente se vale do produto Corega para ostentar o belo sorriso que tem? E quem aposta que a Gisele Bundschen sai desfilando por aí com as roupas adquiridas nas Casas Marisas? Que dizer do Pelé tomando Vitasai ou anunciando os produtos do Supermercado Extra e o Ronaldo Fenômeno tomando antigripais? Duvido que alguém se convença que a Xuxa e a Mariana Ximenes usam os produtos da Monange. Será que a Fátima Bernardes vai mesmo ao supermercado comprar os frangos da Sadia? Será que ela se encontra lá com a Ana Maria Braga? Pensa que paramos aí? Ledo engano. O pior está por vir. Roberto Carlos, o rei Roberto, vegetariano famoso, agora aparece amistosamente sentado à mesa com convidados e... saboreando um apetitoso bife da Friboi. Logo ele que alardeou por anos que é vegetariano convicto? Como, eu também me pergunto? E não é só ele, o Tony Ramos pretende ser também garoto-propaganda da mesma marca que, aliás, gasta fortunas convencendo das virtudes da carne. Nada de mais dirão alguns piedosos leitores, pois afinal eles são profissionais e estão trabalhando. Também concordo com o suposto do trabalho como meio de ganhar a vida, mas não sei se é exatamente o caso deles, da pobre Xuxa ou do miserável Roberto Carlos. Poderíamos falar de embuste? Acho que não, mas cabe imaginar balizas que podem ser impostas, pelo menos, em favor do ridículo.
Meditemos sobre os mecanismos existentes na lógica capitalista que induz ao consumo. Pode-se, ou não, pensar em limites na elaboração de propagandas? Por incrível que pareça, depois de tudo que disse, vou defender a completa liberação dessas mensagens. Sou totalmente contra qualquer tipo de censura. Não admito pensar no cerceamento de anúncio, nem mesmo de merchandising político ou religioso. Pensei muito antes de escrever tal assertiva tão dramaticamente defendida. Prefiro pensar na educação do consumidor e no desenvolvimento da crítica social. Devemos sim comentar, discutir tais indicações, mas não erradica-las, pois não saberíamos quem tem o direito de exercê-lo. É por isto que prefiro apresentar o nonsense como recurso pedagógico que deve fermentar o diálogo entre consumidores. Temos que estar alertas e reagir. Também deve nos ficar claro que podemos simplesmente desligar os aparelhos e até mesmo assumir o suposto da antipropaganda. De que maneira? Simples, faça como eu que julgo estar alertando o leitor. Ups! Tomara que o pessoal que me lê não tenha aprendido a lição e se não faz propaganda a favor da leitura desta coluna, pelo menos fique calado.

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