quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O SOL SEMPRE BRILHA NA NORUEGA

Roberto Rillo Bíscaro

Em 1985, a escandinava Noruega passou a constar na cartografia da música pop, graças ao trio A-Ha. Morten Harket, Pal Waaktaar e Magne Foruhomen venderam mais de 10 milhões de cópias de seu álbum de estréia, Hunting High and Low. 5, de suas 10 faixas escalaram as paradas. O inovador vídeo de Take On Me, com sua mistura de animação e cenas reais, garantiu alta rotatividade na MTV. A boa aparência dos meninos completou a receita do sucesso global.
O álbum é uma pérola do eletropop comercial. O disco repousa no equilíbrio entre o drama orquestral, quase operístico de tão exagerado, e na pulsão dos teclados herdados da fase inicial da new wave, orientados pras pistas de dança. Nos momentos em que ambos os elementos se coadunam, Hunting High and Low atinge a estratosfera pop, como os vocais de Harket.

Take On Me, faixa de abertura, é clássico do synth-pop dançante da década de 80. Começa com uma percussão alegrinha, sintetizadores discretos, até que, aos 17 segundos, entra um dos riffs de teclado mais conhecidos e grudentos de uma geração. Só quem vivia embaixo duma pedra na época não reconhece o toquinho. Outro momento alto, literalmente, é quando Morten atinge o incrível falseto. Truque de estúdio ou não, que importa?
Outras pedradas dançantes são Train of Thought e Love is Reason. Essa última, evoca os primeiros álbuns do Depeche Mode, mas também indica o caminho que parte do pop inglês oitentista estava tomando com o furacão Stock, Aitken and Waterman, que, naquele ano conquistava seu primeiro ouro na parada britânica com You Spin me Round (Like a Record), do Dead Or Alive.
Em termos de canção dançante, porém, tirando Take on Me, nenhuma outra faixa obscurece os 5:00 minutos de The Sun Always Shines on TV. O primeiro minuto é melancólico, com teclados imitando piano e orquestração suave, até o primeiro falseto de Morten. Depois, ergue-se uma intransponível muralha de guitarras, sintetizadores, bateria eletrônica e vocais. Todo o drama dançante que grupos posteriores, como os maravilhosos Pet Shop Boys engendrariam, está codificado ali. Basta conferir a escarrada de sintetizadores que acontece aproximadamente aos 4:05 minutos, antes do berro final do vocalista. O epílogo, retorno necessário à quietude, com seus teclados em tons mais graves e sisudos, apenas reforça a exuberância e frenesi de The Sun Always Shines on TV.

No setor baladas, o álbum tem a impressionante faixa-título. Violões e percussão iniciam o tom marítimo, de navegação e procura, evocado pela letra. Tem até som de gaivota... Pouco depois do gorjeio dos pássaros marinhos que a canção atinge seu ápice. Tudo se agiganta: percussão se torna mais pesada, a orquestração se adensa, teclados inundam a melodia, feito vagas, e o vocal de Morten, majestoso, (sing)ra o mar tempestuoso e o dominando por completo. Até que chega o fim, calmo, como onda quebrando na praia.
Em meio à vibração dançante e ao lirismo sintetizados de Hunting High and Low há espaço pra suntuosidade mid-tempo de Living a Boy’s Adventure Tale, oscilando entre a delicadeza dos vocais e dos teclados, que por vezes assumem tons clássicos e a força martelada da bateria eletrônica, característica da sonoridade da década. A história de aventura do garoto da letra é composta de momentos sutis e da fortaleza urgente da juventude.

Em comemoração às bodas de prata da estreia do A-Ha, a Rhino Records relançou Hunting High and Low este ano, em edição dupla, remasterizada e estendida. O CD 1 traz o álbum original, que, agora, na era digital, pode ser melhor desfrutado em todo seu esplendor eletropop.
O CD 2 está repleto de novidades. São diversas faixas menos conhecidas do grande público, uma vez que foram lados B dos singles originais ou de outras fontes. Os fãs radicais afirmam que o grupo é muito mais do que apenas Take On Me. E é, mas, o material apresentado no segundo CD, embora agradável por vezes, está longe do brilhantismo de Hunting High and Low. Destaque pra levada dance de Never Never, com suas citações a The Sun Always... Quase todo o resto não é pra fãs casuais.

Há ainda versões estendidas dos hits. Não se trata daqueles remixes onde um DJ pega uma linha da canção e a usa como desculpa pra entupir a faixa de batucadas de 20 minutos. São apenas versões mais longas e rearranjadas de Take on Me ou Living a Boy’s.., que faziam nossa alegria quando tocadas no rádio.
Há também, demos de diversas canções. É escutando essas versões preliminares que se percebe a importância de um bom estúdio de gravação e dos produtores Tony Mansfield, John Ratcliff e Alan Tarney pro sucesso do álbum. A demo de Take On Me é reveladora: o potencial está lá, mas o timbre dos teclados é mambembe, os vocais são imaturos e não-profissionais e a fórmula de composição dum sucesso pop ainda não estava ao alcance dos garotos. Isso não depõe contra eles. Ou alguém acha que os Beatles seriam o que foram, sem o produtor George Martin? Pop é indústria e há profissionais especializados pra burilar talentos.
Ainda bem que o A-Ha conseguiu bons produtores. Quem lucrou foram os fãs de música pop, que poderão desfrutar pra sempre do êxito de Hunting High and Low.

2 comentários:

  1. Olá, Roberto! Adorei o post!
    Bem diferente do que você coloca aqui!
    Pelo que eu sei, a música Take On Me foi lançada em 1983 tendo sucesso apenas em 1985 por causa do famoso clipe animado... Aquela moça do clipe era a namorada do Morten... Mas acho que depois ele largou ou ela largou ele, vai entender!
    Valeu pelo post!
    bjs

    ResponderExcluir
  2. A-HA tocando num desses programas "flashback" na rádio e pensando :certas coisas deveriam ser deixadas no passado.

    ResponderExcluir