domingo, 24 de outubro de 2010

SÍNDROME DE ANGELMAN III

Encerrando nossa pequena série informativa sobre a Síndrome de Angelman, nada melhor que o relato de uma mãe, contando suas experiências. As histórias pessoais auxiliam a gente a colocar rostos e sentimentos nos dados científicos, né?

A história de Ronan, por Andreia Curi

Bom, esta é uma estória como muitas outras, começa com a imensa alegria da notícia da chegada de um filho e com o coração transbordando de amor, passa por muitas tristezas, medos e frustrações, mas ainda com o coração transbordando de amor. Com o tempo, o cuidar passa a ser muito mais amadurecido, o olhar mais emocionado, porém a vida cheia de novos medos e desafios, mas com certeza, ainda com o coração transbordando de amor.
Quando tinha 30 anos de idade, morava em Joinville, Santa Catarina, com meu marido e minha primeira filha de 1 ano e dois meses. Morávamos há uns 4 anos nesta cidade, onde não tínhamos nenhum parente por perto, nós dois trabalhavamos fora, quando soube que estava grávida novamente, apesar de não ter sido uma gravidez planejada, queria ter mais filhos (sempre pensei em ter 3 filhos) e realmente achava melhor te-lôs em idades próximas. Então, apesar de apreensivos, pois minha princesa ainda era um bebê, ficamos muito felizes com a notícia. Meu anjo Ronan nasceu em 18 de fevereiro de 2000 na cidade de Joinville, de parto normal, de uma gravidez normal, com apgar 8 no primeiro minuto e 9 no quinto minuto. Nasceu com 3,695 Kg e 50 cm, totalmente perfeito. Era um bebe lindo, loirinho de olhos azuis. Morávamos em uma cidade onde as pessoas normalmente são loiras de olhos claros, mas todos vinham ao meu quarto para ver quem era aquele loiro cabeludo tão lindo que parecia um anjo. Chorou ao nascer, mamou e saiu da maternidade no dia seguinte. Porém os problemas começaram, pois o Ronan foi um recém-nascido que chorava muito, dormia quase nada, eram umas 3 horas de sono por noite. Tinha um refluxo gastresofágico severo, esofagite e com tudo isso não tinha uma amamentação muito prazerosa.
Com 5,6 meses começamos a constatar um atraso psicomotor, pois ele não sentava, era muito hipotônico e não fazia as “gracinhas” de um bebê nesta fase da vida. Como nós já tínhamos a Maiara de filha, o pediatra dizia que não era nada, era apenas nós que estávamos muito ansiosos e comparando nossos filhos e que tínhamos que respeitar o tempo do Ronan. Decidimos então retornar para o Rio de Janeiro (nossa cidade natal), pois, a falta de respostas aos nossos problemas aumentavam as nossas dificuldades. Quando o Ronan tinha 11 meses, ainda não sentava sozinho e seu atraso psicomotor era mais evidente, fomos a uma pediatra que na hora nos encaminhou para uma avaliação neurológica. Porém, fomos a alguns neurologistas que o avaliavam e diziam que ele não tinha nada, precisava apenas de um estímulo profissional maior. Até que quando ele tinha um pouco mais de 1 ano de idade, uma neurologista pediu uma Ressonância Magnética de crânio, onde foi constatado um atraso na mielinização. Com isso passamos por mais um momento difícil, pois esta médica, disse que o Ronan poderia ter esclerose múltipla, foram dias de medo de que este fosse o verdadeiro diagnóstico, pois a esclerose múltipla é uma doença degenerativa, porém, graças a Deus não era. O Ronan não tinha perda de mielina e sim atraso na mielinização, este diagnóstico nunca poderia ter sido suspeitado com uma criança naquela idade com atraso psicomotor desde o início de sua vida e em apenas uma única ressonância, pois é necessário no mínimo duas ressonâncias em um período de uns 6 meses, para constatar a perda de mielina. Porém, continuávamos sem diagnóstico fechado.
Com 1 ano e 3 meses ele teve febre alta seguida de convulsões. Foi internado durante uma semana e controladas as crises. O eletro na época não teve nenhuma alteração. Com 1 ano e 4 meses fez alguns exames para retirar suspeitas de doenças de metabolismo que também deram resultados negativos. Com 1 ano e 9 meses fez novas crises convulsivas, primeiramente generalizadas e depois, mesmo com remédios, com característica de ausência e de difícil controle. Foi internado durante 8 dias para conseguir controlá-las. Foi feito um eletroencefalograma sem maiores alterações. Uma semana após a saída do hospital, começaram novas crises sendo aumentadas as doses do medicamento, sendo controladas somente após 6 dias. Foi feito um novo eletro que constatou algumas alterações, que não eram muito significativas. Ainda sem diagnóstico fechado, uma neurologista suspeitou que ele poderia ter síndrome de Williams e nos encaminhou para um geneticista. Fomos a um geneticista renomado que examinou o meu anjo de cima à baixo com uma equipe de estudantes. Devido ao fato do meu filho ser muito amoroso e adorar contato físico, ele achou uma graça aquela “pegação toda” e a sensação pior ficou para nós pais, passarmos por aquela total falta de bom senso e respeito, pois em nenhum momento algum dos alunos perguntou o nome daquele bebê risonho. Viravam ele de um lado para o outro, mexendo em suas orelhas, mãos, pés, como se fosse um boneco. E o pior é que mais uma vez tivemos a resposta que ele não teria nada, pelo menos genético, mesmo sem este médico ter nos pedido nenhum exame.
Como não estávamos satisfeitos com a falta de respostas, continuamos atrás de mais médicos e avaliações, até encontrarmos um grande geneticista que conseguiu avaliar nosso anjinho em apenas 5 minutos, pois os sintomas e as características da síndrome do Ronan são muito peculiares. Ele nos orientou a fazer o cariótipo, e de antemão nos alertou que provavelmente daria resultado normal e que teríamos que fazer um exame específico do cromossoma 15. E foi o que fizemos, o FISH. Nesta época o Ronan tinha quase 3 anos de idade e estávamos exaustos com tantas frustrações. Apesar do diagnóstico ter sido uma bomba inicial em nossas vidas, foi um alívio o fim de nossa busca. O Ronan tem síndrome de angelman e está no grupo de deleção do cromossoma 15 materno.
Alguns médicos costumam dizer que não importa o nome do problema, porém só quem passa por esta situação sabe o quanto é importante dar nome ao desconhecido, até para podermos ter um parâmetro das limitações que terão que ser enfrentadas. Um grande obstáculo no diagnóstico da síndrome de angelman é a falta de conhecimento, inclusive da área médica, pois é necessário exame específico no cromossoma 15, e isto só é possível se o médico suspeitar da síndrome, é claro. Há exames laboratoriais específicos tais como a análise do padrão de metilação, PCR, que pode ser complementado pela técnica de hibridação in situ (FISH) na região 15 q11-q14, bem como a pesquisa molecular específica de mutações no gene UBE3A (sequenciamento). Infelizmente há muitas crianças que não possuem diagnóstico fechado ou possuem diagnóstico errado, como paralisia cerebral com grave deficiência intelectual, por exemplo. Como na verdade já fazíamos todos as terapias com ele, mantemos o seu tratamento e fomos juntos aprendendo a lidar com suas dificuldades e com os seus encantos, pois, por onde ele passa nunca é esquecido. O carinho e a felicidade são sua marca registrada.
Atualmente temos uma filha de 12 anos de idade, o nosso anjo de 10 anos e um pimentinha que veio muito amado e que está com 4 anos. A relação deles é um presente de Deus para nós, pois eles se amam muito e tratam o Ronan com muito carinho, porém sem super protegê-lo. Com certeza a relação com uma criança especial nos dá uma nova visão de mundo e sabemos que esta relação, principalmente para a formação de crianças é muito importante para o crescimento como Ser Humano. Estamos muito satisfeitos com o progresso do nosso anjinho e sabemos que ainda temos uma grande jornada pela frente e será de alegrias e tristezas, assim como com os nossos outros 2 filhos que têm um desenvolvimento dentro do esperado. Graças a Deus sempre conseguimos passar pelas dificuldades com muito amor no coração e principalmente com o retorno deste amor vindo do Ronan, que nos traz muitos momentos maravilhosos além de um grande aprendizado.
Diante de todas as dificuldades que passamos para fechar o diagnóstico, encontrar escola adequada, bons tratamentos, bons médicos, etc. fundamos uma Ong no Rio de Janeiro, a Ong Asa Rio que, infelizmente ainda é um sonho muito solitário, porém sabemos que este sonho irá se tornar realidade um dia. Atualmente fazemos parte de uma associação com outras mães de crianças com angelman que têm estórias muito parecidas com a nossa que é a ACSA, Associação Comunidade Síndrome de Angelman. A ACSA – A ACSA foi criada em 17 de outubro de 2009, na cidade de São Paulo, e sua peculiaridade consiste no fato da associação ter “nascido” de um “embrião da internet” – pela vontade e determinação de mães que por não conseguirem informações sobre a síndrome de seus filhos, recorreram à internet – e em uma comunidade do Orkut chamada Síndrome de Angelman encontraram inúmeras outras mães com os mesmos problemas, dúvidas e experiências para compartilharem. Daí surge o nome Associação Comunidade Síndrome de Angelman, composta por mães espalhadas pelos diversos Estados do Brasil e do exterior. A maioria se conhece apenas por via eletrônica, mas os laços que nos unem estão longe de serem virtuais; pelo contrário, são muito reais.
(Encontrado em http://www.inclusive.org.br/?p=17770)

Nenhum comentário:

Postar um comentário