sexta-feira, 1 de outubro de 2010

PAPIRO VIRTUAL 6

O mineiro Ruy Castro é um dos jornalistas e biógrafos mais importantes do país, tendo registrado as trajetórias de gente como Nelson Rodrigues, Carmem Miranda e Garrincha. Também escreveu sobre a Bossa Nova e o bairro carioca de Ipanema.
Autor de romances e crônicas, o polivalente Castro teve algumas de suas crônicas reunidas no livro Crônicas Para Ler na Escola, lançamento da editora Objetiva. Organizado por Silvia Cyntrão, o volume traz textos repletos do bom humor e sarcasmo, marcas registradas de Ruy.
Entre as crônicas antologizadas, encontra-se uma que sugere o cruzamento de rãs albinas com políticos. Por quê? Leia e descubra.

Como um tumor
Cientistas da Universidade de Hiroshima, no Japão, criaram uma rã transparente, cujas intimidades ficam expostas e podem ser perfeitamente observadas pelo lado de fora. Com isso, salvaram-se gerações inteiras de rãs, porque os cientistas não precisarão mais dissecá-las para saber como reagem às substâncias que eles vivem lhes injetando. Outra vantagem é a de que poderão acompanhar uma rã por todo o seu ciclo de vida - o ciclo de vida da rã, claro, não dos cientistas.
Para chegar à rã transparente, os japoneses, craques em engenharia genética, levaram anos cruzando exemplares de rãs albinas. E agora partiram para aperfeiçoá-la: vão fazer com que qualquer corpo estranho que apareça dentro da rã se acenda. Um tumor, por exemplo.
Já no Marrocos, também nesta semana, os cientistas da Universidade de Rabat conseguiram com que um pato nascesse no ovo de uma galinha. Se isso lhe parece meio mixo (afinal, no mesmo dia, em Recife, uma avó deu à luz seus próprios netos, lembra-se?), saiba que a proeza marroquina é considerada mais importante, pelo fato de os palmípedes e os galináceos constituírem famílias diferentes.
Por coincidência, é o que se está discutindo em Brasília nos últimos dias: um político gerado num ovo destinado a palmípedes pode se baldear no meio do mandato para o terreiro dos galináceos, por ver neste mais oportunidades para ciscar? Em princípio, não. Mas e se o eleitor só quiser saber do pinto ou do pato, e não do ovo de onde ele saiu?
Essas mudanças nunca são de graça. Assim, sugiro convocar os japoneses para cruzar nossos políticos com as rãs albinas e, com isso, criar políticos transparentes. Quando um deles recebesse um corpo estranho - uma propina, por exemplo -, esse corpo se acenderia. Como um tumor.

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