quinta-feira, 7 de abril de 2011

TELONA QUENTE 22

Triângulo Amoroso Bizarro
Esta semana assisti a um documentário cuja história me pareceu tão cinematográfica que hesitei em crer em sua autenticidade. Numa época em que tantas produções borram a fronteira entre ficção e realidade, julguei poder tratar-se de uma farsa, de uma hoax, como se costuma dizer em internetês. Parecia um daqueles mirabolantes enredos de filme de suspense. Embora soubesse que era um documentário, fui ao Google comprovar sua veracidade. Afinal, existem os mockumentaries, que, no frigir dos ovos, são farsas documentais. Talvez seja ingenuidade deste escriba, mas, mesmo tendo verificado o caráter real da história, ainda me custa crer no que vi.
Produzido em 2009, tallhotblond documenta um terrível e bizarro triângulo amoroso virtual ocorrido nos EUA e que resultou em assassinato. Thomas Montgomery, um infeliz senhor de meia-idade, provavelmente impotente, com problemas conjugais e vivendo uma vida bem distante da existência de aventuras que sonhara na juventude, conheceu uma jovem de 18 anos numa sala de bate-papo. A loira alta e gostosa (tallhotblond) e Thomas – cujo nick era marinesnipper, em alusão à fantasia criada por ele de que era um jovem fuzileiro naval de 18 anos – começaram um relacionamento virtual que envolveu cybersex e até mesmo o envio de peças íntimas da garota pelo correio. Para ambos, o romance online servia como paliativo viciante para suas frustrações. Até que um dia, Jessi descobriu que Thomas era um papai careca e acima do peso. Então, os portões do inferno se escancararam...
A suposta virgem passou a fazer um jogo de vingança para punir o desequilibrado Montgomery. Dizendo que Thomas era importante demais para ela, Jessi pede que não desfaçam o contato e sigam como amigos. Paralelamente, porém, começa a fazer ciúmes no antigo “namorado”. Outro freqüentador da sala de bate-papo era o jovem Brian Barrett, companheiro de trabalho do frustrado fuzileiro naval. Jessi e Brian passam a manter conversas íntimas e chegam a marcar um encontro. Tudo sob o olhar de Thomas, cada vez mais obcecado com os jogos de sedução, desprezo e reconciliação da garota. O ressentimento explode em violência quando em 2006, Thomas executa Brian com diversos disparos.

Como se isso não bastasse para caracterizar a loucura da situação, a surpresa final e também chocante apareceu quando a polícia descobriu a verdadeira identidade de Jessica, ao tentar preveni-la de que poderia estar em perigo. Que ela não fosse realmente uma virgem recém-graduada do ensino médio não causaria surpresa a qualquer pessoa acostumada ao universo fantasioso das salas de bate-papo. Mas, quando o espectador toma conhecimento de quem é Jessi, grandes chances há de que o queixo caia.
A diretora Barbara Schroeder optou por fazer do falecido Brian Barrett o narrador do documentário, o que permite que passe julgamentos morais e de valor, além daqueles prestados pelos entrevistados. Pontuando a narrativa, muitos excertos das mensagens trocadas entre os envolvidos, revelando muito desejo sexual reprimido, raiva, angústia, enfim, muito desequilíbrio.
tallhotblond trata de questões novas para a justiça como o uso da identidade de outrem na internet. Na verdade, trata da questão da identidade como um todo ao fazer pensar sobre o quanto uma personagem inventada pode terminar por adquirir tamanha verdade na cabeça das pessoas, que acabam por refugiar-se em um mundo onde o faz de conta – por ser mais interessante do que o cotidiano – receba o status de real e sobreponha-se sobre tudo o mais.

Mesmo que não cheguemos ao extremo patológico de Montgomery e de Jessi (que também é bem doentinha, acreditem!), inquieta pensar que parte do que julgamos experienciar ou ser pode ser mais projeção nossa do que realmente fato.   
Jessi não foi sequer indiciada pelo assassinato de Barrett porque não foi encontrada nenhuma indicação de que tenha instigado Montgomery a cometer o crime. Mas, fica a questão moral: não seria ela tão culpada quanto Thomas, uma vez que seus jogos emocionais detonaram uma bomba-relógio?
O documentário ganhou prêmio no Festival Internacional de Cinema de Seattle em 2009 e vale pela perturbadora teia de demência, mentira, manipulação, dignas de um filme de horror.

2 comentários:

  1. O filme é muito bom e fiz o mesmo, acabei de ver o filme e fui pra internet pesquisar sobre ele.

    ResponderExcluir
  2. Um excelente documentário que, para além do choque, faz pensar.
    Indico ainda outro excelente documentário chamado "Dear Zachary: A Letter to a Son About His Father", de 2008.

    ResponderExcluir