segunda-feira, 11 de abril de 2011

DIÁRIO DE UM ALBINO

Há alguns dias, Mariana Cavalli enviou-me email que continha uma carta escrita pelo Anderson dos Santos e Silva, um dos fundadores da APALBA, que faleceu dias atrás, devido ao câncer de pele. Escrita no dia 01/08/2009, a mensagem narra um pouco da trajetória do Anderson até então. Também traz nomes de pessoas que constituíram parte da rede de solidariedade com a qual Anderson contou durante seus últimos anos de vida. Pedi autorização à Mariana para publicar o material, uma vez que demonstra muito bem as esperanças, medos e ações de um grupo de pessoas lutando por uma causa e de um indivíduo lutando pela vida.



Olá para todos amigos e amigas, companheiros (as) do Movimento em Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiências,
Venho por meio deste e-mail em primeiro agradecer pela força e atenção com que todos tiveram em saber da atual situação que estou vivenciando
Quero dizer que, nesse momento de minha vida, tive uma ajuda muito importante, pois Deus colocou em meu caminho pessoas maravilhosas como vocês e, entre vocês, os Cavallis e a Andreza, pois desde o inicio de nossa amizade pelo Orkut, ela foi uma amiga sempre presente e que me deu muita força, com relação a minha situação e a oportunidade para poder estar em São Paulo.
Tudo começou, quando no início do meu tratamento de câncer em Salvador, descobri que era Albino quando tinha 20 anos, numa consulta com a Dra. Shirley.
Com o tempo e a falta de recursos na Bahia, Dra. Shirley sempre comentava que seria bom para mim se eu tivesse a oportunidade de ir ao Hospital das Clinicas de São Paulo, mas minhas condições não permitiam. Porém isso nunca saiu da cabeça da Dra.Shirley e sempre que ela podia, tentava pensar em alguma coisa para me ajudar a ir ao HC.

O tempo passou e nós fundamos a APALBA. Depois de alguns anos, por meio da Internet, através do Orkut na comunidade “Só para Albinos”, eu tive a oportunidade de conhecer muitas pessoas também albinas e entre elas: a Andreza Cavalli, Priscila, Jaqueline e muitos outros amigos queridos, que hoje fazem parte da minha vida e moram no meu coração.
Andreza e a Priscila tiveram a oportunidade de ir a Salvador, pois entre as trocas de informações que tivemos, estava para acontecer o III ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE VISÃO SUBNORMAL e elas foram e ficaram entre 8 e 10 dias e puderam conhecer a APALBA.
Elas comentaram sobre a possibilidade de eu ir a São Paulo para tentar tratamento para o quadro que eu vivia.
Uma das coisas que a Andreza sempre me falava, era que assim que eu tivesse uma oportunidade, que fosse, pois chegando lá poderia contar com ela.
Antes de elas irem embora, eu as levei no consultório do Dr. Edison Silveira, oftalmo, pois conseguiram uma consulta.
Fui com elas no aeroporto e para minha tristeza elas foram embora, mas daí para frente ficaram mais presentes em minha vida, pois tiveram uma idéia da realidade vivida pelas pessoas com Albinismo na Bahia e em Salvador.
De lá para cá, sempre tentei uma oportunidade, mas nunca dava certo, foi então que depois de participar da II CONFERÊNCIA NACIONAL DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA  que eu tive a oportunidade de rever uma grande amiga que fiz em 2007 na I CONFERÊNCIA NACIONAL DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS: a Sra. Maria Olívia que, para mim, é um verdadeiro anjo sem asas na terra sempre tão humilde e atenciosa com todos. Ela me informou que entre os eventos que estariam para acontecer no ano de 2009 estava para acontecer a Reatech em São Paulo.
Como eu estava trabalhando na Coordenadoria de apoio as Pessoas com Deficiências em Salvador, a Reatech era uma oportunidade que tinha para poder ir a São Paulo. Fui acompanhando as informações e consegui me inscrever.
Um pouco antes do fim de 2008, eu tinha dado entrada no passe livre interestadual e dias antes da Reatech, eu o recebi. Então já tinha as passagens de ida e volta, com a ajuda da Andreza, consegui um lugar para ficar.
Só faltava saber se seria liberado no trabalho, pois logo no inicio do ano houve uma mudança na Coordenadoria que virou uma Sub-coordenadoria e a chefia não era mais a mesma. Mas não tive muita dificuldade, pois consegui fazer com que a minha nova chefe entendesse que seria muito importante para nossa Sub-coordenadoria participar desse evento e, que para isso eu estava a disposição, pois tinha alguns recursos e só necessitava da liberação de alguns dias, pois iria e voltaria de ônibus, e além da programação da feira, eu poderia ir ao Hospital das Clínicas. Conseguindo a liberação, eu viajei no dia 31 de Março de 2009, saindo as 8:00hs da manhã, enfrentei 32hs até São Paulo.
Fui recebido pelo Sr Luiz e Sra. Alice Cavalli, pessoas que eu não fazia idéia do quanto fariam parte da minha vida. Fomos para casa e no segundo dia eu fui ao evento, assisti algumas palestras.
Ao retornar para casa, me organizei para poder ir ao Hospital das Clínicas no terceiro dia de minha estadia. Fui e me encontrei com a Andreza na frente do Instituto do Câncer.
Sem saber exatamente aonde ir, fomos ao Instituto do Câncer. Fomos informados pela recepcionista que eu só poderia ser atendido se tivesse um encaminhamento ou da Bahia ou outro Hospital que eu tivesse sido atendido em São Paulo.
Ela sugeriu que a gente fosse no HC, para tentar uma atendimento lá e, se fosse o meu caso, conseguiria um encaminhamento para o ICESP.

Firmes e confiantes, fomos ao HC e ao chegar na recepção, fomos encaminhados para o setor de dermatologia.
 Contei minha história ao rapaz da recepção de lá, que sugeriu que fôssemos conversar com a médica do plantão.
Ela me examinou e ficou muito sensibilizada, me dando uma guia, encaminhando para fazer o cadastro e marcar uma consulta.
Passei por uma primeira avaliação e foi marcada uma consulta para dia 06/04, as 6:30hs.
Ficamos muito felizes com o que conseguimos, fomos embora e fomos a casa da Priscila.
No quarto dia, voltei a feira, participei das atividades, fiz alguns cadastros, revi amigos e pessoas queridas como a Maria Olívia da CORDE a Denise.
No quinto dia, um pouco cansado do corre-corre, descansei um pouco e fui para o último dia da feira. Fui incentivado por amigos a fazer cadastros nas empresas para ter a chance de um dia, ser contratado para trabalhar em São Paulo, mas até hoje só me solicitaram currículos e passei por uma entrevista mas fui em Salvador na Brasilgas e Gerdau.
Dia 06/04, os dermatologistas que me atenderam agendaram outras consultas, marcaram biopsias e o uso de algumas pomadas e também uma seção de quimio. Neste mesmo tempo eu pude ver o quanto era diferente a infra-estrutura do HC.
Voltei novamente a SP, fiz as biopsias, fiquei doente e não tive a oportunidade de fazer a metade das coisas que tinha que fazer. Tive febre e os dias passaram. Assim que melhorei, voltei para Salvador com cirurgia marcada para o dia 18/06/09 as 6:30hs.
Eu tive dificuldades para arranjar alguém para me acompanhar, pois precisava lá no hospital, falei com alguns amigos e consegui a ajuda do Sr. Luiz.
Eu tive que me organizar para o meu terceiro retorno a São Paulo, pois as primeiras 2 viagens tinham sido muito cansativas. A Dra. Shirley havia comentado sobre a possibilidade de eu dar entrada no TFD pois como estava em Tratamento em São Paulo, poderia ser possível.
Busquei algumas informações sobre o TFD e como fazer para solicitar. O pessoal daqui foi muito sensível, eu tive um pouco de dificuldade para chegar até eles por conta da indisposição que a lesão estava causando.
Eu tive outra recaída e mesmo com todos os documentos não tive condições de ir ao local de atendimento para dar entrada, ai só consegui sair uns 2 dias antes da data da cirurgia.
Eu tinha 2 planos: tirar a passagem de Ônibus e ir na terça dia 16 para chegar na madrugada do dia 18 ou, conseguindo o cadastro do TFD e as passagens de avião, ir até um dia antes da data de minha cirurgia.
Como não tive condições de ir fazer o cadastro, já era praticamente impossível pensar no TFD.

Fui bem cedo até a rodoviária, solicitei a passagem de ida com data de saída no mesmo dia a noite as 20:00hs e depois fui para o trabalho para poder da satisfação dos dias que tinha faltado.
Quando eu estava para retornar a São Paulo por conta da Cirurgia no dia 18/06/09, no caminho eu liguei para minha mãe para pegar um comprovante de residência e, ao chegar no trabalho, me deu na cabeça de ligar para o telefone do TFD.
Entrei em contato com o TFD, fui atendido por uma assistente social muito atenciosa que me pediu que enviasse os documentos por fax para que fosse avaliado e se caso tivesse tudo certo, eles poderiam liberar a passagem até as 18:00hs ou no dia seguinte
Então eu só aguardei minha mãe chegar com o comprovante e mandei tudo via fax e, no meio dia, foi aprovado. Eu fiquei muito feliz, pois seria mais confortável a minha ida. Trabalhei nesse dia e dia 17 foi liberada minha passagem.
Cheguei no aeroporto de Congonhas e fui para casa de Andreza. Novamente fui muito bem recebido pelos Cavallis e no dia seguinte foi o dia tão aguardado. Eu estava muito apreensivo, com muito medo, mas a força que estava tendo de todos, mais a ajuda do pai da Andreza me acompanhando, foram muito importantes
Passei pela cirurgia e os médicos me pediram que ficasse até a quinta da semana seguinte, pois era necessário que eu passasse por uma reunião para ser reavaliado.
Disse a eles que poderia ficar pois para mim seria bom, pois se tivesse algum problema eu já estaria lá mesmo.
Eu que achava que nesse mesmo dia, depois da reunião com os médicos iria embora, mas para minha surpresa, fui internado para que pudesse fazer alguns exames, no dia 25 de junho.
Pensando que ficaria no máximo por uma semana, acabei ficando por quase duas.
Pedi a Andreza que comunicasse algumas pessoas do meu trabalho, pois fiquei preocupado com o tanto de dias que já estava em falta no meu trabalho.
Só fui liberado para voltar por conta da preocupação com minha situação no trabalho e o fantasma do desemprego, vocês sabem, pois a possibilidade de ficar sem emprego era a última coisa que poderia acontecer comigo nesse atual momento de minha vida.
Mas com a ajuda de Deus, com esse recurso que conto para poder tocar minha vida, sem contar que mesmo com isso, todas as vezes que tenho que voltar a São Paulo, conto com a ajuda da Andreza e da família dela. Vocês não têm idéia do quanto eles me ajudam.
Sempre pude contar com a amizade e a atenção da Andreza + a atenção e sensibilidade do seu Luiz + as palavras de incentivo e perseverança da dona Alice + o bom humor do Marcus + a simplicidade da Mariana a não podemos deixar de fora a sapequinha e sempre serelepe Beatriz chamada por mim carinhosamente de Moranguinho.
A todas e todos vocês amigos que estão comigo e fazem parte da minha vida de uma forma ou de outra seja pela net ou mesmo pessoalmente, nos meus dias um muito obrigado!
Volto a São Paulo no próximo dia 17 de Agosto para consulta no dia 18/08/09 as 13hs.
Abraços a todos.
Anderson dos Santos e Santos
Pessoa com Albinismo
Sempre Militante
Em
Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiências

Um comentário:

  1. Nossa que triste. Se a saúde fosse realmente levada a sério e houvesse HCs em todas as capitais, histórias assim não se repetiriam.

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