sábado, 26 de junho de 2010

A VINGANÇA DA SENHORA HOPE

Henry James é avó da técnica do fluxo da consciência em seus romances e contos da madureza. Muito da ação de suas histórias se passa na cabeça das personagens, importando mais o modo como reagem, interpretam ou criam situações, mais do que os fatos e acontecimentos em si.

Também pesa em sua obra a questão da dubiedade. Em The Turn of the Screw (1898), por exemplo, as 2 crianças são vítimas ou agentes?

Dependerá do leitor a interpretação dos fatos e pensamentos das personagens, que corresponderiam a símbolos. Henry James era filho dum teólogo influenciado pelo sueco Emanuel Swedenborg, muito cotado também por poetas simbolistas, como Baudelaire.

Essa semana, li uma noveleta de James – quase um conto, de tão curta! – chamada The Abesement of the Northmores (1900), que é verdadeira pérola pra se perceber as características acima apontadas.

A estória se passa inteira na cabeça de Mrs. Hope, assim, jamais podemos afirmar com certeza se o que ocorreu foi daquele modo mesmo, nem mesmo se não foi apenas fruto da inveja e do ressentimento da velha senhora.

Lord Northmore falece e há enorme comoção na sociedade londrina, entre os círculos políticos e literários. A Sra. Hope crê que seu marido Warren foi injustamente sombreado pela fama do amigo morto e se ressente disso. Ainda mais porque, antes de se casar com Warren Hope (esperança, em inglês), a mulher namorava Northomore, mas o abandonara porque acreditava mais no futuro de Warren. Despeito, inveja.... James vai construindo uma teia complexa de sentimentos em uma narrativa tão curta!

A coisa se complica mais ainda: Warren vai ao enterro do amigo – a despeito dos protestos da esposa – e apanha friagem e chuva. Dez dias depois, morre. Muito menos repercussão nos jornais e mais ressentimento da viúva.

Lady Northmore decide reunir em livro as cartas trocadas entre seu marido e seus diversos amigos, por isso, envia carta a todos pedindo que lhes envie as missivas. Mrs Hope acredita que as cartas que seu marido escreveu são superiores, mas não há grande interesse dos editores em publicá-las. Isso leva a a senhora a retrair-se e a tramar vinganças para humilhar os Northmore, como a publicação das cartas que Lord Northmore lhe enviara enquanto namoravam.

Seguindo à publicação bem–sucedida das cartas de Lord Northmore, a Sra. Hope se dá conta de que no fundo ninguém as achava tão boas assim e que seu finado marido pregara uma cruel peça na agora humilhada família Northmore. É essa certeza que energiza a viúva a fazer tudo o que fará até o final do econômico texto.

Henry James pega o lugar-comum de que a vingança é um prato que se come frio e deixa grandes pontos de interrogação: houve vingança de fato ou tudo não passou de impressão da Sra. Hope? A família Northmore foi mesmo humilhada? Se ocorreu ou não a vingança, o importante não seria a ressignificação que a Sra. Hope deu aos fatos, que, de algum modo, a satisfizeram?

No fundo o que realmente importa parece ser o fato de que a Sra. Hope agarrou-se à sua visão das coisas pra fazer o que cria correto e encaminhar sua existência até o final.

O opúsculo pode ser lido no original no link:
http://www.henryjames.org.uk/abasen/home.htm

(Uma balada country sobre Henry James!)

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