quarta-feira, 9 de junho de 2010

SOBRE JOANINHAS ALBINAS E FOTOS

Incentivador e seguidor do blog desde a primeira postagem, o (meu) professor José Carlos Sebe nos presenteou com crônica a respeito da causa albina.

Agradeço a ele por ter permitido a publicação em primeira mão, antes de qualquer outro veículo.

BOLA ALBINA: LENDAS E FOTOS...

José Carlos Sebe Bom Meihy


Em tempos de Copa do Mundo, a questão albina ganha surpreendente lance. Depois da insistência na demonstração de animais sem pigmentação alguma, agora surge outra “novidade”: a “bola albina”. O comentarista Affonso Romero, publicitário e profissional de marketing, faz eloquente elogio à bola de futebol. Escreveu assim no Jornal O Globo de 6 de junho de 2010 (p. 46): “jogadores com status de estrelas. Técnicos em ternos. Árbitros coloridos. Torcedores, câmeras, locutores, comentaristas, repórteres. Mas é a bola quem atrai, só, a atenção. Bola esta vaidosa. Quem é ela indagaria Nelson Rodrigues” e progride na poética dissertação afirmando que “depois de passar por muitas transformações, em 1970, como uma joaninha albina, ganhou 32 gomos (20 hexagonais brancos, 12 pentagonais pretos) e girou como (via) satélite, acima da outra grande bola, azul. Metáfora do mundo da bola, bola da vez, ganhou vida própria e marca no couro...” O artigo rola mais até que chega à “jabulani”, termo editado na língua Bundo dominante no país, para a versão atual das mil e duzentas bolas que rolarão nos gramados da África do Sul. A par da ponderação de Romero, interessa o ângulo positivo da retomada do albinismo. Confesso que achei emocionante a referência à joaninha albina. Lindo. E, levando avante a meditação, imagino que na redondeza da bola se integram valores diferentes que constituem um todo atrativo, alvo de toda movimentação que envolve os 214 países do globo. Na esfericidade, a lógica que inscreve o cerne das atenções.

Gosto de pensar na alternativa brasileira de perceber positividades na abordagem do albinismo. Chega de apenas supor os ângulos negativos. Por lógico, não podemos desprezar os cuidados requeridos para tratamentos médicos preventivos e direitos civis, mas, registre-se, há outros territórios da questão albina que cobram consideração. No Brasil, historicamente, temos lendas redentoras da consideração do albinismo como fenômeno cultural. No interior do Maranhão, na fantástica Ilha de Lençóis, uma comunidade inteira inscreve uma das maiores concentrações de albinos do planeta. Integrados ao meio, eles vivem e louvam o existir naturalmente. Para animar, duas lendas se trançam dando sentido a uma mitologia bonita porque humanizadora daquela condição. A fábula de Dom Sebastião, rei português desaparecido na Batalha de Alcacer Quibir, em 1580, alimenta o imaginário fecundo e admirável que reza a transferência do corpo do “encoberto” para o Brasil, onde foi trazido por bandos de anjos. Desta magnífica visão teriam se originado aqueles albinos. Não bastasse o fascínio dessa fabulação, outra lenda, decorrente da primeira, sugere aperfeiçoamento. A “cidade subterrânea”, alegre, funcional, perfeita, amável, a urbe seria habitada por seres encantados, benditos pela perfeição constante no branco da pele de escolhidos.

Ao contrario do que acontece em boa parte do mundo, nossa cultura abriga clarões de positividade no caso. Em partes da África – onde a reincidência de casos é mais comum, posto ser dominante em negros – os albinos são vistos como sinais de mau auguro. Entre tribos de índios, como os Kuna na fronteira da Colômbia com Panamá, os albinos são mortos ao nascer para que não alastrem a desgraça de suas vidas. E não apenas na sentença de morte, mas também no confinamento, como ocorre no interior da Austrália. Mesmo no Brasil, ante a positividade da aceitação da lenda ilhota ainda padecemos de visões distorcidas.

Talvez o mais intrigante aspecto da questão albina seja a visibilidade. Na rua, se algum albino é identificado, logo chama a atenção pelo diverso. E todos olham. E como olham! Ao contrário, porém, na oficialização cultural não vemos a presença dos mesmos seja na Literatura, História ou Política. São poucas as políticas favoráveis a eles e é exígua a atenção devotada. Raras suas imagens. Raríssimas. Há esforços relevantes, no entanto. Diria que entre os mais expressivos exemplos de empenho o nome de Gustavo Lacerda, fotógrafo dos melhores, se apresenta como revolucionário. Há pouco tempo, o reconhecido senhor das câmeras fotográficas vem clicando albinos para uma exposição. O sucesso já se lhe avizinha e deve ser somado a de outros que assumem a causa. Tomara que a joaninha albina consiga marcar também o gol desejável de quantos conseguem ver alvura no futuro de pessoas que apresentam na conquista de uma identidade cidadã.


(Creio que o professor gostará deste vídeo-agradecimento. O Sebe é corintiano e ama tango. Que lo disfrutes, che!)

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