terça-feira, 7 de maio de 2019

TELINHA QUENTE 359


Roberto Rillo Bíscaro

É certo que qualquer história de detetive amador sugere incompetência policial, em alguma medida. Aponta também supremacia sobre do trabalho individual, não-treinado sobre o grupal preparado para ações investigativas.
A série Ultravioleta (2017), adicionada discretamente ao catálogo da Netflix, não desmerece a labor grupal, mas demole o supostamente especializado, em nível quase aterrador. Baseados num livro que narra contribuições dum grupo de internautas na resolução de casos considerados insolúveis pela polícia, os dez capítulos traçam o órgão público polícia como basicamente inepto, inapto, estúpido e desprovido de qualquer equipamento humano ou tecnológico.
Ultravioleta é o nome dum grupo de fuçadores internéticos que resolve casos que a polícia de Lódz não consegue ou não quer se dedicar. Não há nada de errado na colaboração entre polícia e expertos de fora da caixa, mas a série exagera na caracterização negativa da força policial: parece que os caras sequer possuem departamento de informática e são incapazes de pensar nas coisas mais óbvias. Pra se ter noção, o único policial que ganha destaque é o bofão que será interesse da protagonista: o cara usa boné com a aba pra trás, que nem moleque!
Liderando o Ultravioleta está a uberista Ola Serafin, que não possui nenhum talento ou treinamento especial, além de protagonizar a série. Na verdade, antes do capítulo primeiro, ela sequer conhecia a organização, mas a partir do segundo já dá palpites e indicações óbvias, que qualquer serviço policial teria feito como parte do procedimento padrão. Além de Ola, há o usual jovem hacker (asiático, porque a Polônia também quer ser multiculti!), duas youtubers que dão dicas de maquiagem (é o predomínio da turba dos comentários!) e um policial aposentado (ué, mas policiais não são incompetentes?).
Todos esses senões são em nível conceitual, de criação, então se os roteiros forem eficientes, basta suspender a descrença e evitar cair na perigosa assunção de que os serviços públicos não funcionam, que Ultravioleta vai de boa? Isso também não é tão simples, porque, pra reforçar o conceito de excelência onisciente do Ultravioleta, as tramas não se aprofundam.
Os temas dos episódios são bem interessantes, como inteligência artificial, imigração (quem quer emigrar pra Polônia?) e, claro, assassino em série. Entretanto, a execução não é de bamba. Tudo se resolve sem solavancos pro Ultravioleta, os únicos capazes de usar a rede e rastreios de celular inteligentemente. Os desvendamentos são por demais simples e imediatistas.
A primeira série polonesa na Netflix brasileira não se destaca, mas a vi inteira, não apenas porque gosto de produções destoantes da hegemonia anglohablante, mas, porque dá pra ver tranquilamente, não é ruim. Só não é nível Hinterland, também presente na Netflix.

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