quinta-feira, 16 de maio de 2019

TELONA QUENTE 288


Roberto Rillo Bíscaro

Raymond Briggs é ilustrador bastante conhecido na Inglaterra. Seus trabalhos incluem material para crianças e adultos, dentre estes, a novela gráfica inspiradora da clássica animação pós-nuclear When The Wind Blows (1986). Nela, James e Hilda Bloggs são simpático casal de velhinhos, que não entende nada do que está acontecendo numa Inglaterra recém-atingida por bombas nucleares (faria alguma diferença se entendessem?).

Briggs afirmou, que os modelos de James e Hilda Bloggs (Briggs, Bloggs...) foram seus pais e isso se corporificou com a publicação de graphic novel Ethel and Ernest, em 1998. Em 2016, Roger Mainwood adaptou a história de amor dos pais de Briggs, numa animação chamada Ethel and Ernest: a true story, como no gibi. Fiel ao característico traço de Briggs – exceto quando se trata de máquina/tecnologia, repare -, a animação é homenagem ao artista, que homenageou seus pais. Ethel e Ernest se conhecem no ocaso dos anos 20 e permanecem juntos até que a morte os separou, mas não por muito tempo: ambos faleceram, em 1971.

Trata-se da história de um casal britânico “comum”, que viveu os horrendos ataques aéreos de Hitler; experimentou os surtos de consumo do capitalismo primeiro-mundista; chocou-se com uma decisão do filho de optar pela insegurança das artes ao invés de um “respeitável” escritório. A crença cega em Churchill, durante a Segunda Guerra, é a mesma que Briggs usou nos Bloggs, com relação às instruções governamentais de proteção antinuclear. Também coincide a determinação da ex-criada em não se perceber como classe operária e suas disputas com o marido leiteiro, Labour convicto.

Ethel and Ernest comenta sobre fatos marcantes do século passado, que moldaram o planeta como o conhecemos agora, através dos diálogos cotidianos do casal londrino, frequentemente sem noção exata dos assuntos sobre os quais falavam. Mas, então, quando se encontravam em encruzilhada de opiniões ou incerteza, sempre havia a salvadora xícara de chá.
É extremamente fácil se projetar, empatizar, vibrar com, reconhecer e se emocionar com o casal Ethel e Ernest. Eles são os nossos pais, nós somos eles; pessoas comuns, que vibram com a compra duma casa, não querem que os vizinhos bisbilhotem; mentem sobre falsas glorias filiais e não têm mesmo noção da complexidade desse mundão tão complicado e das forças tão poderosas e distantes, que fazem com que às vezes, tenhamos de nos separar de entes queridos, devido a uma guerra que não iniciamos.

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