quarta-feira, 22 de maio de 2019

CONTANDO A VIDA 273


(DES)MORO(NANDO).

Este artigo foi escrito dia 9/5/19, antes da oficialização do convite ao ex-juiz Sergio Moro. O anúncio da oferta para compor a bancada de Ministros do Supremo Tribunal Eleitoral foi divulgado oficialmente no dia 12 de maio. A questão que não pode ser silenciada remete à dúvida: foi cumprimento de promessa de campanha, ou prêmio de consolação pelas sequentes derrotas impingidas a Moro? O desdobramento notório dessa questão força outra dúvida: ao falarmos do ex-capitão estamos frente de um articulador medido, de um estrategista hábil e que sabe usar a mídia, ou, pelo contrário, de um trapalhão incontido que se vê obrigado a arrumar uma besteira depois de outra? Apostas abertas... Apostas abertas também para a resistência de apoiadores e arrependidos que, envergonhados alguns, engrossam as oposições unidas em busca de algum equilíbrio, dignidade e respeito a Constituição.

José Carlos Sebe Bom Meihy

Serei claro, de saída: sempre desconfiei do jeito de bom moço do atual Ministro da Justiça e Segurança Pública, o ex-juiz Sérgio Moro. Diria que o sinal de alerta acendeu quando ele optou por largar uma carreira de juiz, com 22 anos de carreira, para assumir cargo que, queiramos ou não, é político. O grande argumento para tal afirmação decorre do alinhamento ideológico, inerente ao programa do atual Presidente. Perguntei-me então: será mesmo para ampliar seu sonho de combate à corrupção e inscrevê-lo em largura nacional? Como qualquer cidadão comum, peremptoriamente, tive que pagar para ver. Em busca de aclarações, floriu no âmbito de minha curiosidade a declaração feita ao jornal O Estado de São Paulo, em 2016 quando na placidez da dicção paranaense disse:
“Sou um homem de Justiça e, sem qualquer demérito, não sou um homem da política. Acho que a política é uma atividade importante, não tem nenhum demérito, pelo contrário, existe muito mérito em quem atua na política, mas eu sou um juiz, eu estou em outra realidade, outro tipo de trabalho, outro perfil. Então, não existe esse risco”.
Os mais maldosos logo pensaram em compensações salariais, posto que a mudança elevaria o montante de pouco mais de R$ 28 para quase R$ 34 mil mensais. Este argumento, porém foi derrotado, posto que na condição de juiz, graças aos benefícios extras, houve mês que foi depositado em sua conta mais de 100 mil reais (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-46063006). Ponto para Moro. Luzia o melhor do bom moço.
Mas o que faria então o magistrado mais celebrado do país abandonar o trabalho que vinha fazendo com tanto sucesso na Operação Lava-jato? A justificação para o desligamento do Poder Judiciário em favor do Executivo se deu à soi disent pela “perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado no Executivo”. E foi assim que, juntamente com Paulo Guedes - que se tornou Ministro da Economia - Moro figurou como cara e coroa da moeda que negociava o sucesso de uma “nova política”. Com a promessa de amplos poderes e de isonomia, ambos foram apresentados à nação como superministros.     
Publicamente, antes da posse, o Presidente declarou que daria ampla liberdade de ação ao Ministro Moro, mas isto colocou em pauta uma questão no mínimo polêmica: como se daria o embate entre as posições antagônicas de ambos frente ao projeto de posse de armas, por exemplo. Por lógico, o assunto remetia às pautas de Moro, pois, afinal, ele foi sagrado como Ministro da Justiça e Segurança Pública. O ex-juiz jamais defendeu a política de flexibilização do uso de armas, ao contrário do Presidente que veementemente prometeu isto em campanha. Nos debates internos, já no mês de janeiro, Moro viu apagados seus intentos de rigor na restrição ao número de armas para os usuários. Seu semblante nas fotos amplamente divulgadas quando do sucesso da linha presidencial o mostram no mínimo constrangido. Se esta foi a mais evidente das diferenças entre os dois, não foi a única.
O ex-juiz propalou que seu grande projeto no comando da pasta seria o Pacote Anticrime. No melhor de suas quimeras, o conjunto de medidas correria no Congresso Nacional em paralelo ao à Reforma da Previdência. Moro viu, contudo, desbotados seus esforços quando se desentendeu com o Presidente da Casa, Rodrigo Maia. E a briga ganhou foro público frente a conclusão de Maia que constatou na redação da proposta de Moro um “copia e cola” do texto do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. A desavença fez com que fosse retardado o ritmo dos trabalhos e o esforço de Moro está em compasso de espera. 
Frente à indicação da reputada pesquisadora e colega de trabalho de Moro, Ilona Szabó, para ocupar a vaga de suplente no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, o Ministro se viu publicamente desautorizado pelo Presidente, que trocou a escolha por pressões oriundas de fora do governo. O resultado resultou-lhe num mau posicionamento frente a opinião pública que já começava duvidar do alcance do sonho do ex-juiz.
Por necessidade de reparar um dos pilares da campanha presidencial, o ex-capitão se viu premido a uma Reforma Ministerial, com redistribuição de atividades. Neste episódio, a FUNAI figurou como um dos móveis de câmbio, passando à pasta da Justiça a responsabilidade de trabalho com as demarcações de terras indígenas. Com isto foi dada a largada para outra séria divergência, pois o Presidente declarou em alto e bom som que não pretende entregar mais terras demarcadas. Tudo, porém, se complica na realidade dos fatos jurídicos que somam mais de 50 decisões favoráveis às demarcações.
A fermentar a massa de problemas já em processo de desencanto, deve-se lembrar que os parlamentares têm dado sinais de descontentamento. O mais consequente ponto de atrito foi definido pela Câmara que, em votação polêmica, subtraiu do Ministério da Justiça o comando direto sobre o COAF, passando-o ao Ministério da Economia. O enfraquecimento da Operação Lava-Jato, pois fica comprometido, ruindo um dos pilares mais sólidos da proposta do Ministro Moro.
A pergunta que não quer calar remete ao futuro de Moro. Será que continuará perseguindo o mote justificador de sua saída do Judiciário para o Executivo, ou, não? Os mais atiçadores ficam pensando na eventual aplicação do recurso “saída honrosa”. E não faltam desculpas, pois logo mais, em 2020, o Ministro Celso de Mello completará 75 anos e a compulsória brilhará como caminho alternativo tanto para Moro como para o Presidente. E tem mais: em 2021 outra vaga será aberta com a aposentadoria de Marco Aurélio Mello. Pois bem, está aberta a estação de apostas...

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