quinta-feira, 19 de abril de 2012

TELONA QUENTE 47

Roberto Rillo Bíscaro

Alguns atores me são tão caros, que necessito rever alguns de seus filmes de tempos em tempos. O aposentado Gene Hackman faz parte desse Olimpo particular. Desde algum momento dos anos 80 sou fã; creio que o gatilho foi Mississippi em Chamas (1988). E quem nega que o antigalã roubou Superman (1978) do finado Christopher Reeve? O Lex Luthor hackmananíaco é uma joia de humor e ironia.  Até banda de rock homenageou o venerável Gene!


Decidi reassistir a I Never Sang for my Father (1970). Com efeito, considero tê-lo visto por primeira vez domingo último, uma vez que apenas vira a versão dublada há décadas nalguma estação televisiva. Por melhor que seja o dublador, Hackman sem sua voz, inflexões e a inconfundível risadinha não dá!
Adaptada por Robert Anderson a partir de sua peça homônima, o filme mostra o duro relacionamento entre um pai ancião e seu filho de meia-idade. Trata-se do famoso realismo psicológico norte-americano, com sua maciça influência psicanalítica.
Após a morte da esposa, Gene – a personagem é xará de Hackman – passa um tempo na Califórnia, onde conhece uma ginecologista, por quem se apaixona e com quem quer reconstruir a vida. Por diversos motivos, o professor-escritor tenciona abandonar Nova York pra recomeçar no oeste. Mas, como se libertar da influência do pai octogenário, outrora homem de classe-média bem-sucedido, incapaz de lidar com as limitações e o esquecimento pelo mundo provocados pela velhice? Some-se a isso, o temperamento despótico/egoísta e o não muito velado desprezo que sente pelas escolhas profissionais do filho.
A ideia psicanalítica da repetição de estruturas comportamentais é a base da motivação atitudinal de Tom, pai de Gene. Odiando o pai, comportou-se de modo a também alienar o filho de seu afeto. Gene, por sua vez, carrega o fardo dum colossal sentimento de culpa por detestar seu progenitor. It’s a man’s world!
O teatro norte-americano tem colocado muitas famílias pra se estraçalharem verbalmente no palco. O resultado é muita gritaria e a ideia equivocada de que os problemas são puramente pessoais, desconsiderando a estrutura social formadora dessas personalidades. Claro que grandes dramaturgos como Arthur Miller e Tennessee Williams conseguiam enxergar além do véu psicanalítico.
O roteiro de I Never Sang For My Father apresenta a precisão dos melhores desse gênero. Motivações são bem delineadas, mas acaba sendo difícil simpatizar com o ancião que expulsara a filha de casa por ela haver se casado com um judeu.
Tom é interpretado estelarmente por Melvin Douglas. Hackman – ainda não um superastro – atua com gusto, indo do terno ao enfezado com brilhantismo. Ambos foram indicados ao Oscar. Douglas não levou a estatueta porque teve o azar de competir com George C. Scott (outro amado) reencarnado como o General Patton.
Com muitos diálogos, música-tema linda e aquele delicioso clima de início dos anos 70, I Never Sang for my Father é prato cheio pra quem delira com dramas bem interpretados.
Que bom que agora terei versão no original pra reforçar minhas doses periódicas de Gene Hackman.

Um comentário:

  1. Eu! Eu nego que ele roubou o filme Superman do Christopher Reeve, pois naquela época o destaque ainda era o herói e não os vilões, como ocorre hoje nos filmes de quadrinhos.
    Do Hackman, gosto muito de Operação França e A Conversação, onde a atuação dele também é um dos destaques. Mas isso não ocorre mesmo em Superman, sorry!

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