quarta-feira, 20 de maio de 2009

INCLUSÃO DIFÍCIL

Cota não garante inclusão de aluno deficiente
Em pesquisa realizada nas grandes universidades que adotaram o sistema de cotas, os números mostram que em todas o percentual de pessoas com deficiência beneficiadas é inferior a 1% do total das vagas

Antônio Gois

Enquanto o Congresso debate a aprovação de cotas de 10% das vagas em universidades públicas para deficientes, a realidade das que já adotam esse sistema mostra que a inclusão dessa população no ensino superior é mais complexa do que o simples estabelecimento de um percentual em lei.
Segundo o Mapa das Ações Afirmativas do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), há 19 instituições públicas de ensino superior -de um total de 249 no país- com algum tipo de ação afirmativa beneficiando deficientes. Na maioria dos casos, são estabelecimentos de pequeno porte.
A Folha selecionou quatro instituições de maior porte que já adotam o sistema há, pelo menos, três anos: as universidades estaduais do Rio de Janeiro, de Goiás, do Rio Grande do Sul e a federal do Maranhão.
Em todas, o relato foi o mesmo: o percentual de deficientes beneficiados foi sempre inferior a 1% do total das vagas ou matrículas.
Mesmo na universidade que há mais tempo reserva vagas para deficientes -e que tem percentual igual ao que está sendo discutido no Congresso, de 10%-, são poucos os que, na prática, se beneficiaram do sistema. Eles somam apenas 12 na Uergs (Universidade Estadual do Rio Grande do Sul), ou 0,5% do total de 2.410 estudantes.
O que a experiência dessas universidades mostra é que o principal filtro não está no vestibular. Na Uergs, por exemplo, apenas 20 deficientes se candidataram a uma das 64 vagas destinadas a eles no último exame, ou seja, havia mais vagas reservadas do que candidatos aptos a elas.
A constatação de que a inclusão de deficientes no ensino superior passa antes por um esforço na educação básica é evidenciada também pelo Censo Escolar do MEC (Ministério da Educação).
Em 2007, o levantamento identificou apenas 16 mil deficientes no ensino médio, de um total de 8 milhões de estudantes, nesse nível de ensino.
A diretora do Departamento de Projetos Especiais e Inovação da Uerj, Hilda Souza, diz que, uma vez que os alunos com alguma deficiência conseguem ingressar na universidade, há um outro desafio a ser vencido: dar condições para que eles concluam o curso. "A experiência destes anos de adoção da política de cotas em nossa universidade tem nos mostrado que somos capazes de realizar a inclusão social dos alunos pela inclusão acadêmica. Mas é imprescindível que tenhamos uma política de permanência para estes alunos."
Para isso, ela conta que a universidade está desenvolvendo um projeto de acompanhamento de cada aluno deficiente, trabalhando diretamente com as unidades acadêmicas a que eles estão vinculados.
Evasão
Apesar de a evasão desse grupo na Uerj ser menor do que a média nacional, ela diz que o percentual de concluintes nesse grupo ainda é muito baixo."Eles evadem menos que a média, mas parece que ficam retidos mais tempo, ou seja, não conseguem integralizar o curso no tempo mínimo permitido", relata a diretora.
Ainda que eles sejam poucos, a inclusão de deficientes na universidade exige também adaptações físicas ou de procedimentos.
Aulas em libras e letras maiores estão entre as adaptações exigidas
Para garantir que a inclusão de deficientes no ensino superior aconteça na prática, as universidades também precisam se adaptar, física e pedagogicamente, a esses alunos.
Quando a Universidade do Estado de Goiás soube que receberia uma aluna com deficiência auditiva, uma das primeiras providências foi contratar um funcionário para repassar os conteúdos das disciplinas para a linguagem de libras.
O caso aconteceu com a aluna de pedagogia Marinês Alves da Conceição. O vice-diretor da unidade onde ela estudará, Adelino Machado, contou que precisou entrar em contato com professores que deram aula para a estudante nos ensinos fundamental e médio para melhor se preparar para recebê-la.
Os professores do curso de engenharia em energia e desenvolvimento sustentável da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul também tiveram que mudar alguns procedimentos para não atrapalhar o estudante Maurício Weber, que tem apenas 15% de visão. "Já no vestibular, minha prova teve que ser impressa com fontes ampliadas e eu tive um tempo adicional em relação aos demais candidatos. Em sala de aula, peço aos professores que não escrevam no quadro branco com cores muito claras", diz.
Maurício relata que as cópias que tira de textos têm que ser ampliadas e, quando isso não é possível, utiliza um monóculo para ler os textos. "Mas felizmente não tenho tido grandes dificuldades de adaptação."
Os relatos, no entanto, nem sempre são de experiências bem-sucedidas. O deficiente físico Alexssandro Ferreira dos Santos, 28, estuda geografia na Faculdade de Formação de Professores da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), em São Gonçalo. Ele conta que um de seus colegas desistiu do curso porque era cadeirante e não conseguia se locomover pelo campus. "Quando passei no vestibular, liguei para a faculdade perguntando se ela era totalmente acessível. Me disseram que sim, mas, quando cheguei, percebi que isso não era completamente verdade. Como eu ando com a ajuda de uma bengala, consigo estudar mesmo assim", diz.

(Encontrado em http://saci.org.br/index.php?modulo=akemi&parametro=25519)

Nenhum comentário:

Postar um comentário