quinta-feira, 29 de junho de 2017

BEM ESTAR NO G1 - III

Com foco na prevenção, projeto quer dar qualidade de vida a albinos

Programa Pró-Albino atende, gratuita e periodicamente, 200 pessoas com albinismo, na Santa Casa de São Paulo. É o primeiro e único projeto deste tipo no país.

Por Erick Gimenes, G1 PR

Aparecida de Souza, uma das pacientes do Pró-Albino, aguarda por consulta (Foto: Fabio Tito/G1)


O Programa Pró-Albino, da Santa Casa de São Paulo, atende gratuitamente mais de 200 brasileiros portadores de albinismo, hoje em dia. São pessoas nascidas em diversos cantos do país, que buscam atendimento especializado e acolhimento social.

O projeto, ainda experimental, foi criado pelo oncodermatologista Marcus Maia, em 2010. A ideia é interligar especialidades médicas - oncologia, dermatologia, oftalmologia e psicologia, por exemplo - para oferecer acompanhamento completo e periódico a albinos. É o único programa médico inteiramente dedicado a essas pessoas no Brasil.

"Pacientes albinos chegavam aqui com câncer de pele muito avançado. A falta de proteção ao sol e uma pele muito clara, como é o caso dos albinos, é o fator desencadeante. Eles chegavam muitas vezes com risco de vida. Então, nós pensamos, naquela oportunidade: não é este, exatamente, o paciente que eu quero. Eu quero conhecer o albino antes do câncer, para que a gente possa orientá-lo, para evitar que ele chegue nessas condições", explica o médico.

É justamente a prevenção do câncer de pele, frequentíssimo entre os albinos, a maior preocupação dos médicos do programa, conta a coordenadora do Pró-Albino, Carolina Marçon. Quanto mais cedo e assíduo o cuidado para evitar a doença, melhor a condição de vida dos albinos.

"Se eles cuidarem, se eles usarem protetor adequadamente, tomarem todos os cuidados, eles chegam na idade adulta com a pele perfeita. Assim, conseguem ter uma vida normal, como qualquer um", comenta a dermatologista.

Marcus Maia, Carolina Marçon e Ronaldo Sano, médicos responsáveis pelo Pró-Albino (Foto: Fabio Tito/G1)


Nas cadeiras de espera do quinto andar de um dos prédios da Santa Casa, onde funciona o Pró-Albino, mistura-se todo o tipo de gente com albinismo: jovens universitários, senhoras, bebês, famílias quase inteiras. Todos eles passam por uma bateria de exames nas salinhas do hospital, geralmente de dois em dois meses, e, caso necessário, recebem tratamento imediato, ali mesmo.

Uma das técnicas mais comuns é a crioterapia, na qual se usa nitrogênio líquido, em temperatura abaixo de zero, para matar as células cancerígenas e reverter lesões de pele. Outro método corriqueiro é a reposição de vitamina D, substância fundamental na prevenção de doenças como osteoporose, raquistismo, diabetes e problemas vasculares, cuja principal fonte é o sol.

Paciente passa pelo tratamento de crioterapia (Foto: Fabio Tito/G1)

Para os olhos, a grande jogada é o diagnóstico precoce, afirma o coordenador de oftalmologia do Pró-Albino, Ronaldo Sano. "O desenvolvimento visual das crianças ocorre principalmente nos sete primeiros anos de vida. E, mais importante, nos três primeiros anos de vida. O diagnóstico precoce desses pacientes, dando melhores condições e estimulação visual desde cedo, faz com que eles tenham um desenvolvimento mais rápido nessa primeira infância e resulte em melhor visão".

A estimulação visual passa pelo uso adequado de óculos, exercícios visuais com objetos coloridos e com a procura de objetos e exames periódicos. "Se você fala que um albino vai melhorar em torno de 10% a sua visão, para a gente que enxerga 100%, 10% é muito pouco. Mas nesses pacientes, que enxergam 10%, 10% a mais é dobrar essa visão. Temos que fazer o máximo que conseguimos por eles", diz o médico.

O músico João Paulo Santos, paciente do Pró-Albino, conta que o atendimento especializado e as orientações oferecidas no programa renderam melhor qualidade de vida a ele. Na infância e adolescência, vividas sob o sol forte do interior de Minas Gerais, ele teve problemas sérios de saúde por não conhecer sua condição.

"Quando criança, eu nem sabia que era albino. Meus pais não tinham nenhum conhecimento também. Como eu vim de família humilde, eu tinha que ajudar em casa. Um dos meus primeiros trabalhos foi de vender sorvete na rua. Ficava exposto ao sol e sem proteção alguma. Também jogava bola, ia para as represas, para os rios. À noite, vinha a consequência: queimaduras, febre muito alta. Já cheguei a passar uma boa temporada no hospital".

Santos conta que, aos 15 anos, teve queimaduras de terceiro grau, causadas pela radiação solar, que renderam uma internação de 25 dias. Na época, ele trabalhava capinando quintais. "Com uns 15, 16 anos, eu trabalhava nessa parte de limpar quintais, exposto, ou recolhendo lixo. Era uma forma que eu tinha de ganhar dinheiro e ajudar minha família. Infelizmente, por não conhecer as consequências, eu não pensava nelas".
João Paulo Santos já trabalhou como sorveteiro e capinador de quintais, totalmente exposto ao sol (Foto: Fabio Tito/G1)

A dona de casa Aparecida de Souza, de 43 anos, conta que, ao chegar ao Pró-Albino e se deparar com dezenas de outras pessoas iguais a ela, sentiu-se acolhida. Ela é filha de agricultores e teve pouca informação sobre o albinismo até conhecer o programa.

"Eu tinha preconceito de mim mesma. Eu mesma não me aceitava albina, achava que a minha família era a única albina. Quando eu comecei a fazer o tratamento, que eu comecei a ver, eu comecei a me aceitar melhor, porque eu via que não era só agente que era diferente".

A desinformação custou cara para Aparecida. Ela diz ter perdido as contas de quantos tumores de pele já teve - só na região da cabeça, foram cinco -, todos curados com a ajuda dos médicos da Santa Casa.

"Graças a Deus, encontrei uma equipe médica muito boa, que cuidou de mim com muito carinho. Cheguei perto de morrer, mas, dali para cá, não parei mais de fazer o tratamento. Agora dá para levar a vida tranquila, na boa", comemora.

Aparecida passa por consulta oftalmológica (Foto: Fabio Tito/G1)


Além de médico, o Pró-Albino tornou-se um programa, fundamentalmente, social. "Nós percebemos que o programa era muito mais do que pele, muito mais do que oftalmologia. Você está agrupando um grupo que não tinha proteção, que não tem onde se orientar, onde se conhecer. Esse foi o aspecto gregário que aconteceu. O grande problema do albino, além de proteger a pele, a proteção dos olhos, é a inclusão social", diz Marcus Maia.

Marcus Maia afirma que a grande meta do Pró-Albino é incentivar a criação de outros programas parecidos por todo o Brasil. O médico lista quatro grandes pontos a serem observados para que o tratamento aos albinos seja apropriado:

Programas pedagógicos adequados
Proteção solar
Orientação profissional com atenção às limitações oftalmológicas
Erradicação do preconceito

"Pretendemos levar esse projeto para o Brasil inteiro, nos outros serviços de dermatologia, de oftalmologia, e com isso garantir a assistência médica e, consequentemente, outros tipos de assistência, como a inclusão social do paciente", planeja.

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