quinta-feira, 11 de junho de 2015

TELONA QUENTE 122

Roberto Rillo Bíscaro

A dramaturgia norte-americana presenteou o mundo com poderosos dramas familiares. Foram tantas peças que rendeu até sub-gênero, as Family Plays ou Family Drama. Eugene O’Neill, Tennessee Williams, Arthur Miller, Edward Albee e outros tantos juntavam os membros duma família numa casa/sala-de-estar e demoliam-na. Geralmente era uma gritaria que expunha podres, neuroses e jogos de poder, cujo objetivo era criticar a estrutura social através da representação familiar. O Teatro Naturalista foi vovô dessa fecunda geração ianque; leia aqui minha resenha prum desmonte familiar escrito por Leon Tolstoy.

Mas, os EUA não detém monopólio sobre os Family Dramas, que pipocaram pelo planeta, inclusive na pequena e insular Islândia. Ólafur Haukur Símonarson escreveu Hafið, sobre uma rica família reunida numa isolada aldeia pesqueira nos confins da ilha. Confins da Islândia são realmente confins, não!? O diretor Baltasar Kormákur adaptou o texto pras telonas, em 2002. O resultado foi meia-boca: tem fios soltos e muita pretensão pra pouca realização.

A globalização está afetando os negócios pesqueiros do patriarca Thordur, que, velho e doente, precisa passar o cetro prum dos 3 filhos e pensar em diversificar e flexibilizar sua produção. Mas, ele também quer lavar e passar a roupa suja familiar. Pra isso, convoca os rebentos e respectivas famílias prum fim de semana na cinzenta, esquálida e fria aldeia, onde todo mundo é esquisito. Segredos vêm a tona, ódios e paixões reprimidos afloram, tudo que se espera dum family drama, mas com a explosão de violência deste nosso mundo pós-Sam Shepard. The Sea (como é conhecido internacionalmente) pode ser mais ou menos definido como Shakespeare encontra Lillian Hellman encontra Thomas Vinterberg. Só que qualquer um dos três vale mais a pena.

Nos family dramas, geralmente empatizamos com alguma personagem, que representa a crítica ao que “está errado” na sociedade; ou mesmo que seja difícil empatizar, entendemos seu problema/comportamento. Em Hafið é difícil adotar o ponto de vista de alguém, porque todos são superficiais, desagradáveis e/ou inconsequentes. O adolescente que grafita os cifrões no carro do pai yuppie é revoltado contra o quê? Com cara apalermada, ele não fala quase nada durante o filme, então como não classificar seus atos como idiotas ou falta dum bom cabo de enxada apenas?

As tentativas de humor talvez sejam islandesas demais pra estrangeiros rirem; aquele policial e aquela cabra não têm nada a ver, pelo sangue de Cristo!

De praxe nessas obras, o conteúdo social sedimentado é o mais interessante e dá um mapa preciso do estágio do capitalismo na Islândia pré-arrombo do final da década passada. Cheque o destino do negócio pesqueiro e como termina Thordur e preste atenção aos imigrantes negros e asiáticos trabalhando globalizadamente há anos-luz de seus habitats primevos. E atente pro que o dono do bar fala a respeito do preço da cerveja e dos saquinhos de chá; superdetalhe pro contexto do drama familiar, mas foi uma das frases que mais me chamaram a atenção no mediano Hafið.

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