terça-feira, 19 de março de 2019

TELINHA QUENTE 352

Roberto Rillo Bíscaro

Em 1910, G. K. Chesterton criou detetive amador antitético ao famoso Sherlock Holmes, de Conan Doyle. Ao contrário do frio dedutivismo de seu colega muito mais famoso, Father Brown resolve tudo através da intuição e inerente conhecimento da alma humana, obtido no confessionário.
Poucas adaptações das aventuras do padre católico na anglicana Grã-Bretanha haviam sido feitas até que em 2013, a BBC deve ter se surpreendido com o estouro de sua série vespertina. A emissora tencionava revigorar suas tardes e conseguiu, ou pelo menos, o pessoal deve gravar adoidado ou ver em streaming. Fato é que agora Father Brown é exibido em umas duas centenas de territórios ao redor do globo. Algumas Netflixes têm várias ou todas as sete temporadas. Assinantes brasileiros, chovam pedidos pra empresa, porque é muito fofo demais da conta.
Os episódios são adoráveis e misturam discreto humor com história de detetive. É tudo desavergonhadamente inverossímil. Na pequena aldeia de Kembleford - que tem desde bares barra-pesada obscuros a seitas pagãs secretas – e em incontáveis mansões agrárias, o rechonchudo, chapeludo e guarda-chuvado pároco mete o nariz em tudo e resolve todos os crimes, pra desespero dos inspetores locais, que vivem prendendo alguém erroneamente no meio ido episódio.
Não há nada de novo na fórmula: é crime digestível resolvido pela Miss Marple local (diversas vezes, é feita a comparação), por um bando de gente irrealmente fofa. Tem lady que investiga junto com seu chofer; sobrinha de lady sapequinha, mas nada esnobe e a fofoqueira adorável Mrs. McCarthy. Ai que vontade de comer seus  “award-winning strawberry scones”!
Dos detetives injuriados com a perspicácia superior do prelado, de longe o melhor é o Inspetor Mallory, mas você terá que esperar umas 3 temporadas. Jack Deam está perfeito com seu bigode postiço, suas consoantes finais explodidas, assim como seus ‘gês’ finais do gerúndio.
Mark Williams é irrepreensível como Father Brown. Sua entonação impossivelmente branda o tempo todo, sua capacidade irrestrita de compreensão, simpatia e amor cativam. Ter visto as cinco primeiras temporadas sem intervalo dos meses das férias televisivas deu pra perceber direitinho como o ator torna as expressões faciais e os movimentos da personagem bastante “forçados” pra realçar sua comicidade e charme simpático.
Totalmente viciante cuti-cuti nóxa-nóxa.

As sacrossantas temporadas de Father Brown são verdadeiros massacres: além das mortes das vítimas, que podem chegar a três em certos episódios, as histórias se passam nos 50’s, quando a pena de morte vigorava no Reino Unido, então, some aí os enforcamentos dos perpetradores e você terá um banho de sangue.
Menos mortandade ocorre nos 43 episódios de Father Dowling Mysteries, durante suas três temporadas, entre 1989-91. Como seu colega inglês, o norte-americano também foi baseado numa personagem, no caso, do escritor Ralph McInerny, que ainda tinha uma freira detetive.
O pianista Padre Dowling investiga sequestros e eventuais mortes, em Chicago, o que implica a presença da máfia em diversos episódios. Ele é auxiliado pela improvável Irmã Stephane, que, por ter sido criada na rua, sabe arrombar portas, trapacear no pôquer e até pilotar avião. Há dois alívios cômicos, que mais enchem do que divertem, especialmente o carreirista egocêntrico Padre Prestwick. Dowling foi interpretado com simpatia pelo finado Tom Bosley, que coadjuvara em Murder, She Wrote, como o xerife Amos Tupper, até ganhar seu próprio show.
Father Dowling Mysteries não apresenta nenhuma característica destoante da média das séries de detetives amadores dos anos 70/80/90; é tudo fórmula. Com o tempo, simpatizamos com Sister Stephanie e Dowling é superfofo, mas não dá pra recomendar em detrimento de Father Brown, que deveria ser prioridade pra quem pretende se iniciar em religiosos detetives.

Nenhum comentário:

Postar um comentário