quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

TELONA QUENTE 221


Roberto Rillo Bíscaro

Fechados há 14 anos, os Olhos Famintos, idealizados por Victor Salva, abriram-se pela terceira vez, em setembro. Como fazia mais de década que vira as duas primeiras prestações da franquia que não decolou, (re)vi de maratona domingueira a trinca de Jeepers Creepers. 
Jeepers Creepers (2001) é explícita tentativa de criar mitologia franquiável no mundo do horror, então com mitologias já exaustas e não-lucrativas, como Sexta-Feira 13, Halloween e A Hora do Pesadelo. Produzido pelo “cabeça” Francis Ford Coppola, o filme traz criatura sobrenatural que encarna literalmente o dito “você é o que você come”. A cada 23 anos, durante 23 dias, o Jeepers Creepers renasce pra devorar humanos e reciclar as partes de seu corpo envelhecidas ou danificadas. Daí a alusão à canção Jeepers Creepers, originária da década de 1930, que termina com o verso “onde você conseguiu esses olhos?” Como sou da geração indie-80’s, conhecia a referência através de Peek-a-Boo, da Siouxsie And The Banshees. Ao final do Olhos Famintos iniciais, esse verso concluinte fará muito sentido. A mitologia só não dá conta de explicar como uma criatura que recria partes de seu corpo comendo humanos especificamente por este ou aquele pedaço consegue ter asas. E nem porque precisa ter um caminhão, sendo tão forte e alado.
O veículo pode não ser explicável, mas faz parte do quadro mitológico ianque maior no qual Jeepers Creepers almejou se alojar. O terço inicial é road movie que introduz o casal de irmãos no meio do nada na vasta malha rodoviária norte-americana. Quer mais típico naquela cultura do que vagar sozinho e perdido pelo “the great outdoors” em seu fetichento automóvel? Quando os manos veem o que parece ser um corpo desovado numa tubulação e decidem voltar pra checar, seu inferno começa. Não muito longe dali, há um diner lotado de gente estranha; isso significa proximidade dalguma cidade, certo? Então não era tão nada assim, poderiam ter ligado pra polícia e seguido seu caminho. Mas, se não fosse por decisões estúpidas, não teríamos grande parte do horror. Além disso, pra variar, o moço e a moça são insuportavelmente irritantes, daqueles difíceis de empatizar, então têm mais é que se f*** mesmo. Tirando esse terço inicial, arrastado, responsável pela sensação de que a película dure mais do que seus 90 minutos, Olhos Famintos diverte.

Em 2004, Salva e Coppola reiteraram a parceria criativa com Olhos Famintos 2, mais divertido, mas menos bom que o primeiro. Mais divertido, porque mais ágil e as mortes começam mais cedo; menos bom, porque vira horror de monstro querendo jantar jovem e gente tentando eliminar o bicho-papão com armas mirabolantes.
Um grupo de jovens barulhentos volta pra casa depois de vencer um campeonato. Ao cair da noite, o ônibus fica parado no meio da rodovia e o Jeepers Creepers aparece pra pegar aqueles moços aptos a lhe restituir partes do corpo. Bem caipira esse JC; na cidade ele encontraria cardápio bem mais variado e fácil.
Preste atenção à resistência da capota do busão, proporcional à arbitrariedade do roteiro. Tem hora que o monstrengo enfia a garra, rasga o teto do veículo e puxa um petisco bípede; em outro momento, ele se estatela na capota depois de queda vertiginosa, mas o teto não cede, apenas alguns vidros se espatifam. Também os convenientes naquela hora. Como não curtir?

Olhos Famintos 3 foi saudado com a usual recepção a sequências: o primeiro foi melhor; acabou com o original e por aí foi. Bem, o original é apenas legal, não é um Halloween ou A Noite dos Mortos Vivos, combinemos, né? O 3 patina em vários momentos menos ágeis e aquela patacoada do fantasma, mas tem seus méritos.
Salva cruzou Mad Max e sua fixação por caminhões esmerilhando em autovias com o final de prequel, de Premonição 5. Essa última ideia foi bem legal e comprovou a sapiência de ter visto os 2 outros filmes imediatamente antes. Recomendo essa medida.

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