terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

TELINHA QUENTE 109

Roberto Rillo Bíscaro


O sucesso além-fronteiras de Forbrydelsen despertou parte do planeta pro potencial da TV dinamarquesa, mas ninguém no diminuto país acreditava que Borgen interessaria a estrangeiros. Foi isso que ouviu Sidse Babett Knudsen ao aceitar o papel da carismática Birgite Nyborg, primeira mulher a ocupar o cargo de Primeira-Ministra na península jutlândica. Apta a figurar em qualquer lista de melhores séries políticas de todos os tempos, Borgen conquistou umas 7 dezenas de países.
Vi os 30 capítulos, divididos em 3 temporadas, exibidas entre 2010-13 e entendi o sucesso e adulação. As 2 primeiras temporadas são brilhantes e a terceira é quase.
Evitando a folhetinização de Scandal e o personalismo exagerado de House of Cards, Borgen mostra a política como atividade que demanda líderes carismáticos, mas é essencialmente negociação intragrupos defendendo interesses conflitantes.
Nas 2 primeiras temporadas, o foco é quase todo na condução do governo da Dinamarca. Apenas Nyborg e um par de personagens são apresentados em seus dilemas pessoais, então sobra tempo pras negociações e intrigas políticas, apresentadas como algo inerente, sem sensacionalismo ou dramatização excessiva, afastando a produção de seus congêneres norte-americanos, afeitos à lacrimização e a golpes dramáticos vindos do nada. Não que Borgen seja destituído de tensão – se o fosse não seria bom – mas a trama é conduzida dum jeito mais “adulto” e emocionalmente escandinavo, pra usar um estereótipo daquela região, vista como mais “fria” e reservada.
A opção de não enfatizar a questão de gênero na eleição e governo duma Primeira-Ministra libera tempo pra sua ação mais livre e soberana, porém, leva o espectador a reforçar a noção errônea de que tais questões estão superadas na Dinamarca, inverdade explicitada na realidade da eleição da Primeira-Ministra Helle Thorning-Schmidt, contra a qual não faltaram críticas por ser “bonita demais” pra entender de política.
Numa entrevista, da qual participavam fãs, Hugh Bonneville esclareceu o assunto ao ouvir uma secundarista agradecendo por ter aprendido muito sobre a sociedade inglesa da época enfocada em Downton Abbey. Lord Grantham disse que se sentia lisonjeado, mas sabiamente advertiu que a série era apenas “a little bit o’ telly”. 
A terceira temporada de Borgen aprofunda algumas tramas individuais e em alguns momentos senti o interesse diminuir. Não a qualidade, porque houve capítulos interessantíssimos com discussões muito maduras sobre legalização (ou não) da prostituição, redução da maioridade penal, além de críticas ao endurecimento dinamarquês em sua política imigratória, de asilo e ao desmantelamento do Estado do Bem-Estar Social, pelo qual a Escandinávia também é idealizada. Mas, ao longo da temporada quase toda, não deu pra acreditar no relacionamento de Nyborg com o arquiteto inglês. Reitero não se tratar de queda na qualidade, porque a própria personagem é dúbia quanto ao caso amoroso. É que ficava meio enfadonho, às vezes. Eu queria mesmo era ver Hans Christian Thorsen, líder dos Trabalhistas; Lars Hesselboe, líder dos Liberais; Svende Age Saltum, caricato líder dos ultraconservadores e as demais personagens ligadas ao contexto político, motor dramático que justificou a criação e existência de Borgen.
Com texto excelente e atuações de alto calibre, o programa é indispensável pra quem curte intrigas palacianas.

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