segunda-feira, 14 de novembro de 2016

CAIXA DE MÚSICA 244

Ashleigh Smith: Sunkissed
Roberto Rillo Bíscaro

Músicos aprimoravam suas habilidades no circuito de shows. O ofício era aprendido por imitação de ídolos e ralação dura. Desde os anos 60, o número de cantores e instrumentistas com educação formal só aumenta, vide o caso do elitista rockprogressivo, nicho pronde foram vários alunos de conservatórios e escolas de arte. Maldosos afirmam que os músicos clássicos frustrados foram fazer prog.
No mundo do jazz e R’n’B o fenômeno da educação formal em música pode ser mais recente, devido ao background socioeconômico de muitos artistas, oriundos da classe baixa. Diploma não assegura brilho ou carisma, mas no caso de Ashleigh Smith, ter estudado música clássica em universidades na Georgia e no Texas ajudou imenso, porque o treinamento somou-se a uma vida cercada de música via audição de gente como Ella Fitzgerald e Sting e a herança de uma família incentivadora, porque composta por gerações de musicistas.  
A jovem de 27 anos trabalhou como vocal de apoio de Chrisette Michelle e em 2014 tirou o primeiro lugar no Sarah Vaughan International Vocal Competition. Educação + ralação valeram a pena e Ashleigh conseguiu contrato com a gravadora Concord, por onde estreou em LP com Sunkissed, em agosto.
A norte-americana chamou seus companheiros de classe, guitarrista Joel Cross e baixista Nigel Rivers, para produzir as 10 faixas e juntos escreveram meia dúzia, as demais são regravações. Além do mérito da boa qualidade, Sunkissed traz sangue novo e bom pro jazz.
O álbum abre com um dos 2 destaques, a faixa Best Friends, onde batida de bossa nova coexiste com batuquinho afro; muito brejeira. No final um solaço de gaita; é como se Steve Wonder participasse de um álbum do Matt Bianco. E por falar no influente músico cego; é ele quem informa parte da sonoridade de Smith, que traz a malemolência do R’n’B e do funk pro jazz. Into The Blue é o outro pico de Sunkissed: lenta arrasante com naipe de metais e baixo funk. Se esse trio amadurecer junto, poderemos ter obra-prima a médio prazo.
As demais composições não atingem o nível desse par, mas estão longe de fracas. A faixa-título está na medida pra fãs de sophistipop e dá pra se perder em seu labirinto de vocalizações e contracantos. The World Is Calling é urban jazz irresistível pra nós que crescemos com Everything But The Girl e toda aquela elegância da Quiet Storm e do jazz popificado pra tocar em FM descolada.
Pra conferir o excelente fraseado jazzístico da moça, ouça o que ela ostenta em Blackbird, cover dos Beatles, gorjeando “blackbird, fly” de vários jeitos. Sara Smile – dos outrora desvalorizados Daryl Hall e John Oates – é desbluezada e acelerada um tiquinho; ficou bem legal. Love Is You é cover da ex-patroa, mas Ashleigh ainda não tem porte pra Chrisette Michelle. Dá pra ouvir independentemente, mas se você conhecer o original... Pure Imagination, a capella com camadas de vocais põe a versão original, do filme A Fantástica Fábrica de Chocolate, no chinelo. Ser melhor que Gene Wilder não é lá grande vantagem, mas, tá valendo.
Promissora estreia de vários jovens talentos; oxalá frutifique com fartura. 

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