quinta-feira, 24 de novembro de 2016

TELONA QUENTE 177

Resultado de imagem para la adopción film
Roberto Rillo Bíscaro

Imigração e tráfico de mulheres têm sido temas recorrentes em filmes e séries europeus a ponto de já se poder elaborar compêndio a respeito. Correlata a esses fenômenos globalizantes, está a questão da adoção de crianças de países periféricos por pais de nações abastadas. Isso envolve temas polêmicos como a transformação do corpo em mercadoria e a rapinagem de centros afluentes sobre seus congêneres pobres (afinal, por que franceses normalmente não compram crianças de orfanatos dinamarqueses?), além de pontos, tipo, como negar que bons pais ingleses proporcionarão futuro com mais chances do que nenhum pai em Uganda?
La Adopción (2015), baseado em experiências da diretora Daniela Féjerman, na Ucrânia, não se propõe a abordar macroquestões; apenas numa discussão entre personagens a intermediária lituana (provavelmente) joga na cara do casal espanhol, que estes se aproveitam da pobreza do país pra comprarem suas crianças. Ao invés disso, oferece em tom quase documental, uma visão da agonia que o processo de adoção pode se tornar para pais de classe média europeus ocidentais que vão pro empobrecido leste e caem na teia de burocracia e corrupção.
Daniel e Natália (Francesc Garrido e Nora Navas, ótimos, especialmente ela) vão a um país do leste europeu ou ex-república soviética pra adotar um bebê. Há breve menção à Lituânia, então pode ser lá. Sob o intenso frio e neve das festas de fim de ano, logo de início intuímos que a jornada será odisseia hercúlea (porque sem direção), quando ainda no aeroporto as malas do casal são extraviadas propositalmente. Quando começam as intermináveis e frustrantes audiências com autoridades locais, o casal se dá conta de que terá que desembolsar mais euros do que imaginava, além de enfrentar o estresse de estar longe de casa, num local onde não fala o idioma.
Problemático pela generalização do que não é ocidental e pelo tempo todo se referir ao local como corrupto, ao mesmo tempo em que mostra Dani e Natália molhando mãos de locais com euros, La Adopción tem seu ponto positivo especialmente na força e realismo com que nos faz compartilhar com o casal a sensação de impotência e de estar isolado, perdido. A chapante e chapada brancura da neve, a desorientação de diversos idiomas misturados [espanhol, inglês, italiano e lituano (?)], o frio intenso e a dubiedade dos autóctones nos deixam tão desorientados quanto os simpáticos Natália e Dani. Como a película é narrada sob o ponto de vista deles, a questão da percepção do meio como corrupto até se entende.
Tópicos como o relacionamento difícil com o pai médico, que não levam a lugar algum, poderiam ter sido trocados em favor de nuançar um bocado mais a situação, afinal, se a população local é tão propensa a aceitar propina pode ter motivos tão válidos quanto o dos estrangeiros lá comprando as crianças feito bonecos, mesmo que seja pra lhes proporcionar amor e vida melhor.
Não dá muito mais pra reclamar da inacessibilidade dalguns filmes resenhados no blog. Vi La Adopción via Netflix, superuniversal em lares da classe média.

Nenhum comentário:

Postar um comentário