segunda-feira, 4 de abril de 2016

CAIXA DE MÚSICA 212

K. Michelle, More Issues Than Vogue.jpg
Roberto Rillo Bíscaro

Antigamente havia profusão de divas negras no mercado corporativo norte-americano. Hoje, a maioria grava por selos independentes e as poucas restantes sofrem grandes imposições das gravadoras. O mercado é dominado por “brancas com vozes negras”, como Adele. Às negras com vozes negras resta se promover mediante reality shows e aproveitar o pouco espaço ainda existente fora do circuito indie. Esse é o panorama descrito por quem têm aberto a boca contra essa situação, tipo Jazmine Sullivan e K. Michelle.    
Esta última está de volta com o criativamente intitulado More Issues Than Vogue (MITV). Como o antecessor Anybody Wanna Buy a Heart? (resenhado aqui), MITV é composto de R’n’B com produção contemporânea e sem faixa dance. K Michelle é diva dramática, não dançável. A treta com Drake ainda rende e os eu-líricos realmente têm muitas questões, daí o trocadilho do título que aproveita 2 sentidos da palavra “issue”: edição e questão (no sentido de problema).
Em canções com arranjos discretos como Ain’t You e Nightstand (pelo menos em boa parte dela), quem conduz a melodia é a poderosa voz de Michelle, que destroça em baladaças dramáticas como These Men e All I Got. Lentas arrasadoras não faltam, às vezes com pitadas de outros subgêneros, como If it Ain’t Love e sua guitarra country. Em Make The Bed a influência é power pop de matriz africanizada comum nos 80’s. Tem até corinho feminino de oh oh oh no fundo.
Apesar de contemporâneo, o soul de K. Michelle sabe que pertence a tradição muito rica. A abertura de Time parece Philly Soul e Not a Little Bit é sonho black: abre com piano elétrico, segue como R’n’B bem atual pra dali a pouco entrar um coro feminino com o refrão, saído da lavra celeste da época em que Diana Ross duetava com Marvin Gaye, em You Are Everything. Pra apertar repeat, ajoelhar-se e ouvir olhando pro céu.   
Recheado com letras sobre relacionamentos, a exceção fica por conta de Rich, R’n’B ostentação pra essa época onde tantos escondem seu complexo de inferioridade projetando poder mais fingido que real. Pra cantar dando muitos beijinhos nos ombros.


Álbuns como os de Vivian Green, Lizz Wright, Maysa Leak - e hoje esta maravilha da K. Michelle - só provam a sacanagem de privar o mundo de  divulgação pra essas vozes fenomenais. No que depender deste blog, divas negras sempre imperarão!

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