quarta-feira, 11 de março de 2015

CONTANDO A VIDA 101

Nosso cronista-historiador pondera sobre o significado - e a falta de educação - de contatar quem está longe em detrimento de isolar quem está a nosso redor. Crônica muito pertinente nessa épocas de Zap Zap, Fzcebook e o escambau. 


INTERNET E BOA EDUCAÇÃO...

José Carlos Sebe Bom Meihy
São muitas as discussões sobre o impacto da internet na vida moderna. Alguns advogam que se trata de uma revolução operada nos padrões de comunicação, outros defendem que é apenas uma consequência natural de pesquisas que apressam o que estaria em andamento. Muito se tem falado sobre o uso de aparelhos eletrônicos em pesquisas sobre a saúde, educação e lazer. Não faltam os que a aplicam em experimentos artísticos e há os que alertam para um novo vício, algo nocivo por causar dependência. Sabe-se que ainda precisaremos muito tempo para avaliar os efeitos dos aparatos eletrônicos sobre a cultura como um todo, em particular nas formas de contato com pessoas que nos cercam. Por qualquer alternativa ou variação de abordagem, contudo, tem-se como definitiva a presença de vários aparelhos em nossa vida social, política, econômica, cultural e até religiosa. Por vezes nos surpreendemos indagando como pudemos viver sem esses mecanismos, sem computador, internet, celulares, xerox. A chamada modernidade, aliás, está intrinsicamente ligada a tais engenhos e até dói propor reflexões sobre novos critérios de relacionamento humano e ouvir que isso é resultado dos tempos e que quem não se integra no circuito eletrônico é retrógrado, fora de moda...

Entre tantos, um aspecto me perturba enormemente: a interferência nos modos de relacionamento entre pessoas que podem usufruir da companhia de outros, próximos, mas que exercem outra lógica de convívio, evocando os distantes. Sei que alguns autores atentos ao comportamento já escreveram sobre o assunto abordando questões éticas e até de demanda filosófica. É exatamente nesse quesito que quero meter minha colher. Brada-se que há limites para tudo, mas tal assertiva parece não valer para o uso das redes sociais e envio de mensagens instantâneas. Seja em restaurantes, bares, lugares abertos – já vi até em cultos de igreja e enterros – lá estão as pessoas postando imagens, mandando recados, ignorando o significado do momento vivencial. O barateamento dos aparelhos, por certo, vulgarizou o uso que, de maneira absurda, assume condição de afirmação social e se sobrepõe à alegria da convivência. Outro dia, aliás, ouvi perplexo alguém se assustar ao saber que entro no Facebook apenas uma vez por mês, assim mesmo com certa resistência.

Mas vamos ao que interessa e intriga: a ambiguidade de controle dos contatos em espaços cibernéticos. De modo geral, esquece-se de quem está perto e busca-se o ausente num esforço afirmativo de garantir poder por meio da comunicação. Há traços de angústia disfarçada nesse apelo que se impõe ao outro, distante, como se registrasse algum fato notável. E também há desprezo que se mostra como outro lado da moeda, em relação a quem está perto. A vontade de se fazer presente junto a alguém distante atropela o convívio dos próximos. Por vezes, prejudica-se mais ainda a situação, pois quem está ao nosso lado pode ser usado como complemento para envio de fotos e assim se partilham os tais selfies. Pensando em termos de lógica sociológica, vive-se nessas situações uma verdadeira confusão que sobrevaloriza o que não está próximo e perde-se o gozo da companhia imediata. Isso, porém, não é tudo. O que dizer das outras pessoas que estão nas cercanias? Suponhamos uma situação comum: familiares reunidos para uma pizza. A finalidade, além da alimentação, é congregar pessoas, promover o convívio, aproveitar as delícias da fraternidade. O que se nota, porém, é um desprezo aos convivas. E que dizer dos demais que não sendo do círculo imediato são obrigados ao espetáculo triste que implica ouvir mensagens ditas em voz alta ou observar que os olhos dos parceiros estão pregados nos aparelhos em detrimento da troca dos que estão ao lado. Ainda há de chegar a hora em que alguém vai dar um basta nisso tudo e proclamar que a boa educação demanda a renúncia da máquina em favor do afeto imediato. 

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