segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

CAIXA DE MÚSICA 60


O Livro do Genesis – Capítulo VIII


Roberto Rillo Bíscaro

Genesis sem Peter Gabriel era um conceito duro de compreender, nos idos de 1975. Phil Collins, Mike Rutherford, Tony Banks e Steve Hackett não passavam de músicos de apoio pro vocalista, na visão de muitos. Assim, apostava-se no sumiço da banda.
Internamente, os músicos sentiam a pressão de não apenas seguirem sem Peter, mas acharem substituto à altura prum (já) ícone do rock progressivo. Fãs e imprensa estavam mais do que nunca de olho no Genesis.
Conta-se que os testes pra vocalista passaram de 4 centenas. Uma tarde, Phil Collins cantarolou Squonk prum candidato que não acertava de jeito nenhum. (Arrepia imaginar Phil soltando o “like father, like son” inicial…). Naquele momento, a epifania: por que não aproveitar alguém da banda como vocalista? Phil assumira o vocal principal em Nursery Cryme e Selling England By the Pound, além de fazer harmonias e backing vocals pra Gabriel no estúdio e no palco. O timbre dos 2 era parecido e um membro da banda talvez angariasse as simpatias dos fãs mais facilmente do que um forasteiro.
Iniciava-se a “era Collins”, que traria megaestrelato, desprezo dos críticos e cisão entre os fãs. Pergunta comum entre devotos genesianos: você prefere Peter Gabriel ou Phil Collins?. Porém, estamos todavia em 1975 e Collins engatinhava inseguro como líder do grupo.
Em fevereiro de 76, saiu A Trick of the Tail, primeiro álbum da formação Collins-Banks-Rutherford-Hackett e único da fase Collins recebido com generosidade pela imprensa. Ao vivo, muitos fãs responderam bem ao novo vocalista. O baterista-cantor conta que num show no Canadá, um fã vestido com uma das fantasias de Gabriel permaneceu em pé na boca do palco durante metade do show, até indicar que Phil estava aprovado.
Phil não quis competir com a teatralidade fantasiada de Gabriel e optou por uma persona de palco mais brincalhona e próxima ao público. As misteriosas letras gabriélicas cederam lugar a fantasias e tentativas de humor. Não há como negar que as de Peter eram superiores.
Pra bateria nos shows, o Genesis contratou Bill Brufford (ex-Yes) e depois acertou-se com Chester Thompson, que permaneceu décadas com o grupo e com Phil em sua carreira solo. 2 bateras garantiam um duelo instrumental em alguns momentos do espetáculo, que marcou as carreiras do grupo e de Phil. Reconheço: esses duetos deviam funcionar ao vivo; no CD/TV sempre soaram algo enfadonhos após um minuto de bate-panela.
A Trick of the Tail parece sucessor de Selling England e não de The Lamb Lies Down on Broadway, tornando esse último, meio que um álbum “sozinho” na discografia dos caras. Um certo tipo de humor inglês e temas fantásticos, acoplados com instrumentação preciosista, marcam a marcha ré do Genesis.
A responsabilidade do primeiro álbum pós-Gabriel exigia uma faixa de abertura genial, concretizada em Dance on a Volcano. Quase 6 minutos de ritmo crescente com seção rítmica urgente, camadas de guitarras e sintetizadores e um instrumental final de tirar o fôlego de fãs de prog sinfônico: um galope ascendente em direção á cratera. Defeito? Ser curto demais!
Em chaves diferentes, Entangled e Robbery, Assault and Battery mostram a vertente cômica meio nonsense adotada pelos rapazes. A primeira canção é sobre tratamentos psiquiátricos e seus preços exorbitantes. Ao instrumental onírico dominado por cordas da primeira parte, Tony Banks sobrepõe um solo de Mellotron que deve ter sido composto em outra dimensão.
Robbery... é um exercício em humor-negro e múltiplos pontos de vista e entonações vocais, bem ao estilo dos álbuns pré-The Lamb. A letra fala sobre um bandido que se aproveita dos furos do sistema judiciário e o instrumental “pra cima” torna tudo muito irônico. O final, brincando com os canais das caixas de som, é uma maravilha!
Ripples tira a banda do terreno do fantástico e fala sobre o processo de envelhecimento, comparando-o com ondas concêntricas em um lago. A instrumentação entre o folk e o clássico, reproduz o efeito dos círculos. Aos 4 minutos e tanto, um daqueles solos chorados da guitarra de Hackett, que fazem valer a pena estar vivo.
Mad Man Moon é puro Tony Banks com sua letra de conto de fadas e sua instrumentação grandiloquente, com muito piano e mudanças rítmicas e líricas. Uma de minhas favoritas do repertório do Genesis. Amo Tony Banks.
A Trick of the Tail atingiu o terceiro lugar na parada britânica e a turnê mundial tirou o Genesis do vermelho financeiramente.
Era 1976 e a Inglaterra estava prestes a ser sacudida pela rebelião punk de 77, que colocaria o Genesis na posição de “careta”, da qual jamais sairia.  
A Trick of the Tail está inteirinho no You Tube.

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