segunda-feira, 11 de junho de 2018

CAIXA DE MÚSICA 318


Roberto Rillo Bíscaro

Dia 16 de abril, o Brasil perdeu uma de suas sambistas mais tradicionais e queridas, Dona Ivone Lara. Bem nessa época, lia a dissertação de mestrado As transformações na música popular brasileira: um processo de branqueamento, que denuncia a crescente exclusão de músicos afrodescendentes do centro de nossa música popular.
Não posso dizer que curta Carnaval, sambões, escolas de, e provavelmente caia no gosto branqueado denunciado pelo trabalho de Patrícia Crepaldi. Sambinhas “adestrados” com sabor de MPB bem-comportada, Bossa-Nova e algumas aventuras de nossa música-símbolo nacional pelo exterior, como Half a Minute, do Matt Bianco, tudo isso ouço sem problemas.
Curioso, resolvi pesquisar o que havia de novo e grátis nesse mundo e encontrei material interessante e variado. É samba em diversos registros, que compartilho com os leitores.

Quem curte vozes femininas suaves e melodiosas cantando bossa nova e sambas de raiz, de roda, canção e variações, deveria conhecer Andiara Freitas. Nascida no Rio Grande do Norte e atuando pelo Nordeste (mas, não só), desde fins dos anos 1990, Andiara tem dois álbuns.
Em 2014, saiu Samba da Minha Terra, onde interpreta compositores de seu estado natal. Em 2016, seu escopo aumentou e isso se reflete no título: Todos os Sambas. Nesse trabalho, Freitas canta compositores de várias regiões, além de receber convidados.
Os dois trabalhos estão em seu site:



O samba de Douglas Germano é denso e algo soturno, às vezes. Meio neurótico, com letras até sobre acidentes de trabalho. Decerto, porque o batedor de caixa de fósforo (tem nos álbuns) é nascido, criado e formado na megalopolitana São Paulo, onde a pegada é mais tensa mesmo.
Germano já foi gravado por Elza Soares e indicado ao Grammy Latino. Individualmente, tem dois álbuns. Orí é de 2009 e tem batidas João Bosco e Nogueira, influências perceptíveis. Mas, Germano também deve curtir os afrossambas e outros subgêneros.
Isso fica ainda mais evidente no seu segundo solo, Golpe de Vista (2016). Tem hora que evoca flamenco, mas o cerne é samba, mais tenso e nervoso que o do álbum de estreia e temperado com saxofone e trompete, além da amalucada caixa de fósforo e do cavaquinho febril. A produção às vezes equivale a um wall of sound de cordas sambadas.
Em seu site, além desse dois álbuns-solo, você também baixa de graça o de seu Duo Moviola, de 2009. Com Kiko Dinucci, Germano soltou um samba bem paulistano, que casou Adoniran Barbosa com o vanguardismo de Itamar Assunção. Letras bem-humoradas e sacadas. Quem curtia Premeditando o Breque, gostará.



Em 2016, destaquei com prazer o álbum de estreia d’ATroça Harmônica, que também pode ser baixado grátis no site do grupo.
Ano passado, Chico Limeira lançou álbum-solo homônimo. Seus sambas de vários estilos e choros veem com discretos elementos de outros estilos, como guitarra fazendo a vez do bandolim em uma ou outra faixa e órgão meio psicodélico, meio de inferninho “brega”. Nada gritante que altere ou “desfigure” o samba, mas Limeira soube bem como traduzir em samba as tantas influências musicais que rapazes solucionados trazem hoje em dia.
O álbum está disponível aqui para download grátis:



Para os mais aventureiros e vanguardistas, a pedida é o inquietante Sambas do Absurdo (2017), colaboração entre Rodrigo Campos, Juçara Marçal e Gui Amabis. 8 faixas chamadas Absurdo, diferenciadas por um número. Tem hora que o álbum poderia ser descrito como Leila Pinheiro numa bad trip. Só que bad, nesse caso, nada tem a ver com a qualidade da música, letras ou interpretação, que são excelentes. Bad no sentido de que em alguns Absurdos, Campos pulveriza o samba e o infesta com samplers, súbitos barulhos lúgubres, guitarreiros nervosos. Mas, não é barulheira rock: é MPB avant-garde, claustrofóbica, às vezes; doce, outras. De longe, meu favorito nessa pesquisa sambista. Isso não significa que seja o melhor, apenas que como fã de prog rock, talvez isso me soe mais familiar, só isso.
Sambas do Absurdo pode ser baixado na página de Juçara Marçal.

Nenhum comentário:

Postar um comentário