terça-feira, 10 de outubro de 2017

TELINHA QUENTE 280


Roberto Rillo Bíscaro

Nem o fuá cercando a versão fílmica da Mulher Maravilha – seu sucesso de bilheteria e parece que até entre críticos, além do suposto baixo salário recebido pela atriz que interpreta a empoderada – me atiçou a curiosidade em vê-lo. Sequer chequei se as alegações monetárias são verdadeiras ou se a crítica gostou; não sei o nome da atriz. Não me interessa nem em mais remoto âmbito.
Houve época em que o garotinho Roberto Rillo Bíscaro era fã da Mulher Maravilha, porém. Isso por volta de 1977-8, quando a Globo exibia a série, cuja primeira temporada foi originalmente mostrada pela ABC e as segunda e terceira, pela CBS (essa inconstância marca toda a produção). Saber que a super-heroína criada em 1941 por Charles Moulton retornara, deu vontade de rechecar a série.
Os anos 1970 eram propícios pra levar personagem feminina protagônica pras telinhas. Representar/lucrar com o ascendente feminismo estava em alta e a Woman’s Lib felizmente trouxe mulheres fortes e ativas pro cinema e TV. Sitcoms como The Mary Tyler Moore Show, mas também programas de ação como Mulher Biônica, As Panteras e Police Woman. Fenecia a época em que os machos tentavam impedir o poder feminino, como nas sessentistas A Feiticeira e Jeannie é um Gênio. Os 70’s eram a época do não provoque, porque é cor de rosa-choque.
O seriado da Mulher Maravilha, que durou de 1975 a 79, legou atriz eternamente estereotipada como a personagem – a ex-Miss Mundo e futura alcoólatra Lynda Carter – e fez muito sucesso, gerando ícones da cultura pop como a canção-tema (executada com letra apenas na primeira temporada) e o giro pra se transformar de Diana Prince em Wonder Woman (a versão que grudou no imaginário também é a da temporada de estreia).
No Brasil, o sucesso foi tanto que rendeu até paródia no programa Brasil Pandeiro, que Betty Faria comandava, em 1978. Maria Maravilha era a versão pobre da norte-americana. Maria trabalhava numa lanchonete e quando girava e gritava saravá, se metamorfoseava na super-heroína. Eu lembrava de Maria Maravilha, mas não do Brasil Pandeiro, mas pra quem nem faz ideia do que escrevo, veja trecho: 

Não dá pra caçoar muito do mambembismo da produção global, que afinal, era sátira. O original norte-americano, que se queria sério, é difícil de recomendar pra jovens e crianças atuais: mambembice de primeiro mundo, mas gambiarra pura na maioria das vezes. Claro que não revisito esses shows em busca de reproduzir emoções vividas na época da exibição – eu tinha 10 anos, se conseguisse tê-las de novo, precisaria recorrer a um terapeuta urgentemente. Vejo-os, porque me interessam programas antigos, que podem ser bons, veja o caso de The Streets Of San Francisco. Mas, Mulher-Maravilha não era a não ser pela temporada inicial, que ainda tentava ser mais quadrinhos e tem o charme de ser durante a Segunda Guerra. Faltava grana pra produção – continua irrecomendável pra jovens – mas tinha seu charme. As outras 2 são bem pobres.
A temporada 1 chamou-se Wonder Woman e nela vemos a partida da super-heroína da Ilha Paraíso, sua chegada a e adaptação em Washington e sua parceria protetiva com Steve Trevor pra lutar contra o perigo nazista. Não é à toa que o giro e a canção-tema lembrados sejam os dessa época; eu mesmo não recordava de nada das demais temporadas, mas lembrava até do nome duma coadjuvante, chamada Beatrice Colen. Sabe aquele lance de ver a imagem e pensar, “nossa, é mesmo!”? Assim que aconteceu, quando vi seu nome dentro da estrelinha da animação na introdução.
O it (lembram quando isso era sinônimo pra charme?) é que os episódios não escondem que são quadrinescos; tem até aquelas legendas amarelas, tipo “mais tarde, no QG de não sei onde”. A interação entre Diana e Steve é bem mais fluida, de vez em quando aparece o Jato Invisível, cujo teto é tão baixo que quase bate na cabeça da Mulher-Maravilha e tem música de elevador como trilha-sonora e em um par de episódios as Amazonas, inclusive sua irmã Drusilla, a hoje esquecida, mas então estreante Debra Winger. É bem cult, mas as audiências de hoje provavelmente se suicidariam por tédio, porque a heroína aparece por uns 10 minutos num episódio de mais de 40. O resto é tudo falação e quando chegam as cenas de ação, amador pra cacete. As coreografias de lutas com Carter ou seu dublê eram pobres de doer.TV há 40 anos não era Netflix ou HBO: geralmente era pra fins de carreira, inícios a serem “esquecidos” ou relembrados com ironia divertida, ou pra quem não tinha talento/contatos pra entrar em Hollywood. Então, orçamentos eram parcos, porque a visão dos canais e produtoras era mesmo produzir entretenimento barato pra ser exibido entre o que realmente interessava, os anúncios.
As 2 temporadas seguintes chamaram-se The New Adventures Of Wonder Woman, porque o estúdio decidiu remaquiar o show por completo, que agora se passava na contemporaneidade e tinha Diana Prince trabalhando como agente governamental da IADC, que supostamente tinha a função de resolver casos de alta prioridade. Más (será?) línguas dizem que o estrelato subiu demais à cabecinha linda de Lynda Carter, que exigiu menos espaço a seu colega Lyle Waggoner. Ele nunca confirmou o rumor, mas num documentário que acompanha o DVD da série completa, Linda lamenta não o ter “conhecido melhor”, por falta de tempo (ô dó!). Ele não aparece em nenhuma das featuretes que bonificaram a box-set da Mulher Maravilha. Fato é que depois da temporada primeira, Steve Trevor aparece e faz cada vez menos. Pra explicar a presença do mesmo rosto 30 anos após a Segunda Guerra, improvisaram que esse Steve Trevor era o Júnior. Será que se filmada hoje, dariam o papel de galã prum ator de 40 anos não-bombado?
À falta de recursos e pobreza coreográfica somou-se total ausência de rumo. As temporadas são amostras públicas de produtores procurando um tom pro show, ou antes, tentando erraticamente adaptar a Mulher Maravilha à alguma fórmula ou trejeito de sucesso. Tem grupo de episódios, onde Diana e Steve se reúnem numa sala com um chefe invisível, à moda das Panteras; em outros há um robozinho engraçadinho (poooooodre!) à Guerra Nas Estrelas; há um em que parece que nova roupagem será vestida, porque Diana se muda pra Los Angeles e novo chefe é apresentado (o ator é gordinho, nada galã como Waggoner; más línguas, dona Lynda Carter?) e um garotinho negro desponta como alívio cômico, tudo pra que no episódio seguinte ela siga vivendo na capital estadunidense.

A despeito das tramas fracas e mediocridade geral, Mulher Maravilha tem na simpatia de Lynda Carter seu trunfo pra nós que aprendemos a amá-la na meninice. Desindicado pra juventude atual, mas como viagem memorial pra 50tões, episódios da Wonder Woman ainda valem a pena. Mas, tem que ser aos poucos.

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