terça-feira, 4 de outubro de 2016

TELINHA QUENTE 232


Roberto Rillo Bíscaro

Ano passado deu vontade de rever um vilão de desenho animado da infância, chamado Mandarim. Pelo que recordava, ele usava um monte de anéis, que disparavam diversos tipos de raios. Associava a personagem ao Homem-Aranha, daí baixei os episódios da versão que a TV brasuca exibiu, quando eu era pivete, cuja única qualidade redentora hoje é o suingado tema de abertura.
Depois de tudo assistido, toquei-me que Mandarim não era inimigo de Spidey, porque não apareceu em episódio algum. Mas, daí tinha despertado desejo de ver outras adaptações animadas do aracnídeo na telinha. Foi legal, porque comparei perfis alterados de personagens fixos; vi como diferentes roteiristas interpretam o surgimento de vilões. Por exemplo, Electro e Dr. Octopus estão em praticamente todas adaptações, mas as circunstâncias de sua gênese variam, sem falar na aparência, modificada pela tecnologia, desenhista, tendência visual da época de produção.
Mandarim deve ser inimigo do Homem de Ferro. Quem sabe uma hora dessas eu não reveja aquelas animações toscas dos 60’s? Por ora, impressões de cada adaptação assistida.

Não poderia deixar de começar com a animação exibida pela rede ABC, entre 1967 e 1970, que via quando criança e cuja trilha de abertura ainda é a favorita dentre as que conheci e cantarolada de quando em vez. 52 episódios foram produzidos e, como no resto das adaptações, não sei se assisti a todos, mas vi número suficientemente volumoso de todas pra amostragem.
Nos episódios iniciais, há a presença dos inimigos clássicos e, claro, o episódio explicativo da origem radioativa do incompreendido herói. A mídia, na figura incisiva de J. Jonah Jameson, vende a imagem do Homem Aranha como inimigo do povo, mesmo que o dono do Daily Buggle tenha repetidas comprovações do contrário. Sabedor do heroísmo, Jameson insiste em publicar a sua opinião, distorcendo fatos. Há gerações convivendo com essa personagem, como as pessoas ainda acham que a imprensa é imparcial?
No meio da série, mudou muita coisa. A animação, no começo mais clean, estourou em psicodélicos tons fortes; céus verdes e laranjas gritando. Como o orçamento devia ser ínfimo, percebe-se o reaproveitamento de tomadas, então, numa cena o Aranha cruza a cidade sob sereno céu azul clarinho, pra na seguinte ter no fundo um céu ameaçadora e enjoativamente estourado de cor. Spiderman desloca-se entre os edifícios em uma Nova York deserta pra facilitar o desenho e diminuir custos. E quão demorados esses deslocamentos! Também pra poupar, pois utilizava-se a mesma footage em n episódios. Hoje enche o saco, mas na infância dava vontade de sair soltando teia como Spiderman. Quando os vilões clássicos deixam de aparecer e foca-se mais na vida escolar de Peter Parker, as histórias ficam ainda mais fracas.
Imagine que dá pra recomendar pra moçada atual, um desenho duma época que o fato de ser em cores ainda era destacado na abertura! Só pra museu mesmo. Mas, a trilha sonora ainda é um gozo.

Entre 78-79, a CBS exibiu 2 temporadas de The Amazing Spider-Man, constituídas de 11 episódios e 3 filmes de longa-metragem (um amigo contou que pelo menos um foi exibido nos cinemas brasileiros). Com a pequenez dos orçamentos televisivos da época e a precariedade dos efeitos especiais, nem dá pra cogitar indicar isso pra petizada. Muita falação, pouca ação em lutas mal coreografadas. De 45 minutos de exibição, uns 7 são de ação. Um sujeito fantasiado que anda esquisito por telhados e atira sua teia-rede sempre com o mesmo fundo, não importa o episódio. 
Pra saudosistas, garimpeiros vintage e quem tinha 10 anos na época, pode valer a pena, embora pra essa última categoria recomenda-se cuidado pra não destruir idealizações mnemônicas infantis. Com certo saco, é legal ouvir a trilha-sonora disco funk (dá pra ouvir no Youtube) e ver fisionomias ubíquas nos 70’s/80’s, como Lloyd Bochner, o Cecil Colby, de Dynasty. Também tem uma jovem Madeline Stowe coadjuvando quase como figurante. Menções a celebridades como Ruodlf Nureyev e Evel Knivel e à greve dos lixeiros e bancarrota de Nova York. Mas, mesmo esse apelo é restrito.

Muito, mas muito mais divertida – imperdível – é uma adaptação da TV japonesa, também com atores, que rolou no mesmo ano da sensaboria ianque. Consegui ver uma dúzia de episódios com legenda em inglês e ri horrores. Um astroarqueólogo (adoro!) descobre uma nave alienígena do planeta Spider, mas é morto e daí seu filho recebe os poderes das aranhas ETs pra vingar a morte do genitor e proteger o planeta do Exército do Mal, comandado pelo Professor Monster e capitaneado pela maleficamente sexy (SQN) Amazoness. Da trilha-sonora ao nonsense das histórias, o Homem-Aranha nipônico encantaria Quentin Tarantino. Tem coreografia com repetição de movimentos, os episódios são mais curtos, têm mais ação, e robôs gigantes. Clarooooo, é uma mistura do herói da Marvel com Ultraman. Ao final de todo episódio, o monstro se agiganta e o aracnídeo grita “Marveler” e aparece uma nave e quando ele grita “change, Leopardon!” ela se transforma em robô gigante e facilmente destrói o oponente com a mesma sequência de armas, cada uma lançada após o grito de comando de Spiderman. Amo quando ele grita “spider strings!’ ou ‘spider net!’ (pronunciado neto, lógico, por causa da diferença da fonética inglesa e japonesa) e os movimentos dramáticos de mão/braços acompanhando alguns dos comandos. Recomendo, recomendo, recomendo!

De 1981 a 1983, a NBC exibiu os 24 episódios do desenho Spiderman And His Amazing Friends. Nada marcante, a série traz o Aranha contracenando com o Homem de Gelo e a Estrela de Fogo, cada um, inclusive, tem um episódio dedicado a sua origem. Mais bem humorado do que a versão de 67, tem trilha sonora influenciada por disco music, o tipo de animação lembra a dos Superamigos e já incorpora elementos como vídeo games em uma das tramas, quando um vilão de game, da época em que os gráficos eram superangulosos, ganha vida e as personagens até entram no PC. Considerando-se que o Tron original é de 1982, deixo a um garimpeiro descobrir quem inspirou quem.
Vários heróis da Marvel aparecem, como Hulk, Namor (esse numa história parafraseando O Caso dos 10 Negrinhos, com rimas e tudo), além de várias referências e aparições dos X-Men, com o Dr. Savier e tudo. Vale a pena pra 40tões em diante.
Nos 80’s e começo dos 90’s, parece que o Homem-Aranha não esteve de moda, porque a próxima encarnação animada veio na Fox Kids, em 1994, durando até 98, num total de 65 episódios. Em termos dramáticos, de longe minha animação favorita. Tristíssimo com histórias complexas que se estendem por episódios e as temporadas têm ligação como numa série, embora dê pra ver os episódios separadamente. Herói torturado, com algumas tiradas cômicas, mas a tônica é dramática. A música de Peter e Mary Jane entrou pro meu repertório de assovios. A abertura é aqueles rocks sanitarizados à Melrose Place, que emporcalharam os 90’s, porém. Além de tudo, há interpretações marcantes como Ed Asner (o Lu Grant, de Mary Tyler Moore) dublando J. Jonah Jameson. Muito tudo demais.

Em 2003, a MTV lançou o fracassado Spider-Man: The New Animated Series, que durou apenas 13 episódios. Tema de abertura techno, uniforme salpicado de branco pra dar ideia de animação por computação e no conjunto nada que tenha me deixado entusiasmado, mas também nada que tenha odiado.

Em 2008, o canal The CW estreou as 2 temporadas de The Spectacular Spider-Man, que totalizou 26 episódios. Não gostei da animação, simplória demais. O tema de abertura pós-grunge também não me disse nada. Uma das poucas coisas que aprecieei, foi saber porque J. Jonah Jameson detesta tanto o Homem-Aranha.

Em 2012, o Disney Channel lançou seu Ultimate Spider-Man, que teve 4 temporadas, ao que tudo indica. Na era da qualidade total e dos incontáveis cursos de programação neurolinguística pra melhor produção, o adolescente Peter Parker já não se desenvolve sozinho, mas é convidado a treinar com uma equipe de aprendizes de super-herói da SHIELD
Foi muito instrutivo acompanhar o desenvolvimento da animação e da construção de diálogos e personagens ao longo de décadas do Aranha nas telas. Ultimate transborda daquela ironia e das olhadas pra câmera com comentários autodepreciativos; Spidey é metralhadora de one-liners. Como alguém em sã consciência pode dizer que “antigamente era melhor”? Tudo era tão tosco comparado às ótimas sacadas dessa versão. 
A linguagem é cheia de referências a subgêneros pop em diversas áreas, usam-se diferentes tipos de animação/ambientação, até found footage film. Séries e videogames informam muito do enredo e animação: há continuidade entre histórias, embora os episódios sejam independentes e as imagens desenrolam-se céleres, pra agradar a geração que passa horas combatendo nas telinhas, agora lonas e já viu de tudo (mediada pela segurança das telas, claro).

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