domingo, 11 de dezembro de 2011

HORROR E ESPERANÇA NA TANZÂNIA


O Feitiço do Albino
(Tradução: Roberto Rillo Bíscaro)
Feiticeiro tanzaniano denunciado, quando um de nossos jornalistas, disfarçado como homem de negócios, confronta-o por usar partes de corpos de crianças albinas em rituais
Anas Aremeyaw Anas, direto do norte da Tanzânia, com material adicional de Claudio Von Planta (Reino Unido) e Richard Mgamba (Tanzânia).
Tudo aconteceu num piscar de olhos. Adam, 11, acabara de jantar com seu pai e um amigo da família. Quando Adam ia lavar as mãos, o homem o agarrou, pegou uma machado e começou a decepar os dedos do menino. Adam gritou por socorro, mas seu pai e sua madrasta apenas acompanharam com o olhar, enquanto o homem arrastava o garoto em direção a um suporte de madeira, a fim de facilitar o corte. No fim, Adam havia perdido 3 dedos.    
Após o ataque, o pai e a madrasta se sentaram, sem sequer cogitar em chamar um médico. Os gritos de Adam encheram a cabana por 3 horas, até que sua irmã Christina chegou com uma lanterna e viu seu irmão contorcendo-se de dor. Ela acionou os médicos e ajudou a levar o irmão ao hospital. Além do trauma físico e emocional, exames de raio-x constataram que o braço da criança estava quebrado.
Naquela mesma semana, Kurwa, uma albino de 16 anos, teve 80% de seu braço serrado, logo após o jantar. Sua família estava dentro de casa quando escutaram os berros. Diferentemente da família de Adam, seu pai aventurou-se para for a da cabana para protegê-la e sofreu ferimentos ao ser golpeado com uma enxada pelos agressores. “Isso é muito triste”, lamenta o médico Leonard Subi. “Isto é inaceitável, pois todo ser humano tem direito á vida.”  
Essas são apenas as barbaridades mais recentes contra albinos, na região de Geita, no norte da Tanzânia, um local onde a feitiçaria tomou conta de comunidades inteiras, levando á crença generalizada de que possuir ossos de uma pessoa albina pode aumentar fortunas pessoais.    
Investigações feitas pelo repórter Anas Aremeyaw Anas revelaram graves violações aos direitos humanos perpetradas contra albinos em algumas partes da Tanzânia.
“Estou muito triste”, disse Isaack Timothy, um albino que acompanhou a recuperação de Adam e Kurwa, tão logo ouviu as notícias. Quase aos prantos, ele continuou:”Essa feitiçaria está nos conduzindo a um ponto muito perigoso. Estamos começando a matar-nos uns aos outros sem motivo.”
Anas Aremeyaw Anas disfarçou-se para expor alguns desses feiticeiros e os motivos por trás desses atos de ódio contra albinos na Tanzânia e outras partes da África Oriental. 
Curandeiro: “Compramos [os ossos] de Jovens”
“Compramos de jovens”, revelou o curandeiro Mashala Deus, acerca dos ossos de albinos que ele pulveriza para depois adicionar a ervas medicinais, na tentativa de alavancar o sucesso dos clientes. Ele diz que achar partes de albinos é muito difícil, “por isso temos pessoas que as compram”. Deus é reverenciado como tale m sua aldeia, porque se acredita que ele herdou poderes místicos de seus avós.

“Por favor, não. Por favor. Por favor, pai”, contorce-se Deus em sua cadeira, pálido e tremendo de medo. Seus apelos seguiram a confrontação com uma prótese de braço albino, o qual julgou ser real. “Sinto muito”, suplicou mais alto.     
“Sente muito pelo quê?”, perguntou Anas, enquanto mantinha a réplica de braço em tamanho natural perto de Deus. 
Antes da prótese ser mostrada, Deus passara quase 30 minutos tentando vender sua magia negra, que envolvia partes de corpos de crianças albinas. E agora, lá estava ele, fingindo arrependimento.
 “Eu vou parar”, afirmou.
“Você pararia de incitar a matança de albinos?!”
“Definitivamente.”
Crianças tanzanianas frequentemente ouvem histórias de que crianças albinas jamais morrem e, conforme crescem, simplesmente desaparecerão em determinada época. Tais idéias propagandísticas acerca dessa população marginalizada são frequentemente invocadas por feiticeiros como Deus, cujas histórias fraudulentas determinam a indústria da venda de partes de corpos albinos.  
Os 3 homens presos após o ataque a Adam eram curandeiros: o pai de Adam, um homem chamado Jesus, e um terceiro que recentemente atraia uma multidão de gente querendo ler a sorte. “Talvez seja a pobreza”, especula Timothy, a respeito dos motives dos compradores, “mas, que tipo de pobreza faz pais venderem seus filhos?”
Albinos: O negócio que mais cresce na Tanzânia?
Na Tanzânia, partes de corpos de albinos são uma mina de ouro. Um conjunto completo de partes – incluindo braços, pernas, genitália, orelhas, língua e nariz – pode custar US$75,000. O surgimento do uso de partes de corpos albinos como amuletos de boa sorte é resultado da propaganda de curandeiros, que advogam o mito de que poções espirituais feitas com esses corpos trazem boa sorte. Isso aumentou a procura entre compradores ricos, colocando as vidas dos albinos tanzanianos em perigo.  
A resposta para o questionamento de Timothy encontra-se parcialmente também no aumento da produção de ouro do país, que é o terceiro maior produtor do continente. De acordo com um relatório do Banco Central, de setembro deste ano, as exportações do minério cresceram de $1.5 bilhão em 2010 para $1.7 bilhões em 2011. “Pequenos garimpeiros”, explicou Timothy, “ acreditam na bruxaria de usar partes de albinos. Eles levam ossos para as minas, porque consideram-nos amuletos de boa sorte, que os tornarão ricos.
“É verdade”, confirmou um garimpeiro, que trabalha perto de Geita. “Ouvi essas coisas de um velho sábio.” Quando perguntado se compraria ossos, sua resposta foi rápida”; “Claro!”
Desde 2008, 62 albinos tornaram-se vítimas dessas matanças, que se tornaram comuns na Tanzânia. Adam e Kurwa estão entre os 16 albinos que foram desmembrados,; enquanto os corpos de 12 foram retirados de seus túmulos para a desumana prática da remoção de partes de seus corpos para venda.
Não Brinque ao Sol  
Desde o nascimento, a maioria dos albinos apresentam uma série de problemas. Formalmente conhecido como Albinismo oculocutâneo (OCA), essa disfunção genetica é causada pela inabilidade do corpo em produzir e distribuir melanina, que é a substância que dá cor à pele, cabelo e olhos. Em suas formas mais agudas, o OCA pode gerar câncer de pele e problemas nos olhos.
A edição de janeiro de 2011, do Dermatalogic Clinics Journal trouxe artigo intitulado “Albinismo na África: estigma, assassinato e campanhas de esclarecimento”, que detalhou a prevalência do OCA. Na maioria das populações, 1 em cada 20.000 pessoas vive com o OCA. Essa taxa é significativamente mais alta na África sub-saariana. Na Tanzânia, 1 em cada 1.429 pessoas apresentam a característica.
Albinios tanzanianos enfrentam grandes desafios. Embora relatórios recentes sejam mais otimistas, 98% dos albinos no país não atingem os 40 anos. Não existe cura para o OCA e tudo o que os centros de tratamento fazem é proteger os albinos dos raios solares, tarefa muito difícil em um continente onde a potência do sol é enorme e o custo de bloqueador solar pode ser proibitivo.   
Emprego – componente crucial para a habilidade de pagar por tratamento – pode também ser um transtorno. A maioria dos albinos está desempregada, pois enfrentam discriminação por parte dos empregadores. Albinos africanos relatam exemplos de terem ouvido que sua presença como empregados poderia sujar a reputação da empresa, mesmo a despeito de suas credenciais educacionais. Quando têm sorte bastante para arranjar emprego, este pode ser de alto risco para sua saúde. Estudo recente indicou que 96% dos albinos empregados trabalham ao ar-livre, correndo graves riscos de saúde. Entretanto, mais perigoso do que o sol escaldante é o machado do caçador.
Acabando com o Genocídio Albino
Apesar das atroocidades que os albinos tanzanianos enfrentam, há alguma esperança, a julgar pelo papel agressivo da polícia nos casos mais recentes. No caso de Adam, todos os envolvidos foram levados a julgamento. O veredicto é incerto, mas as evidências são inegáveis.
“Todo mundo na aldeia viu que Robert Tangawizi tinha vendido seu filho,” relatou Paulo Kasebago, Chefe de Polícia. “Ele tentava dar respostas evasivas, esquivando-se. Não fazia sentido.”
O própria avó de Adam dá seu veredicto:”Não acho que sejam inocentes. Eles vieram para matar. Ouvir que meu neto está se recuperando bem, encheu-me de esperança.” A mulher fez um apelo: “ajude-nos a achar um local seguro para meu neto.”
Tudo indica que organizações como a Cruz Vermelha têm tentado fazer isso, construindo abrigos para albinos fugidos de casa devido a ameaças contra suas vidas. A escola de Educação Especial Kabanga abriga mais de 50 crianças albinas, juntamente com suas mães.  
Enquanto algumas organizações montam casas-abrigo, outras propuseram soluções diferentes. No Quênia, surgiu a idéia de guarda-costas para albinos. O gov erno tanzaniano não tem sido indiferente à guerra contra os albinos. Mês passado, o Primeiro Ministro Mizengo Pinda anunciou que 8 mercenários foram condenados à morte pelo assassinato de albinos.
O combate mais enérgico tem que ser contra os curandeiros, que conseguiram conquistar os corações e mentes do cidadão médio, alimentando o que o grupo de defesa dos direitos dos albinos Asante Mariamu, considera “uma forma of genocídio.” Talvez a condenação pela qual Isaack Timothy esteja mais ansioso seja a do curandeiro da cidade. “Não há como a justiça deixá-lo em liberdade, quando ele mesmo admitiu estar envolvido. Estou realmente muito contente com essa investigação”, concluiu Timothy. “Que continue.”

Um comentário:

  1. Nossa que tristeza. A ignorância e a crueldade de alguns "seres humanos" é algo assustador. Que Deus abençoe e ilumine essas pessoas que sofrem com essa porcaria de feitiçaria.

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