quarta-feira, 10 de agosto de 2016

CONTANDO A VIDA 158

Nas cercanias do Dia dos Pais, nosso historiador-cronista-pai-avô pergunta-se, afinal, quando um homem torna-se pai. Basta ter um filho ou é preciso algo mais?

MAS, QUANDO NASCE O PAI EM UM HOMEM?

José Carlos Sebe Bom Meihy

Foi com essa frase que resolvi pensar na melhor maneira de reverenciar o dia dos pais, aliás passagem toda diz o seguinte: “um homem se torna pai quando seu filho nasce, ao menos é o que a sociedade reconhece. Mas, quando nasce o pai em um homem? Será que esses dois momentos estão juntos?”. Nem sei dizer de onde tirei a citação, apenas lembro-me que tanto ela me tocou que a selecionei para um dia meditar sobre. E o momento chegou. Carregado de emoções...

Tenho repetido que em minha vida há duas datas capitais: o dia dos professores e o dos pais. Por lógico, não saúdo o dia dos professores como se fora celebração profissional, atividade prática de frequentar escola, ou reconhecimento pelo papel dos mestres na formação de seus alunos. Não. Não mesmo. Percebo no dia dos professores o respeito que me dou como tal, como cidadão que vê em sua escolha uma opção de vida repartida na vivência de gerações. Nunca quis ser outra coisa que não professor. Então, o dia dedicado aos mestres me é muito mais do que destaque projetado pelos outros, ou mesmo pelos próprios filhos. É como se me fosse dado um espelho e nele me vise da maneira mais plena, humana e completa e correta. De certa forma, isso se repete quando contemplo meu papel de pai. O dia dos pais, para mim, não é apenas efeméride marcada por um dia no calendário que assinala encontro com o reconhecimento público da data. Nada disso. Outra vez, me olho especularmente no cenário da existência que me é dada e me percebo parte de uma corrente que captura o sagrado que existe no masculino. Falo de transcendência, pois. E há muita poesia nisso. Foi exatamente por esta certeza que mergulhei na frase que questiona o momento do nascimento da paternidade, além do dia do nascimento do primeiro filho. E me pergunto: desde quando resolvi que seria pai? A profundidade evocada como resposta me leva ao infinito de mim mesmo. E adivinho sonhos que se materializaram desde a infância. Como sempre quis ser professor, sempre quis ser pai.

A confidência da anterioridade do feito paterno exige explicações. Tive um pai adorável: alegre, trabalhador incansável, conversador, dono de uma história irresistível, cheio de defeitos que nele eram graça. Ah! como gostava de vê-lo seduzindo fregueses na loja – “O turco do mercado” cantou Renato Teixeira sobre ele – e como suas paixões complementavam aquele personagem que caberia em romances a serem escritos! Certamente, desde pequeno quis roubar-lhe o fogo de ser. Tive que derivar escolhas, porém, e acho que consegui algumas, embora tantas sejam minhas falhas. Sem dúvida, a generosidade foi o dote que mais pretendi reproduzir. E também o amor pelos filhos. Mas não é qualquer amor, desses naturais. Meu pai viveu comigo o amor irrestrito. Rebelde que fui, talvez por isso, ele sustentou os meus arroubos. Todos; inclusive e principalmente, aqueles que iam diretamente contra seus preceitos políticos. Acho que foi exatamente aí que resolvi que queria ser pai. E assim se fez. O nascimento de meus filhos, portanto não me fez pai. Eu já o era muito antes.


A consciência da paternidade lida com muitas coisas e se articula de forma misteriosa à complexidade da vida. Se me perguntassem qual o momento mais pleno dessa experiência, diria sem muito titubear: é perceber meus filhos, pais. Falo, portanto de netos – biológicos ou assumidos – e vejo que a paternidade é virtuosa pelas consequências filtradas no sentir-se pai. Pai, filho, pai: triângulo perfeito de vértices amorosos. Aliás, com isso respondo a segunda parte da frase que serve de mote para reflexão: será que esses dois momentos estão juntos? E com a soberania de quem olha o próprio passado, respondo que não obrigatoriamente. Há pais que nascem pais. Acho que sou desses.

Nenhum comentário:

Postar um comentário