terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

TELINHA QUENTE 346

Roberto Rillo Bíscaro

West Wing terminou há bastantes anos, mas sua influência segue inspirando realizadores. Da Dinamarca veio a superior Borgen e da França, as três temporadas de seis capítulos cada de Les Hommes de l'ombre (2012-16).
Mais sexualmente desinibida do que sua matriz estadunidense, Spin, como conhecida internacionalmente, é maratonante suspense sobre políticos, onde estes chegam a ser secundários em relação a seus consultores de imagem e relações públicas.
Os Homens da Sombra, tradução livre do título, são Simon Kapita e Ludovic Desmeuze, marqueteiros da agência mais influente de Paris. Kapita treinara Desmeuze antes de ir-se a Nova York, de onde retorna às pressas pra capital francesa, quando convocado a ajudar a presidência a manejar a crise desencadeada por atentado contra o presidente. Acontece que Ludo quer o pedaço só pra ele e, freudianamente, precisa eliminar o pai, então inicia-se batalha entre ambos.
Les Hommes de l'ombre indica seu falocentrismo já no nome. Política e alto poder são brinquedos de meninos-machos. Mulheres são boas pra cama e quando ativas são bitches, como diriam Alexis Carrington e Bette Davis.
Ao longo das temporadas, o teor político escandaloso sobrepuja o duelo freudiano e a batalha KapitaxDesmeuze é ofuscada por coisas muito mais estimulantes, como infidelidade conjugal, atentados de radicais islâmicos e/ou de direita, homossexualidade reprimida, primeira-dama bipolar, jornalista teimosa se metendo numa enrascada trás d’outra.
Políticos de direita e esquerda indistintamente jogam sujo e os dois lados são exibidos como interdependentes. É como se o poder por si só corrompesse; a ele é atribuído essa caráter absoluto, transcendental e eterno. Nesse sentido, Les Hommes de l'ombre justifica o discurso de que todo político é igual, convenientemente sacada quando seu político de estimação está em beco indefensável, mas não se quer reconhecer, apenas generalizar pra poder justificar sua escolha.
Para gerar interesse, esse tipo de série “política” não pode se debruçar em decisões e ações que realmente mostrem o lado vital das políticas públicas – exceto Borgen, de vez em quando, e por isso é tão cotada. Queremos ver grandes dilemas internacionais ou becos-sem-saída internos, experimentados por gente bem-vestida e poderosa, capaz de mudar destinos de multidões com simples telefonema ou promessa de apoio em votação. Ou, mais deliciosamente ainda, chantageando sem vergonha ou dó.
Isso tudo não desmerece Les Hommes de l'ombre. Pelo contrário, devorei gulosamente e sou fã do presidente Alain Marjorie e da primeira-dama aloucada Elizabeth, chiquééeéééérrima. Só há que reconhecer que na categoria thriller político em que se classifica, a ênfase está no primeiro termo. Sobre Scandal, Obama disse que seus dias eram bem mais tediosos do que os de Cyrus e Mellie, na Casa Branca. A rotina no Elyyse também deve ser bem menos visceral do que em Spin. Por isso, preferimos as séries.

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