segunda-feira, 23 de abril de 2018

CAIXA DE MÚSICA 311


Roberto Rillo Bíscaro

Duas de minhas canções pop brasileiras favoritas são Superafim e Meeting Paris Hilton, do Cansei de Ser Sexy. Antenados devem se lembrar de quando a banda paulistana era hipster, tendo seus álbuns resenhados em publicações como Pitchfork e Consequence Of Sound, excursionando pelo mundo e até entrando no Top 100 da Billboard.
Tudo ia colorido no mundo new rave até que Adriano Cintra anunciou sua saída, em 2011, e abriu a boca do esgoto: não suportava mais o estrelismo e falta de perícia musical das companheiras do CSS, além de lembrar aos sabe-nada-inocentes que banda é empresa, com salário e até licença-saúde, que o empresário pode encasquetar de não pagar, daí tem que ir pro pau, como qualquer trabalhador mortal.
Não é segredo pros leitores que meu mundo é mais de rock progressivo e soul music, então, sei que Cintra formou o Madrid, mas perdi tudo de vista. Pra escrever isso, descobri que o CSS parece congelado no âmbar, mas Madri continua sendo a capital espanhola.
Encontrei-me com a carreira-solo de Cintra, quando baixei o álbum Nine Times, lançado em agosto do ano passado. Li que havia alguma influência anos 80 e isso me interessou, porque leitores também sabem o que representa pra mim aquela década.
Embora não soe datado, pois Adriano deve beber em fontes eletro euroianques de sua geração, o homogêneo Nine Times não é nada alienígena a ouvidos oitentistas. Há sonoros quês de The Cure e Depeche Mode nos arranjos sóbrios e discretos dum álbum que prioriza lentas (Collateral Damage) e midtempos. A única dançável é o encerramento Mouth, cuja vibe agradará tanto à geração pós-rave, quanto dinossauros fãs da boa e velha New Order.
Cintra tem ouvido ótimo pra compor pops grudentos, como a deliciosa faixa-título e a maior parte do álbum. Ele meio que faz um mea culpa pelo bafão armado com suas ex-amigas, em So Sorry e em Your Crazy Eyes contrasta o gelo de teclados com a brasa lúgubre dum baixo gótico. Mesmo lá pelo final do álbum, que tem 13 faixas, quando a mesmice ameaça, as canções são simpáticas, como Nevermind Me e Backfiring.
Não há maus momentos em Nine Times, outra de muitas provas de que a música do Brasil (mesmo que toda cantada em inglês) está longe de se restringir à sofrência ou arroubos de macheza alcoolizada, que toca nas rádios.
E também não tem como dizê-la inacessível, posto estar disponível de graça, no site de Adriano Cintra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário