quinta-feira, 5 de maio de 2016

TELONA QUENTE 157

Roberto Rillo Bíscaro

Nos anos 50, a Suécia tinha um instituto que testava produtos e estudava modos de racionalizar e otimizar o tempo/trabalho das donas de casa. A ideia era dispor os aparelhos e utensílios de modo a poupar caminhadas e esforços, enfim, tornar a atividade doméstica mais “científica ‘ (e controlada, mas isso é melhor não mencionar).
Em 2003, o diretor norueguês Bent Hamer imaginou esses estudos sendo feitos entre o grande número de campesinos solteiros de seu país. O resultado é o discreto, simpático, bem filmado e tocante Salmer fra Kjøkkenet.
O sueco Folke é designado pra investigar os hábitos de cozinha do norueguês Isak, que se voluntariara pro programa, porque lhe prometeram (enganosamente) um cavalo. Arrependido de abrir sua intimidade ao estrangeiro, Isak começa por sabotar o trabalho de Folke, que segundo os princípios positivistas do estudo não podia interagir com seu “objeto” de pesquisa em nome de suposta objetividade e observava Isak do alto duma cadeira de grandes pernas.
Há mais em jogo em Salmer fra Kjøkkenet do que atacar o Positivismo, porém.  O filme alude a feridas e rusgas da região, como o colaboracionismo sueco com os nazistas, enquanto a pobre Noruega se ferrava com a ocupação nazi.
Mas, não é necessário saber nada disso ou esperar que a película lave roupa suja  escandinava. Salmer fra Kjøkkenet é adorável estudo entre o cômico e o dramático da solidão humana e a busca por companhia.
Pouco a pouco, Isak e Folke superam barreiras culturais e bobagens pseudocientíficas pra se tornarem amigos. A história de amor dos 2 – nada a ver com erotismo, é fraternidade – começa sem palavras e prossegue com revelações que marcam não apenas as diferenças, mas as semelhanças entre esses 2 homens cercados por natureza e neve em países onde a socialização parece não muito fácil. E tem até ciúmes de amigo que se sente excluído, no caso Grant, interpretado por Bjorn Floberg, velho conhecido dos leitores do blog, da série de filmes de Varg Veum.
O primeiro ato é bem esparso em diálogos e o tom de comédia é escandinavo, ou seja, bem discreto. Como não há histrionismo ou musiquinha incidental nos controlando pra quando rir, Salmer fra Kjøkkenet pode nem passar por uma, mas uma coisa o filme fará o espectador perceber: o calor humano em meio ao campo nevado da Noruega. Fofíssimo; guardei o arquivo pra ver de novo. 

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