quinta-feira, 21 de maio de 2015

TELONA QUENTE 119

Roberto Rillo Bíscaro

Em agosto de 2014, fiz dobradinha de cine islandês (leia aqui). Resolvi fazer outra, desta vez reduzindo ainda mais o foco: são 2 filmes com Nína Dögg Filippusdóttir. Como não amar a internet? Na quente noroeste paulista tem-se  acesso a mais de um trabalho duma atriz dum frio país de 300 mil habitantes!

Primeiro vi Grafir & Bein (2014). Um casal com problemas – Gunnar envolvido com fraude e Sonja ainda de luto pesado pela morte da filhinha – vão a uma remota casa de fazenda pra resolver o que fazer com a sobrinha, traumatizada após encontrar o pai enforcado. A pequena Perla é estranha e a essa estranheza somam-se relatos de assombração na casa, oferecidos por Fannar, que aparece e desaparece a seu bel prazer. Não tardam a começar os desdobramentos inexplicáveis de todos esses ingredientes manjados de narrativas de horror, que ameaçam a sanidade (ela existe mesmo?) e a vida dos protagonistas.
Mesmo sem ser a história mais original do mundo, o enredo tinha potencial pra se tornar queridinho cult, porque o filme é de país “exótico”, há reviravolta no finalzinho e espaço pra sequências, o que poderia atrair até refilmagem ianque. Infelizmente, a despeito da cinematografia perfeita e das boas atuações, a falta da perícia do roteiro e da direção põem muito a perder. A exposição e desenvolvimento, indecisos entre drama familiar ou psicológico e thriller – não conseguem provocar suspense ou medo. As coisas vão acontecendo fria e automaticamente e quando ocorre o desfecho a chance de empatia já estava irremediavelmente perdida, então, resta-nos o papel de testemunhas indiferentes.
Se você procura por filmes de casa mal-assombrada de países não-canônicos no mundo do cine de horror e que a despeito de baixo orçamento mandaram muito bem, leia esta e esta postagens.  
Mas, se lê inglês e prefere formar sua opinião, por que não confere Grafin & Bein no Youtube? Não garanto a integridade da cópia, porque vi de outra fonte.
2 noites depois, vi Brim (2010); que filmão! Nada de paisagens de cartão-postal lunar ou das loucas noites turísticas de Reikjavik. Os personagens são marinheiros que frequentam igreja evangélica, compram pornô pirata na versão islandesa de nossos camelódromos e arrebentam cara de mulher em banheiro de bar.
Um tripulante de barco pesqueiro morre e precisa ser substituído. Como se os homens não tivessem que aguentar turnos de 16 horas isolados no meio do oceano numa embarcação que vive quebrando, ainda têm que se haver com uma aprendiz a bordo, que emperra a rotina por não estar familiarizada com o trabalho pesado e sujo e, claro, por ser mulher no meio de marujos que passam seu tempo livre em parte vendo produções com títulos como The Sperminator. Filmado em estilo bastante documental, Brim explora com competência e sem alarde o tédio, as neuroses, a fadiga e as esperanças perdidas ou não desses homens, jamais demonizados, apenas mostrados em sua complexidade. Drifa, a estranha no ninho, acaba negligenciada como personagem, porém. Ela está na narrativa apenas pra conhecermos os homens, afinal, nunca sabemos nada sobre ela. E viva a igualdade feminina escandinava!
Tive dificuldade pra compreender que havia 2 tempos diegéticos em andamento durante a viagem do navio, mas uma vez percebido quando se está num ou noutro, a soma dos 2 planos/acontecimentos ilustra a cotidianidade deles na vida desses homens que alimentam turistas e islandeses, mas não compõem o imaginário de exotismo e pacifismo que temos da ilha.

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