quarta-feira, 2 de junho de 2021

CONTANDO A VIDA 343

A CURVA DA FELICIDADE: em que ponto estamos?

José Carlos Sebe Bom Meihy

A felicidade é um dos temas permanentes da vida individual e coletiva. E a insistência de sua busca, tem idade avançada. Pode-se dizer que tudo começou com Aristóteles na antiguidade grega, pois foi ele quem definiu de maneira propositiva que “o homem é um animal social” e que não podemos viver uns sem os outros. Não faltou a Aristóteles compreensão de que ser feliz implicaria harmonia entre semelhantes. No mesmo impulso, Epicuro deu um passo avante ao propor estrada ao prazer e a alegria como pilares da felicidade. Os supostos epicuristas foram condensados em um dos textos mais reputados da produção afeita à moral e ética coletivas, a “Carta sobre a Felicidade”. Destinado ao amigo Meneceu, Epicuro enaltecia a eterna busca do sentimento de plenitude, e, de maneira incisiva abriu sua meditação dizendo que não há idade para ser feliz e que todos devem lutar por ela. A partir daí reflexões sobre felicidade têm se multiplicado ad nauseam.

O nosso Tom Jobim, lembremos, atualizou o velhíssimo dilema afiançando que “é impossível ser feliz sozinho”. Anteriormente, com o parceiro poetinha, Vinicius, o papa da bossa-nova se referiu ao mais ambicionado dos sentimentos opondo o reverso como fato triunfante “tristeza não tem fim, felicidade sim”. A oposição entre a felicidade e a frustração se tornou tão natural como o extremo entre o bem e o mal, e atravessou os tempos instalando-se em nossas atitudes cotidianas.

Ao longo dos tempos o drama da humanidade tem sido a junção das pontas do novelo existencial que nos enrola nas tramas da vida: num extremo a tristeza, no outro a ilusão do bem-estar permanente, com paz, saúde e harmonia. E para tanto ensejamos diariamente que haja espaço para a felicidade - com mais frequência até que a alegria ou mesmo do amor. Ser feliz é o que interessa e daí as ligações com o sucesso, aceitação pública, saúde. Mas como avaliar se estamos felizes? No complexo mundo contemporâneo, no ambiente dos cálculos explicativos de tudo, eis que surge uma escala capaz de dizer onde estamos na chamada curva da felicidade. O professor David Blanchflower do Dartmouth College nos Estados Unidos, participou de uma pesquisa que envolveu 134 países e concluiu sobre um padrão que mostra, independente de variações culturais, a existência de um fluxo capaz de justificar os ajustes do bem-estar coletivamente aferidos. Como seria de se esperar, o momento máximo de felicidade ocorre quando os consultados estão na altura dos 20 anos. E a base de qualificação dessa premissa mostra que àquela altura tudo se parece promissor e possível. O “U” da curva garante que entre 40 e 50 anos, o acúmulo de experiências de lutas e fracassos torna-se pesado e em queda. Há boas notícias também, pois transpostos os anos de luta, com o avanço da velhice, tudo pode melhorar, pois as ilusões se mostram superadas.

Vale mergulhar no mar profundo das possibilidades apontadas nas curvas do “U”. Enquanto jovens, com o mundo a frente e na inocência da coragem, nos aventuramos a construir ideais e a expectativa das possibilidades nos garante certeza de sucesso. Então podemos ser mais felizes, ainda que não tenhamos a segurança de seu alcance. Entre os 40 e 50 anos, padecemos de certo choque de realidade e assim medimos os sonhos atropelados pelas dificuldades impostas pelo mundo. Aos dados a depressão e pessimismos, esse é um período de tristeza e consciência das limitações inerentes à luta. Por lógico, estas mutações não ocorrem apenas no campo da psicologia, mas se relacionam também com as condições físicas ou biológicas. No campo do comportamento, esse é o momento em que se avalia o sentimento de solidão, época em o repertório de experiências permite medir o sucesso social de cada um. Na subida dos 50 anos, com capacidade analítica baseada em testagem empírica, vivencial, emerge a possibilidade de consideração de um tempo no qual foi investido o melhor de nós, na direção de acertos.

Por certo a proposta da curva é vulnerável, mas serve para instigar sugestões avaliativas. Eu mesmo, à altura dos meus 78 anos de idade, olho para trás e posso confirmar que há certa legitimidade na indicação. E medindo meu tempo existencial posso garantir que nunca fui tão feliz como agora, mesmo sabendo de toda infelicidade que o tempo presente acarreta. E você?

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