quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

TELONA QUENTE 220


Roberto Rillo Bíscaro
Vinil reeditado em cores e caro pra chuchu, suicida usando fita cassete pra se vingar de bullying; a onda retrô jamais fica retro. Daqui a pouco aparece alguém defendendo que devemos caçar nossa comida ao invés de irmos ao supermercado.
Saudosista em estilo e uso parcial da tecnologia é Mecânica das Sombras (2017), estreia do diretor Thomas Kruithof, disponível dublado, na Netflix.
Duval é um contador de meia-idade alcoólatra, que, desempregado, aceita misteriosa oferta de emprego: teria que ir diariamente a um apartamento pra transcrever fitas-cassete de conversas telefônicas de figurões franceses.
Seu chefe não confia em computadores, então, as transcrições são datilografadas. Não ocorreu a ninguém que um editor de texto desconectado da rede não poderia ser hackeado e seria mais eficiente e fácil de apagar rastros do que máquina de escrever?
Entende-se essa opção tech vintage, porque Mecânica das Sombras é totalmente anos 70 no visual e na paranoia de espionagem governamental, de serviço secreto. Nixon assombrando a atual França macronista. Porque, aos poucos, o sabe-nada-inocente Duval se envolve numa trama que está longe de compreender.
Eis o grande problema: quem entende? É tudo razoavelmente estiloso – se você curte recriação de paleta de cores e ambientação 70’s – a trama promete grandiosidade e asfixia kafkiana, mas no final, tudo não passa de alarme falso, porque o roteiro jamais entrega o que promete de início. Sem contar o “interesse romântico” do protagonista, tão necessário quanto um zero à esquerda.
Mecânica das Sombras é claramente inspirado pela Conversação (1974), de Coppola, mas falta muito pra jogarem na mesma série.  
Se você curte boas interpretações, vale por François Cluzet, cujo Duval é exemplo perfeito do conceito marxista de alienação, até mesmo nos olhares. Mas, é meio pouco. Caso possa, busque o bom e velho Gene Hackman de Coppola e se enerve na paranoia original.

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